Sou

Guardo a lembrança dos olhos brilhantes de meu pai.

Chorou, não entendeu.

Precisava viver meu luto, juntar meus cacos.

Carregava na bagagem o desejo de dar certo e minha maior herança, resultado da história vivida: minha filha.

Lembro-me da chegada no novo lar.

Belo Horizonte me acolheu com seus enormes braços e abraços.

Era como voltar para casa.

Guardo boas lembranças.

Ousei. Arregacei as mangas. Enfrentei preconceitos da sociedade machista que sofremos.

Em algum momento tropecei, tive medos, apegos.

Era um bicho solto, sem rumo. Cão sem dono!

Sem laços.

Chorei, sofri, briguei, arrisquei, lutei, amei.

A sensação de estar por minha conta me impulsionou.

Adoro ser provocada.

Sou ousada, gosto de desafios.

Não esmoreci.

Sobrevivi.

Tornei-me bicho livre.

Refiz meus laços.

Hoje posso amar sem me apegar.

Consigo realizar.

Caminho de encontro ao meu eu.

Renasço das cinzas.

Reconstruo meu caminho.

Vivo muito e intensamente tudo o que posso.

Aprecio o prazer, o amor, o dissabor e a dor.

Sou.