WATSON, John B - Behaviorismo e a Psicanálise Contemporânea
JOHN B. WATSON
1878-1958
"Qualquer pessoa, independentemente de sua natureza pode ser treinada para ser qualquer coisa. A experiência com o bebê ALBERT. A indução na publicidade".
JOHN BROADUS WATSON nasceu nos EUA, na Carolina do Sul, no seio de uma família pobre e teve uma infância repleta de momentos tristes. O pai alcoólatra e envolvido com várias mulheres abandou a família quando ele completou treze anos e a sua mãe, uma fanática religiosa, contribuiu para que ele se tornasse um jovem perturbado e arruaceiro.
Contudo, ele sempre foi brilhante nos estudos e ingressou na universidade de Furman¸ próximo de sua casa, logo aos dezesseis anos. Sempre brilhante, terminou seus estudos em Chicago onde obteve o Doutorado e o cargo de Professor Associado na universidade John Hopkins, na qual, em 1913, ministrou a célebre palestra que ficou conhecida como “Manifesto Behaviorista”.
Por ocasião da 1ª Guerra Mundial, WATSON trabalhou para o militares e depois retornou à universidade de onde só saiu por ter sido exonerado em virtude de seu caso extraconjugal com sua assistente ROSALIE RAYNER.
Frustrado e desiludido, ele trocou de carreira e passou para o ramo da publicidade, sem, contudo, abandonar a Psicologia e a publicação de livros com seus estudos. Com a morte prematura de sua amada ROSALIE aos trinta e sete anos tornou-se recluso e até o fim da vida manteve-se em silêncio.
As ideias
Para WATSON as emoções humanas que não dependem de aprendizado são o medo, a raiva e o amor.
Sentimentos que podem ser atrelados a objetos ou a indivíduos através do “Condicionamento Estímulo Resposta – ER”. Por isso, as pessoas podem ser condicionadas, ou treinadas, a terem uma resposta emocional a um objeto e por isso podem ser induzidas a temerem, odiarem, ou amarem um animal, uma coisa, um indivíduo ou um grupo de indivíduos, como aconteceu, por exemplo, com os nazistas.
Sua conclusão baseava-se nos estudos do fisiologista russo PAVLOV que demonstrara ser possível ensinar reflexos ou comportamentos a animais. Partindo dessa premissa, ele transferiu essa possibilidade para os homens e desse modo estipulou que qualquer pessoa pode ser treinada ou condicionada, independentemente de sua natureza, ou de suas características inatas, a fazer qualquer coisa e a ter qualquer tipo de comportamento, tanto positivo quanto negativo.
O desenvolvimento do ideário
Desde o começo do século XX vigorava a crença de que a mente humana não poderia ser estudada de modo satisfatório se fossem utilizados os métodos tradicionais que defendiam uma abordagem subjetiva e introspectiva. Para que se atingisse um grau razoável de êxito nos estudos, seria necessário utilizar os métodos consagrados em outras ciências, tais como as experiências rigorosamente controladas, conforme os protocolos laboratoriais.
E JOHN WATSON foi quem melhor representou esse ideário. Graças a sua tese sobre o aprendizado ocorrer através do método ER, que, aliás, já havia sido proposto anteriormente por THORNDIKE, ele passou a ser conhecido como o “Pai do Behaviorismo”, título que ele buscou consolidar de todas as formas.
A sua célebre conferência de 1913 em que ele lançou a obra Psichology as The Behaviourist Views it difundiu espetacularmente a ideia revolucionária de que uma “Psicologia genuinamente cientifica” abandonaria o discurso sobre os “estados” ou situações mentais e focalizaria, em vez disso, as maneiras para prever e controlar o comportamento.
A proposta que ficou conhecida como “Manifesto Behaviorista” agradou em cheio ao público especializado e o cidadão comum, pois não se pode esquecer que as raízes dos estadunidenses remontam ao “Puritanismo”, o que o torna ultrazeloso com o cumprimento das normas, regras e leis. Com o comportamento enfim.
