ENTRELINHAS DO SENTIR

“Quando se pretende falar em Poesia é necessário buscar a linguagem da Confraternidade. Porque esta é a plenitude do sentimento amoroso do humano – em sua entrega ao outro – mesmo que o conteúdo com que o poeta o traga à tona seja até abjeto, capaz de provocar indignação ou repulsa. Tem-se a Poesia como algo doce. Ainda que não seja flor, e sim, espinho, dardo, gume capaz de provocar lacerações por sua capacidade de vômito e expressão, especialmente quanto à opressão do valor Liberdade. Tudo que não seja para a construção da felicidade da criatura humana não é da destinação poética... O poema “O bicho”, de Manuel Bandeira, ao retratar a miséria humana e a fome, tem o mesmo sentir: proscrever o que é abjeto. O sofrimento de Cristo, nos mistérios dolorosos, é a representação do que o Amor pode e deve: a absolvição espiritual por meio do sofrer dilacerações no corpo para parir o perdão a si próprio. E mais: por amor ao outro, ao próximo presente ou futuro. É uma pena que especialmente no lírico-amoroso, o naipe feminino, normalmente, veja o amar como possessão, e assim o tente retratar em versos que não vão além do possessivo da paixão. Porque, no amar, o sentir não pensa...”. Joaquim Moncks, in A PALAVRA FRATERNA.

– Do livro FABRICAÇÃO DO REAL, 2013.

http://www.recantodasletras.com.br/ensaios/4451434

– Marilú Duarte, através de e-mail, em 26/08/2013.

O conceito de amor para Freud é uma ampliação do conceito de sexualidade, definido como um conjunto de processos mentais internos que dirigem a libido do indivíduo para um objeto, com objetivo de obter satisfação. Sigmund Freud descreveu o instinto amoroso chamado Eros, o qual inclui: amor a si mesmo, aos pais, aos filhos, à humanidade, ao saber e aos objetos abstratos. Frente ao texto que me instiga ao presente ensaio, atenho-me ao poema “O Bicho”, de Manuel Bandeira, que revela na figura exposta toda uma angústia existencial quanto ao sentido da vida. É impossível o poeta eximir-se, pois a legitimidade do que escreve está nas entrelinhas do seu sentir. Ninguém poderá falar do sofrimento de Cristo se não o tiver representado dentro de si, ou perdoar a si próprio se não tiver assimilado sua real culpa. Tudo se situa no consciente e inconsciente, e ambos necessitam ser acionados para o "fazer poético". Todo o escritor busca conexões lógicas e congruentes entre a causa e o efeito do que vai expor, mesmo que nas contradições e paradoxos, o retrato exposto obtenha dualidade. Assim como o analista deve conhecer as contribuições teóricas de distintos autores de variadas correntes psicanalíticas, o mesmo deve acontecer com o poeta para construir livremente a sua verdadeira identidade, respeitando o seu estilo pessoal. "Porque, no amar, o sentir não pensa." . Fernando Pessoa, o menestrel da lusitanidade, no amor, se expressa com muita magia dizendo: "Porque quem ama nunca sabe o que ama/Nem sabe porque ama, nem o que é amar/Amar é a eterna inocência,/E a única inocência, não pensar"... Podemos definir o amor como um sentimento de alteridade e desejo, que nos coloca de frente para a vida, um pensar sem pensar-se, um sentir sem permitir-se, um querer sem querer, um misturar-se sem definir-se, um arriscar-se, sem ousar questionar, enfim, uma verdadeira aventura do entregar-se sem reservas. Marilú.

– Do livro O IMORTAL ALÉM DA PALAVRA. Joaquim Moncks / Marilú Duarte, 2013.

http://www.recantodasletras.com.br/ensaios/4461252