BERGSON, Henri - Filósofos Modernos e Contemporâneos.

BÉRGSON, HENRI

Elã Vital.

1859 - 1941

É ridículo e vergonhoso os Homens serem máquinas; é ridículo e vergonhoso que a sua filosofia, assim os descreva... Bérgson alcançou grande popularidade ainda jovem por ter defendido as esperanças que brotam continuamente no peito humano... A contribuição de Bérgson à filosofia foi preciosa, pois se estava a um passo de acreditar que o Mundo seria um espetáculo acabado e pré-determinado, no qual a iniciativa humana não passaria de uma inócua ilusão...

A Essência da Vida

As frases acima, pinçadas do magistral livro de WILL DURANT ilustram a contra corrente que alguns eruditos lançaram contra a vaga de Positivismo/Materialismo que imperou quase absoluto no inicio do século XX.

O CÍRCULO DE VIENA, a principal fonte de tal modo antigo de pensar (uma cópia do ancião Empirismo inglês) fora fortificado com o progresso das Ciências, que, acreditava-se, responderia a todas as questões sobre o Mundo, sobre o Cosmo, sobre a vida, enfim.

Que sanaria todas as dúvidas que acompanham o homem desde que esse começou a pensar.

Contudo, o avanço na Mecânica mostrou-se incapaz de atravessar a superfície e chegar à Essência; e o mistério sobre “o movimento”, ou “a força” continuou o mesmo.

Os novos aparelhos da medicina conseguiam fotografar o cérebro, mas não os pensamentos. Os movimentos estrelares poderia ser previstos, mas não a sua causa etc.

Os arcanos continuavam intactos.

E foram as tentativas de decifrá-los que fomentaram a criação das novas Correntes de Pensadores que abandonaram a estreiteza do Materialismo, tão logo se certificaram de sua insuficiência para a aquisição do real Conhecimento.

Sabe-se que o ato de pensar pode ter inicio no “objeto pensado” e prosseguir tentando enquadrar a realidade, ou a natureza do que foi observado no círculo das “Leis do Raciocínio”, ou da Razão, despindo-o de qualquer traço imaterial ou abstrato até que ele se adeque às “Leis da Natureza (física, material, concreta)”.

Ou, o ato de pensar pode começar no próprio pensamento, que não é necessariamente submisso aos ditames da lógica e da razão. E a partir daí, acreditar que todas as coisas, seres, atos etc. são geradas pela Mente. É o chamado “Idealismo (que pode ter outras expressões)”.

Idealismo, que pressionado pelas conquistas cientificas, foi perdendo espaço para o Positivismo/Materialismo/ ou Racionalismo.

E tão largo se fez o predomínio desses, que no inicio do século XX as Ciências se tornaram modelos para a própria Filosofia; ou seja, a Filosofia deveria agir conforme as normas de estudo e de pesquisa científica.

A tese de DESCARTES (René, 1596/1650 – França) de que o Pensamento (a reflexão, o raciocínio) deveria nascer do próprio ato de refletir e depois seguir “para fora” ao encontro doutros Pensamentos, foi solapada pela industrialização da Europa, principalmente a Ocidental, que sem qualquer pudor afastou o Pensamento “do próprio Pensamento” e o fez seguir em direção às coisas materiais, aos objetos concretos.

O filósofo SPENCER (Herbert, 1820/1903 – Grã Bretanha) talvez tenha sido a melhor expressão da Teoria Mecanicista/Industrialista. E uma de suas teses serve bem para demonstrar a pobreza do Materialismo para explicar o Mundo e a sociedade.

Admirador de CHARLES DARWIM, aplicou as teorias do mesmo ao conjunto da sociedade criando o chamado “Darwinismo Social”, pelo qual justificava (sic) os privilégios dos ricos pelo fato de que eles seriam (sic) “mais capazes” de se adaptarem à “selva social”.

