O QUE EU PENSO SOBRE O RACISMO
Luciana Carrero*
No site Globo.com - há, hoje, uma notícia sobre um menino que não conseguiu se rematricular por causa do cabelo. O cabelo é afro. Só podia, porque ninguém implica com cabelos de outras etnias.
Eu vejo o racismo todo dia e toda hora, em todos os lugares em que ando. Vejo mais que as pessoas em geral, porque faço questão de manter minha mediunidade à flor da pele e percebo o jeito das pessoas ao interagirem com negros. Aparentemente estão normais. A verdade, porém, é bem outra. Percebo no olhar, na disposição do rosto, no riso, na mão, em tudo. Há um respeito mal dissimulado que transpira a preconceito e a discriminação. Há o requinte de discriminar pelo modo de olhar, que não se pode aquilatar nem invocar como discriminativo, porque é subjetivo. Então o preconceito e a discriminação só atingem eficácia formal quando aparecem juntos, na forma deliberadamente agressiva e verbalizada. A diretora da escola, se a notícia é verdadeira, agiu formalizando a discriminação e revelando o preconceito. O preconceito pode ser subjetivo e não incrimina o portador. Mas, se for acrescido da discriminação, toma forma palpável e gera o crime que a lei prevê. Foi este o caso. Mas nunca se sabe se as notícias são verdadeiras. E a gente sempre fica por aí.
Mas eu vou lá nos comentários, para ver o que o povo diz. Nesta notícia, que não vou ofertar aqui o link porque não sou propagandista da Globo e nem ganho nada para isto, os comentários de 90% dos leitores é veladamente em desfavor ao menino e à sua mãe. E favorável à posição da escola, sob os mais estranhos argumentos. E sempre com o cuidado de não ofender à negritude diretamente, o que daria status de discriminação, no comentário. Ficam só numa espécie de preconceito meio que subentendido por quem o lê. E concluo que o brasileiro é mesmo racista. Só respeita aparentemente o negro, por causa da Lei. Não sei quanto tempo vai levar para que o negro seja respeitado como ser humano, em toda a sua amplitude. Este povo vem de uma história em que foi escravizado, tido como animal e, quando libertado, entregue à sua própria sorte sem nenhuma assistência social, à época. Não houve responsabilidade do Império e nem da República com o destino desta raça. As conquistas começaram a aparecer somente ao final do século XX. E parece que ninguém consegue aceitar a ascensão dos negros, que salta aos olhos a partir do governo Lula. Por isso nunca o preconceito esteve tão acentuado como agora. E, ao mesmo tempo, tão dissimulado, pelo temor à Lei. Como somente a discriminação leva ao conceito do crime, o preconceito vai agindo silenciosamente contra a raça negra, e fica naturalmente invisível e impune, porque não há lei que possa punir pensamento. Só se concretiza quando aparece na forma palpável de discriminação. Isto acontece em casos como este, em que o ser que detém o preconceito não consegue controlar sua raiva e a externa em forma de discriminação. Racismo, preconceito e discriminação não são a mesma coisa. São três situações diferentes. Oportunamente vou escrever sobre isto. Se conseguirmos frear a discriminação, já estaremos no bom caminho? Do ponto de vista legal, sim. Do ponto de vista cultural, é preciso um amadurecimento que passa pela educação, para atacar na raiz da erva daninha que é o preconceito. Mas não devemos nos iludir. O preconceito sempre existiu na humanidade, contra tudo e contra todos. Ele é pensamento. Jamais vai deixar de existir. Não há lei que regule pensamento.
* Produtora cultural, reg. 3523/LIC/SEC/RS)