Unir-se
Ela caminha em direção a um grupo de pessoas por um longo corredor. Nos dois lados deste percurso, pessoas a observam da cabeça aos pés, imaginando - ou pelo menos tentando - o que se passara na cabeça para tal atitude. No fim deste corredor, a vida daquela mulher mudará para sempre. Não será mais quem sempre fora. Três homens a observam atentamente, fazem perguntas acerca de sua vida e um deles responde sim e lhe coloca uma aliança no dedo anelar. Estão casados. O padre sorri e o pai da noiva chora diante do genro querido e bom partido. E parte o casal dali para preencher de vida o resto de suas vidas. E viveram felizes para sempre... Viveram mesmo?!
A descrição de um casamento acima bem se assemelha a qualquer outra coisa exceto ao que realmente se espera no discurso enfeitado dos românticos. Mas, o matrimônio, o enlace, a união de um casal, a assinatura do documento é isso: mudança de uma realidade, o começo de uma nova etapa da vida de duas pessoas. Muitas pessoas me abordam por ai e questionam em tom queixoso: “Nossa... Mas, ela mudou”, “Ele tá diferente de como era no namoro”, “Tudo bem... São 19 anos de uma relação com seus altos e baixos. Mas, não me reconheço mais”. Ora... Casado ou solteiro, o ser humano muda, evolui e deixa para trás conceitos e comportamentos que julga não serem tão úteis assim. Existe um mundo ao seu redor lhe trazendo coisas e situações novas que serão assimiladas.
Assim, é bem interessante frisar que sempre haverá umas diferenças entre paquera, os chamados hoje “ficas”, namoro, noivado e casamento. Cada tipo de relacionamento - e olha que existem outros tipos não relatados aqui - possuem as suas características e condutas, que serão combinadas por ambas as partes ou, pelo menos, assim deveriam o ser. Por isso, não é tão cabível querer o mesmo comportamento do seu parceiro(a) naquele dia do primeiro encontro aconteça 5 anos depois de uma relação plenamente constituída. Cada etapa de aproximação de um casal tem um intencionalidade, uma função. E ninguém aqui está dizendo para se acostumar com a falta de cuidado, romantismo e afins, pois já se foi conquistado e o anel saiu da mão direita para esquerda. Longe disso!
Mas, que, na verdade, essas demonstrações de afeto ficam um pouco mais raras por conta da evolução do conjunto de sentimentos ali presentes. O que, antes, era uma apaixonite, aqueles calores, uma vontade louca de estar junto do parceiro, passou a coexistir com a admiração, companheirismo, cuidados que apenas quem é casado pode entender. Solteiros, fiquemos na teoria por enquanto. Mas, concordo que algumas pessoas são absorvidas pelas correrias do dia-a-dia, pelos deveres da vida de uma família constituída com suas contas no fim do mês, reuniões de trabalho, consertos domésticos e o romantismo ficam um pouco de lado, ali no meio de outras tralhas. Na boa?! Nem consigo perceber isso como uma coisa terrível, pois, por outro lado, quando se é notada essa ausência, uma das partes, ou bem poderia ser as duas, podem tomar uma atitude e sair mudar.
Falo daquele jantar num restaurante legal e que nem precisa ser o mais caro; lembro de assistir um filme a dois; de surpreender com uma flor e um presente bonito. Ou, simplesmente, dizer que seu amor está belo(a) naquele dia e nos outros, também. Penso que alguém vai procurar algo por ai quando não mais está completo dentro de si. E unir-se a alguém é dividir muitas coisas além de responsabilidades e contas. Sobretudo, cuidado mútuo entre as duas pessoas no cotidiano. De modo inteiro consigo primeiramente e sem faltar com sua verdade.
Lembro-me do filme “Shrek - 2” em que o noivo é um ogro, a noiva possui uma beleza questionável e o sogro não vê o enlace com bons olhos. Os contos de fadas modernos são relidos com um pé na realidade. É isso mesmo. A beleza da poesia está em seus detalhes, no enfeitar e não no viver ao pé da letra todos os dias o romantismo. E felicidade é tentar ser feliz. Sem certezas ou roteiros de filmes. Ao invés de “Viveram felizes para sempre”, me conformo demais com: “Viveram. E viveram muito”.