Profundos Olhos

A pessoa. O rosto. Os olhos. E ali parou por um instante. Ela agora estava diante de um olhar. Aproximou-se. Olhou bem no fundo e... o que havia? Aí tem um enigma - pensou. Por fora havia o branco. Branco tradicional. Ele dava a impressão de algo simples, por ser branco, e presente por ser claramente visível. E havia o centro do olhar. O centro estava conectado ao branco. Era o branco uma forma de limpar os arredores para ressaltar a importância do que estaria ali no centro. O trono que ressalta a importância do rei. As palpebras proteção. Os cílios higiene.

A parte interessante porém, com os holofotes da esclera, começou a partir da íris. A íris trazia a cor do olhar. E seus desenhos davam vida. O olho está vivo. Ela cresce e diminui de importância com a luminosidade, com as reações emocionais, com o medo, o desejo, a verdade, a mentira e o tesão. E quem é a responsável por isso? Aquela bolinha bem no meio. Seu nome?

Pupila. E ela é o enigma. Ela que traz em si a dúvida que intrigou Hamlet. Afinal, há alguém ali? Quem está ali?

Convido você à uma pequena visita ao espelho antes de continuar. É preciso ver um olho agora. Veja. Mas veja tudo que você nunca viu. Além das partes anatômicas, além do que disseram.

Quando vejo o olhar penso que a íris parece um universo inteiro. São como galáxias e constelações organizadas formando uma imagem caleidoscópica inexplicável.

Pequenos fios e linhas que se cruzam formando diversos pequenos tons de cores que juntos formam imagens diversas. No encontro com a pupila, repare bem, pequenos fios negros "tragam" partes desse universo para dentro da escuridão central. É como um buraco negro sugando a luz e tudo mais que há.

E a escuridão central aprofunda o enigma humano. Por mais fundo que se olhe, não há fundo. Há alguém ali dentro? Difícil de dizer. Nós racionalmente imaginamos que a pessoa existe ali atrás do olho, mas quando ólho o olho: a pessoa não parece estar ali atrás. Ela parece existir sem estar em lugar algum. A pupila não tem fundo. É uma passagem direta para o infinito. Além do corpo que ali atrás está.

O corpo a gente vê, mas a pessoa que comanda o corpo simplesmente pode estar em qualquer lugar. Será a alma? A alma talvez seja a explicação. Ali no fundo, em algum lugar onde não há mais matéria. Onde os átomos já não são mais átomos. Ali existe algo que para nós é e ao mesmo tempo não é. Está e não está.

Quando pensamos em nós mesmos, pensamos na pele, nos órgãos, nos cabelos, orelhas, nas partes em geral. Mas se pensarmos por um instante que quando uma pessoa por alguma razão não tem a mão, entendemos: a pessoa continua ali, logo a pessoa não é a mão. A mão é algo que pode estar com ela, mas não é ela. E se continuamos imaginando que outras partes pudessem ser retiradas. Não uma coisa trágica, mas um retirar mágico, sem que a pessoa morresse. Braços, pernas, e tudo o mais. Até quando seria possível estar ali dentro? Sem mãos, braços, pernas, bacia, sem estômago, sem tronco... sem coração?? Será ele o centro? Ou será mesmo o cérebro? Qual seria o mínimo possível? Será que estamos no corpo ou somos apenas uma célula? Apenas um átomo?

Será que é possível trocar todas as partes do corpo e continuar existindo? Ir substituindo parte por parte? O que será que acontece se trocarmos partes do corpo com outras pessoas? Se trocarmos de cérebros? Ou de coração? Ou de olhos? Ali? Dentro? Se é que estamos dentro. Se é que em algum lugar estamos.

Dizem os astrofísicos que o universo possui como elementos mais abundantes nessa ordem o 1)hidrogênio, depois o 2) hélio, 3) oxigênio, 4) carbono, 5) nitrogênio. Quando olhamos para a composição do ser humano, ele é basicamente feito de água que é uma mistura de dois hidrogênios e um oxigênio. Se observamos a proporção dos elementos do corpo humano, com exceção do hélio que é inerte, temos a mesma composição do universo. Isso nos faz pensar que talvez sejamos como o universo. Talvez sejamos parte dele. Talvez sejamos ele. Onde estamos? Somos coisas? Estamos nas coisas? Ou no olhar?

É interessante perceber que quando surgiram os computadores havia uma expectativa de que eles tomariam o lugar dos humanos em alguns anos. Porém isso não aconteceu. Mais do que isso, o tempo ensinou que o computador não "cria", só obedece. Tudo que você disser para fazer, ele faz. Mas ele não tem vontade de fazer nada. Seria essa a diferença? Seria isso o negro sombrio que guarda nossa alma dentro de um vazio enigmático?

Podemos passar meses a fio observando o olhar e ele tem por natureza a intenção de nos intrigar. Ele foi feito para ser assim? Alguém o fez? Afinal quem sou eu aí dentro? E quem são os negros dos olhos que me olham?

Ela por fim, olhou bem aquele olhar. Viu nos detalhes toda a expressão de quem olhava. Viu a tristeza e a alegria, o prazer e a dor. O ciúmes, a inveja. Nele tudo havia. O céu e a terra. O finito e o infinito. Era mágico, era belo, era poesia e realidade em um lugar só. Era a certeza de estar ali e em qualquer outro lugar ao mesmo tempo.

Eram profundos olhos.

Hobbert Jász

Hobbert Jász
Enviado por Hobbert Jász em 12/01/2014
Reeditado em 13/01/2014
Código do texto: T4647004
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