Antes de sua pesquisa na universidade John HopKins a maioria dos experimentos sobre “comportamento” concentrava-se em animais e alguns dos resultados alcançados eram direcionados para os humanos. WATSON também se dedicou ao estudo de ratos e macacos e usou essas investigações para tecer a sua tese de Doutorado. Porém, talvez em razão de seu trabalho com os militares ele não hesitou em passar as suas experiências para os homens.
Visando estudar o modelo “Estímulo-Resposta” do condicionamento clássico para descobrir como seria possível prever e controlar as suas atitudes, ele acreditava que existem três emoções básicas – o medo, a raiva e o amor – e buscava decifrar como uma pessoa poderia ser condicionada, ou treinada, para ter esses sentimentos em resposta a determinados estímulos.
O bebê ALBERT
Em conjunto com a sua assistente e amante, ROSALIE RAYNER, ele começou uma série de experiências envolvendo ALBERT B, uma criança de nove meses de idade, selecionada em um hospital local. Os testes foram planejados para determinar a possibilidade de ensinar a uma criança a sentir medo de um animal, mostrando-o repetidas vezes em conjunto com um barulho alto, desagradável e amedrontador. Em paralelo, ele também tentava descobrir se esse medo seria transferido para outros animais, Seres ou objetos se junto soasse o mesmo som apavorante e qual seria a duração dessa paúra.
É claro que hodiernamente tais métodos seriam proibidos por serem antiéticos e até mesmo cruéis, mas à época foram considerados válidos por serem vistos como uma progressão natural dos estudos anteriores feitos em animais, cujo sofrimento não é difícil de ser imaginado.
Na experiência que passou a história com o nome de “experiência com o pequeno ALBERT”, WATSON colocava a criança “saudável, mas geralmente apática”, conforme suas notas, sobre um colchão e observava as suas reações perante um cachorro, um rato, um macaco, um coelho e alguns objetos, como máscaras de rostos humanos e papeis queimados etc. e como a criança não demonstrava medo e chegava a tentar tocá-los, WATSON estabeleceu um referencial para medir qualquer mudança em sua reação. Em seguida, com o bebê sentado no chão, ele bateu com um martelo sobre uma chapa de metal produzindo um barulho alto e repentino e como se poderia esperar ALBERT demonstrou medo e angústia. WATSON concluiu que estipulara um “Reflexo Incondicionado”, o barulho, e a partir daí levantou a hipótese de que associando o barulho à visão do rato ele condicionaria a criança a temê-lo.
Assim, quando ALBERT completou onze meses ele realizou o experimento. A cada vez que o bebê via e tocava o rato, ele produzia o som e a criança demonstrava o seu pavor. A experiência foi repetida em mais duas sessões, separadas por uma semana, e após ambas, a angústia do menino era evidente todas as vezes que o rato lhe era mostrado, mesmo que não houvesse qualquer som associado.
Ao associar repetidas vezes o conjunto rato e som alto, WATSON repetiu os métodos de condicionamento clássico que PAVLOV aplicava em seus cães. Esse método é o que os amestradores de animais da atualidade utilizam para, por exemplo, forçar um elefante a ficar sobre duas partes. O treinamento é iniciado com o filhote e ao som de uma música as suas patas dianteiras são queimadas com maçarico ou ferro em brasa produzindo-lhes dores insuportáveis. A partir de certo momento, basta o animal ouvir a música para levantar as patas e com isso evitar que seja queimado. Embora o método seja uma tortura infame, os amestradores dizem ser “um método cientifico”, inventado por PAVLOV e com isso supõe atenuar o crime que cometem. No caso da criança, até onde se sabe, não houve agressão física nesse nível, mas o resultado foi idêntico, pois bastava que ele visse o rato para desencadear a sua reação de medo e de terror angustiante.