Suas exaltações às virtudes da Mecânica e da Lógica, hoje, em retrospecto, podem até soarem ridículas, mas à época encontraram amplo respaldo, pois: “nada mais Lógico que a evolução dos Seres atendesse às necessidades físicas, impostas pela Natureza concreta (sic)”.

Mas se o trabalho de DARWIN (Charles, 1809/1882 – Grã Bretanha) permaneceu digno de crédito, especialmente a sua teoria sobre a “Evolução das Espécies”, o mesmo não se deu com SPENCER, que logo foi esquecido.

Esquecimento e abandono tão rápidos, quanto foi à substituição do ponto de vista físico, concreto, material pelo ponto de vista biológico.

Pela progressiva disposição de ver a “Essência do Mundo” no ato de viver. Na “marcha da vida (ou no correr do tempo)” e não mais na imobilidade da matéria.

E tal foi à adesão a essa perspectiva que não foram poucos aqueles que quiseram dar vida à própria matéria inerte.

O estudo da eletricidade, do magnetismo, da inteligência artificial e da robótica (esses últimos mais recentemente) conferiu à Física uma característica quase vitalistica.

NOTA do AUTOR - como Prometeu (e depois o seu plágio, o deus judaico-cristão) que fez o homem a partir do barro, tentou-se processo semelhante com aço, eletricidade, vidro etc.

Deixou-se de tentar adaptar o pensamento à matéria, invertendo-se o eixo da questão e se tentou adaptar a matéria ao pensar, quase lhe conferindo espírito e alma.

SCHOPENHAUER (Arthur, 1788/1860 - Alemanha) já tinha aludido à possibilidade de tornar o conceito “vida” a essência de tudo; e BÉRGSON avançou nessa “Linha de Pensamento” e com ela convenceu a quase todos.

Convenceu quase todos os céticos de que a Essência da Vida está na própria vida, dividida em cada uma de suas formas.

Está, pois, em todo homem, em todo animal e em todo vegetal.

Notas Biográficas

Bérgson nasceu em Paris, França, e desde cedo a sua inteligência superior mostrou-se generosa e lhe deu os meios para fazer sua brilhante carreira de acadêmico e de pensador.

Alguns o comparam respeitosamente, mas talvez com algum exagero, ao jovem Davi que matou o Golias do Materialismo.

As Contradições do Materialismo

BÉRGSON, quando jovem, foi adepto das teorias de SPENCER, mas ao aprofundar seus estudos deparou-se com discrepâncias que não pôde absorver.

Alguns autores chamam tais discrepâncias de “as três juntas reumáticas” do Materialismo, sendo fácil citá-las do seguinte modo:

1. Relação entre a Matéria e a Vida;

2. Relação entre o Corpo (cérebro) e a Mente

3. Relação entre o Determinismo e a Escolha (ou livre-arbítrio).

A primeira “junta” foi resolvida cientificamente (bem ao gosto da época) por PASTEUR (Louis, 1822/1895 - França) que demonstrou ser impossível a BIOGENESE; ie, a criação ou geração de vida a partir da matéria inerte.

Isso evidenciou o fato de que após os seus muitos e muitos experimentos os Materialistas estavam tão distantes de solucionar o mistério da vida, como sempre estiveram, pois para que haja vida é necessário que exista ALGO que se desconhece, além da matéria necessária à formação daquele Ser ou daquela Coisa.

Algo, que não pode ser estudado, ser decifrado. Que pode apenas ser acreditado. Aquilo que os crentes chamam de “Sopro Divino”, ou equivalente.

E que BÉRGSON chamou, ao fim de suas lucubrações, de ELÃ VITAL.

A segunda das três “juntas” é a que se refere sobre o Cérebro e a Mente.

Embora o Pensamento e o Cérebro estejam associados, a conexão entre ambos estava tão misteriosa como sempre esteve (e, diga-se, como ainda está), malgrado as tentativas em resolver a questão, inclusive com a dissecação de cadáveres humanos e com a vivificação de animais, que os Positivistas - Materialistas realizavam e ainda realizam.

