O HOMEM MONETARIS

Todas as mazelas humanas tem sua origem, e não em outro lugar, que não seja o da ganância. É através dela que o homem, ao longo de sua trajetória no mundo, tem pautado sua busca pela felicidade.

A conquista do paraíso material, isto é, a desenfreada luta pelo desejo e poder de ter bens, honrarias e postos de comando e, ainda, o nascedouro da Revolução Industrial, fez surgir, e talvez se mostrar, o que estava escondido, o poder do dinheiro.

Saímos do escambo e partimos para a moeda que, desde tempos imemoriais, não adquirira tamanha relevância. Acumular, acumular e acumular, a nova ideologia. O homem explorando seu semelhante, o lobo do homem sob nova roupagem. A besta fera inaugurada sob os auspícios e bençãos da Igreja. O novo Deus, o Deus "monetaris" e o homem "monetaris" juntos, numa só e simbiótica irmandade.

A irrelevância da bondade, da solidariedade, do desapego, enfim, a obsolescência das relações pautas sob o único desejo de ajudar , o que em tempos idos era o que lhes dava sentido, assumiu caráter de nova ordem. Talvez, com a ascensão do dinheiro aos píncaros do egoismo e da mensurabilidade do nível de poder, tenha ocorrido ai o nascedouro da primeira ordem mundial. Outras (ao menos duas) o seguiram, mas com objetivos e circunstâncias próprias do momento. O que provavelmente serão tratadas em momento adequado.

Com o surgimento dessa medida de valor, o dinheiro, transformou-se o referencial de "amor ao próximo" em "amor ao próximo, com dinheiro". O homem "monetaris", agora transformado em coisa de si mesmo, em objeto imbuído de valor, não mais se voltará à natureza para com ela conviver. Não mais se relacionará com outros homens com o desejo de conviverem em comunhão.

Esse novo homem, em oposição ao homem destituído de valor, buscará, no novo referencial, medidas monetárias que lhe justifiquem a aproximação. Dito de outra maneira, se com (e do) o outro eu possa dele tirar dividendos monetários, somente isso basta para a aproximação. É como se intuitivamente todo ser, a partir daquele instante, trouxesse uma "áurea" em que somente eu fosse capaz de vê-la.

Assim, os ingênuos sentimentos de aproximação como condição necessária para relações sociais espontâneas, me parece que esse tempo implodiu. Não sei se estaremos às portas de outras relações onde a medida de valor retorne aos saudosos tempos do escambo, mesmo reconhecendo que a invenção do dinheiro facilitou as relações de comércio. Não sei.

Também, não se pode negar que o grande avanço que a Revolução Industrial proporcionou na tecnologia, facilitou, em muito, ao que se entende por progresso. Porém, e igualmente não se pode negar, que esse mesmo avanço tecnológico fez do homem o explorador de si mesmo.

O lobo hobbesiano, a lei do mais forte sobre o mais fraco, não mais se auto-consumiria pelo critério físico. O Leviatã, o monstro mítico, o Estado, não mais atuaria para controlar essas forças. O lobo hobbesiano, com o dinheiro como a medida de todas as coisas, transmuta-se da força física para a força monetária. Porém, o Leviatã, nesse novo quadro, não se altera. É o mesmo e assim permanecerá.

O homem monetaris não pode existir, é tudo de que se precisa para que se aflore o homem-humanus.