Seguindo o protocolo que rege o esquema de Condicionamento Clássico, o rato havia começado como um elemento neutro que não ensejava qualquer resposta especial. Enquanto isso o barulho aterrador era um estimulo incondicionado “EI” por ser natural, inato no bebê e provocava justamente por isso apenas uma resposta incondicionada, “RI” de medo. Porém, após o condicionamento o rato passou a ser um Estimulo Condicionado “EC” que promovia uma resposta Condicionada “RC” de medo. Pode-se dizer que lhe foi ensinado a temer o rato que antes lhe parecia inofensivo. E que esse temor, esse condicionamento, parecia estender-se para além do rato, assim como parecia ser definitivo.
Para testar se o medo da criança tornara-se generalizado ou abrangente para coisas similares, WATSON repetiu o experimento cinco dias após o condicionamento geral e a resposta da criança foi de pura angústia e de claro pavor. Com isso WATSON provou que as emoções humanas são passíveis de serem induzidas, ou condicionadas. São absolutamente suscetíveis ao Condicionamento Clássico.
Era uma nova descoberta já que as experiências anteriores concentravam-se em testar o aprendizado no plano físico, material. Com ela, WATSON descobriu que o comportamento do homem poderia ser previsto, controlado e modificado segundo os estímulos e as condições vigentes no momento.
Uma nova experiência acerca das reações do bebê ALBERT em relação ao rato, ao coelho e ao cão, feita após trinta dias, indicou que os efeitos do condicionamento seriam duradouros e talvez definitivos.
Porém, para azar do cientista e sorte da criança (e da ética) a mãe de ALBERT o levou do hospital impedindo a comprovação cientifica da suposta durabilidade definitiva do condicionamento.
Alguns atribuem a sua atitude ao seu desagrado em relação ao tratamento dado ao filho, mas segundo WATSON e ROSALIE RAYNER, a saída da criança foi consensual e já havia sido previamente estipulada. Porém, coincidentemente ou não, a carreira acadêmica de WATSON foi bruscamente interrompida logo após a sua experiência com o bebê e ele foi obrigado a renunciar ao cargo de Professor em função de seu relacionamento com ROSALIE RAYNER.
Todavia, mesmo sem poder concluir as suas experiências, ele reforçou a sua crença no Behaviorismo e mais especificamente na aplicação do “Condicionamento Clássico” em seres humanos. Foi, aliás, nessa época que ele declarou textualmente que:
“Não ficarei satisfeito até ter um laboratório onde eu possa educar crianças sob observação contínua”.
A carreira na publicidade.
Com o fim de sua carreira acadêmica, WATSON foi trabalhar no ramo da publicidade onde teve bastante sucesso, pois a sua experiência para criar e manipular comportamentos foi proveitosa para induzir as pessoas a consumirem o produto que ele ofertava.
E na nova carreira ele não abandonou o hábito de exagerar a importância de suas descobertas e graças ao seu poder de autopromoção não lhe foi difícil voltar ao mercado editorial e publicar novos livros, nos quais ele alardeava que seria possível ir além do simples Condicionamento Comportamental e que graças ao seu método seria possível controlar e alterar quase todos os aspectos do comportamento humano. Dessa sorte, ele afirmava (e talvez acreditasse sinceramente) que qualquer pessoa poderia ter a sua natureza alterada. Que poderia ser treinada e induzida a fazer qualquer coisa.
Em seu texto “Behaviourism”, de 1924, ele se jactava dizendo que se lhe dessem doze crianças saudáveis, o seu método faria das mesmas o quê ele escolhesse aleatoriamente. Treinadas, transformar-se-iam em médicos, engenheiros, professores, assassinos, ladrões, mendigos etc.
Uma visão terrível, certamente. Típica de filmes “B” em que a humanidade é controlada por tiranos que manipulam as pessoas como meros fantoches. Contudo, à época, essa tese parecia crível e aceitável para vários segmentos sociais e intelectuais que os usaram em graus variados, como o Nazismo, por exemplo, cuja propaganda criou legiões de fanáticos despossuídos de senso crítico. E, ainda hoje, é esse fantasma não está totalmente exorcizado, pois ainda que de maneira informal as Religiões tentam condicionar os seus adeptos repetindo à exaustão os seus chavões sobre mentes fragilizadas de crentes fanatizados.