Argumenta-se, como antes, contra os Materialistas usando-se a sua ferramenta predileta, a Lógica; já que se todo ato de pensar fosse de fato o simples resultado de combinações químicas e elétricas ocorridas no cérebro material, corporal, para que serviria a Consciência?

Ou, então, por que o mecanismo cerebral não podia desativar esse “epifenômeno”, como disse HUXLEY. Por que o cérebro não desligava (sic) as más sensações, as sofridas emoções, ou os pensamentos transcendentais? Ou, ainda, se o ato de pensar se limitasse ao cérebro corporal, como explicar esses “Pensamentos Transcendentais” que viajam muito além do corpo?

Em relação à terceira “junta” vigorava a afirmação que o Determinismo, ou Fatalismo era mais provável que o Livre-Arbítrio, já que toda liberdade é limitada pelas condições materiais.

Ao se decidir por algo, o homem sofre tantas imposições de ordem social e natural, que se pode pensar que o “Poder de Escolha” seja realmente uma falácia.

Porém, muitos duvidavam dessa afirmativa, como muitos a questionam ainda, por uma questão de simples observação. Quando olhada no terreno individual, as proibições ou limitações sociais e naturais atuam de fato como barreiras e obstáculos.

Todavia, quando se avista o conjunto da humanidade, observa-se o contrário; pois, foi o conjunto dos homens que livremente escolheu as regras sociais que norteiam a vida e adequou a natureza segundo seus interesses.

Ademais, se fosse correta a tese Mecanicista, o momento presente seria apenas o resultado do momento passado, e esse do momento que lhe precedeu. E assim sucessivamente até que ao fim dessa fila se depararia com o momento primeiro. E com ele, a pergunta óbvia: o que lhe precedeu?

Certamente algo abstrato, imaterial; conforme ditaria ironicamente a Lógica, que é tão cara aos Materialistas.

A Reação de BERGSON

Desse modo, com todo esse cabedal de refutações aos Sistemas Materialista, Positivista e Determinista, HENRI BÉRGSON entrou na arena para expor suas teses que de imediato conquistaram inúmeros adeptos e lhe deram a merecida fama.

Afinal, entre tantos estudiosos que duvidavam daqueles Sistemas, mas não tinham a necessária coragem para exporem suas discordâncias, apenas ele teve a valentia de duvidar abertamente.

De ousar ir contra a corrente e de recolocar a Filosofia em seu pedestal de “Deusa dos Pensamentos Superiores”.

A Essência é o Tempo e não o Espaço.

Segundo BÉRGSON, o homem se inclina naturalmente pelo Espaço, pois este pode ser percebido pelos Sentidos (Olfato, visão, tato, paladar, audição) e analisado cientificamente pelo Cérebro corpóreo, material.

Por isso é que tenta encontrar no mesmo, a “Essência”, a “Coisa-em-Si”, dos objetos, dos fatos, dos Seres, do mundo, da vida.

Porém, para ele, essa busca é vã, já que a Essência está no Tempo e não no Espaço.

Nada pode alterar o Tempo passado. Nele, nada se perde, acrescenta-se ou se modifica. Ele é absolutamente imutável e eterno.

É certo que usamos apenas uma parte do Passado para os pensamentos cotidianos, mas sabemos que o inconsciente é formado inteiramente pelo que já se viveu; e é esse inconsciente, enquanto Essência, que modela o Futuro, pois é nele que estão às vivências, as experiências, a memória individual e a coletiva que embasarão as aspirações, os projetos, os desejos etc.

É sobre, pois, essa Essência que se assentam as variáveis da vida, tanto as presentes, quanto as futuras.

E o Futuro nunca será igual ao Passado que o embasa, já que o Tempo é um acúmulo (ou uma Duração, como ele diria) a cada segundo que passa.

Assim, o dia de hoje, que é o Futuro de ontem, não será igual ao dia de amanhã, pois ao saldo já existente serão acrescidas as vivências e as experiências de agora.

