Até o Sol virar pó
- Me dá sua mão? - o alemão perguntou olhando no fundo dos olhos verdes daquela guria enquanto estendia sua mão esquerda a ela.
Ela levantou devagar aquela pequena mão. Deitou a palma de sua mão na dele. Ele abraçou aqueles pequenos dedos com os seus.
- Vamos? - Humberto convidou-a.
- Pra onde? - ela perguntou curiosa.
- Pra onde os nossos sonhos nos levarem...
(*)
O céu estava ficando cada vez mais escuro. Nuvens carregadas tomavam conta do céu; até onde os olhos do alemão míope enxergavam. Caminhavam lentamente. Iria chover cedo ou tarde.
- É... Vai chover aqui... - Humberto estava ao telefone com a doce Liberdade - Desculpa... Desculpa te interromper... - ele olhava com receio o firmamento.
- Você não acha melhor entrar? - ela se preocupou com a possibilidade do guri tomar chuva e friagem - Você prometeu pra mim que iria se cuidar...
- Está tudo bem... Se começar a chover eu entro... - torcia para que não chovesse tão cedo - Pequena, você estava falando e eu te interrompi... Desculpa...
- Não foi nada - aquele tom que ela usava para disfarçar todos os erros do molecote - No primeiro pingo você desliga o telefone e entra.
- Tudo bem... - "eu te gosto..." - Eu te gosto muito, pequena...
- Eu também te gosto muito, guri... - havia algo mágico naquela voz; ela tocava lá no fundo o alemão.
Humberto tinha os olhos úmidos. Marejados. Inundados de lágrimas. Lágrimas de saudade. Corriam soltas pelo seu rosto. Acertavam seu sorriso. Queriam é correr até ela. "Será que elas me levam junto? Será que elas vão acertar ela?".
O alemão sorria. Ela sorria também. Sorriam e riam. Era tão natural aquela felicidade que enxia o coração do guri e o fazia transbordar. Era ela o motivo de tudo aquilo. Sempre que ele precisava encontrá-la, lá ela estava: ao lado dele. Tão perto como ninguém nunca esteve (e entre eles a saudade que se disfarçava de quilômetros). Uma vontade imensa de colar seu rosto ao dela e dizer o quanto ele a gostava. Logo estariam juntos, não importava se fossem dois meses, quatro, uma eternidade que os separava. Ela se preocupava com o fato de ter estendido a viagem de fim de ano, pedira desculpas por ter de fazer ele esperar. Ele esperaria o tempo que fosse para encontrá-la.
- Eu posso te esperar até o Sol virar apenas lembrança... - Humberto soltou uma lágrima junto dessas palavras. Ele esperaria mesmo - E eu fico muito feliz que você terá mais tempo junto da sua família... Pequena, não se preocupe mesmo com o fato de estender a viagem... Quando você voltar, eu vou te visitar... Seja quando for...
- Ah, guri... Eu só não queria fazer você esperar tanto... - ela trazia a preocupação na voz.
- E quantas vezes mais eu preciso falar que por você eu vejo o Sol virar poeira duas ou três vezes até poder te ver? - riram.
Humberto tinha os olhos ainda mais úmidos. Ela o fazia transbordar. A noite chegara. A chuva não. No céu apenas uma corajosa estrela lutando contra as nuvens. Permanecia ali, firme e forte (e brilhante e linda e...) sorrindo para o guri. Piscava de relance para o alemão. Sorriu de volta à estrelinha. "Quando a vida sorri para nós, devemos sorrir de volta".
- Com toda nossa força - sussurrou baixinho ao telefone, ela não ouvira.