Criação sem envolvimento emocional
A arenga de WATSON sobre a sua suposta capacidade de modelar Seres humanos se tiver absoluto controle sobre os mesmos desde a tenra infância, além de outras implicações de ordem ética, coloca a seguinte questão:
Será possível extinguir o sentimento materno e paterno a ponto de pais e mães deixarem as suas crias entregues aos cuidados de terceiros, provavelmente sendo vitimas de pressões e até maus tratos? Será possível que seus instintos inatos sejam completamente suprimidos?
Embora a geração de sub-homens robotizados e prontos a servirem a determinada causa ou ideologia sempre tenha provocado os sonhos e aspirações dos tiranos de qualquer matiz ideológico, a realidade mostrou que esse sonho (ou pesadelo) é impossível, pois além das objeções colocadas várias outras atuam como negação peremptória.
WATSON não desconhecia essa verdade evidente, mas ainda assim insistiu o quanto pôde na possibilidade de modelar comportamentos. Desse modo, impossibilitado de continuar as suas pesquisas universitárias ele começou uma campanha que rapidamente popularizou as suas ideias sobre o Behaviorismo, voltando-se para o campo dos cuidados infantis, onde os seus argumentos obtiveram maior repercussão pública, embora também tenham se tornado mais controversos pela rigidez que passaram a ter.
WATSON defendia uma abordagem radical na criação das crianças e suas ideias foram muito populares, mas, hoje, é consensual que uma abordagem em que é excluída qualquer afetividade é um enorme equivoco e até mesmo potencialmente nociva por gerar indivíduos incapazes de qualquer sentimento de compaixão, amor etc.
Mas, independentemente dessa contradição, WATSON persistiu na viabilidade de seu método e acreditava que a criança é formada apenas pelo meio-ambiente em que vive. Sendo assim, a educação infantil era um exercício concreto de mudança de comportamento, ou, em outros termos de supressão de características inatas e acréscimos ditados pelas normas sociais, sobretudo em relação às emoções de medo, raiva e amor.
É provável que WATSON tenha se baseado em sua triste infância para ter essas restrições à afeição. Porém, diga-se, ele era firmemente contrário aos castigos físicos. De todo modo o seu trabalho foi bastante criticado e as gerações seguintes taxaram as suas abordagens de manipuladoras e frias, feitas com ênfase nos resultados ao invés de se preocuparem com o bem-estar das crianças. E, de fato, os danos causados às pacientes tratadas segundo o método Behaviorista tornaram-se evidentes e graves com o passar do tempo. Mas como tais danos custaram a surgir a popularidade de seus livros, chamados de “Bíblias dos cuidados infantis”, manteve-se alta por um longo período e disso resultou toda uma geração afetada pelo que atualmente é chamada de “Criação disfuncional”.
“Criação disfuncional”, aliás, que atingiu a própria família de WATSON já que ROSALIE percebeu as falhas no sistema de seu então marido e as descreveu no artigo “I am the mother of a Behaviourist’s sons”, publicada na “Parents Magazine”. Também a sua neta, MARIETTE HARTLEY relatou a sua perturbada história familiar na autobiografia “Breaking the silence”.
Essas críticas juntaram-se a muitas outras e logo surgiram formas alternativas de se criar os filhos, havendo até mesmo a conversão de ex-convictos behavioristas. Outros, como B.F.SKINER, servindo-se dos princípios básicos de condicionamento estabelecidos por WATSON, criou o seu “Behaviorismo Radical” que ao contrário do que o nome sugeria aplicava métodos mais suaves e positivos para a educação infantil.
Epílogo
Apesar das discordâncias que seus métodos sempre suscitaram e do quase unânime repúdio atual, deve-se creditar a WATSON o mérito de buscar novos conhecimentos. E por oposição, a convicção de que os homens não podem viver sem seu componente emocional, afastando de vez a crença de que somos meras máquinas.