Aí está a Mudança, o Movimento, o “Eterno Movimento”. Cada minuto é algo novo, imprevisível. E é imprevisível, justamente por ser inatingível pelas ações humanas.

Ao contrário do Espaço, onde as alterações e as previsões sobre as coisas e sobre os Seres são possíveis, pois nele o homem pode agir com efetividade.

Porém, as alterações e previsões possíveis, que são a principal meta dos Materialistas- Positivistas – Mecanicistas, atingem apenas o “lado de fora”, a “casca”, a superfície das coisas e Seres. São apenas ilusões intelectuais.

A Essência está na Mudança, no Movimento. E ambos só existem efetivamente no Tempo.

NOTA do AUTOR - antes de avançar e antes das criticas de um leitor (a) mais atento, registre-se que esse ideário de Bérgson bebeu na fonte de Heráclito (c. 535/475AEC), que já na Antiguidade grega pregava estar no Movimento Contínuo ou no “DEVIR”, a Essência do Mundo.

A Evolução Criativa, a Mente e o Cérebro.

Tanto para o antigo filósofo, quanto para HENRI BÉRGSON, a Realidade é o Tempo e a Duração.

Para ele, no homem a memória é o “Veiculo da Duração”, ou a “Criada do Tempo”.

Através da memória o Passado é acessado e oferece as alternativas conhecidas para que se vença o próximo desafio.

É claro que com a velhice (desde que sadia) e maior acúmulo de Passado, maiores e melhores serão as alternativas ofertadas, as quais geram a “consciência proporcional” à riqueza do Passado de onde proveio.

E ter consciência é como ter uma lanterna que ilumina o potencial de cada ato presente, ou futuro. É como se fosse um laboratório onde as respostas possíveis são testadas antes de serem formuladas irrevogavelmente.

Por todos esses argumentos, Bérgson pôde afirmar peremptoriamente que o homem não é uma máquina que a tudo se adapta resignadamente.

É, ao contrário, um foco de força, de energia. É um ponto da “Evolução Criativa”.

Se os Deterministas – Positivistas - Materialistas tivessem razão, diz Bérgson, e cada ação fosse apenas o resultado automático e mecânico de forças preexistentes, o “motivo mecânico” de aquela ação ocorrer seria imperativo, pouco ou nada importando o desejo do homem; mas não é o que ocorre.

A escolha do individuo é que determina se tal ato ocorrerá e como haverá de ocorrer. É certo que a escolha, ou o poder de escolher, exige certo esforço, pois é preciso superar o rude impulso, o hábito, ou a indolência. Mas, ao cabo, é o indivíduo quem permite, ou não, o fato, o acontecimento, a ação.

A Mente, pois, não é a mesma coisa que o Cérebro, já que este só age segundo suas limitações mecânicas, físicas e corporais, enquanto a Mente é livre para voos que superam as fronteiras concretas, ou materiais.

O Cérebro é mais um tipo de arquivo, de armário, de depósito de imagens, padrões, resoluções, enquanto que a Consciência (ou Mente) é “quem” acessa esse deposito.

A Consciência, pode-se dizer é a Recordação (dos efeitos anteriores) que embasa a escolha das resoluções que serão usadas no momento presente.

Mas, o que nos leva a pensar que a Mente está indissociavelmente ligada ao Cérebro físico?

Segundo BÉRGSON, apenas um erro de avaliação de certos trechos da Teoria do Processo Evolucionário.

Através desse erro, passou-se a crer que a parte da Mente que se chama de “Intelecto” (e que é naturalmente Materialista, pois se desenvolveu para compreender e agir com os objetos concretos, coisas espaciais [que preenchem o espaço]), seria a sua totalidade.

E a partir dessa perspectiva incorreta, reduziu-se a Mente ao simples Intelecto, criando a falsa impressão de que ela também estaria subordinada à matéria ou às Leis Naturais.

Todavia, esse retrato deformado tende a desaparecer na medida em que o esclarecimento lança luzes sobre a questão e repõe as coisas em seus devidos lugares.

O intelecto do homem desenvolveu-se para assegurar a adaptação do corpo humano ao meio-ambiente e, como se fosse um palco de teatro, representar as relações existentes entre as coisas e quem as percebe.

Em suma, o Intelecto serve para se pensar na matéria concreta, física.

No terreno do concreto, ele situa-se à vontade para captar os objetos sólidos, os Seres etc. Enxerga o vir-a-ser como se já fosse o próprio “Ser”.

Porém, por suas características, não consegue captar a conexão entre as Coisas, tampouco o “Fluxo da Duração (ie. o Passado que perdura no Presente e projeta o Futuro)” que é a própria vida.

É como se estivesse assistindo a um filme, do qual só capta quadro a quadro, perdendo a continuidade que dá vida à película.

Aliás, o intelecto pode mesmo ser comparado a uma câmera fotográfica que só consegue capturar quadro a quadro estáticos e não o “filme”, ie, a continuidade, o movimento, a marcha.

É-lhe possível ver a matéria (ou cada fotograma), mas Não pode perceber a Energia que os move, tampouco o Movimento que une cada fotograma.

Mas, que se não fosse o Movimento, o filme não existiria, assim como sucederia com a própria existência.

Para BÉRGSON, a dificuldade que alguns indivíduos têm para aceitar o DEVIR (O Movimento Eterno) como a real Essência da vida, vem da teimosia em aplicar conceitos da Física ao Pensamento.

Para ele, aliás, está aí uma das fontes do Materialismo - Determinismo.

Mas, se o indivíduo fizer uma breve pausa reflexiva verá o quanto é impróprio usar Conceitos do Mundo Material, em relação à Mente.

Afinal, a simples constatação de que se pensa com igual rapidez em 01 km, como em ½ Km; ou que um Pensamento pode circunavegar a Terra em milésimos de segundo, já deveria bastar para que cessassem de medir coisas diferentes segundo o mesmo padrão.

A vida está além dos conceitos materiais, porque ela é uma questão de Tempo e não de Espaço (vivem-se tantos anos ou tantos quilômetros?).

Todavia, diziam os críticos do filósofo: como captar o fluxo e a Essência da Vida se não for através do Intelecto?

Bérgson, respondia que se deveria dar certo valor ao Intelectualismo, mas que se tivesse em mente que tal valor é apenas parcial. Que se soubesse com clareza de que o Intelecto não é tudo!

Sugeria, a propósito, que se fizesse o seguinte exercício: abandonem por um instante o “Pensamento Materialista” e olhem para o próprio interior. Para o vosso “Eu”. Nele se verá a Mente e não o Cérebro; o Tempo e não o Espaço; a Ação e não a Passividade; a Escolha (o livre-arbítrio) e não o Determinismo.

Com esse simples exercício, qualquer um pode se habilitar a compreender a verdadeira Realidade.

A Realidade Imaterial, que é a verdadeira, pois se toda matéria está sujeita à degeneração e ao fim, ela é eterna e essencial.

A Intuição

Observa-se no exemplo acima que a visão do “Eu”, (a Percepção direta) chamada INTUIÇÃO agrupa os “fotogramas” no “Todo”, e com isso é possível vê-los em sua real significação.

E é através dessa maneira de se captar Conhecimento, ie, através da Intuição, que se chega ao máximo possível de Saber efetivo.

Não há qualquer processo místico no uso da Intuição, pois ela é apenas o exame mais direto possível, haja vista que é isento de pré-julgamentos, pré-conceitos e vícios e hábitos.

O filósofo Spinoza (Baruch, 1632/1677, Holanda) já dizia que o Pensamento Reflexivo (oriundo do raciocínio, da reflexão) Não seria a melhor forma de Conhecimento.

Pois apenas pela Percepção Direta, ou Intuição, é que se sente a presença da Mente e de tudo aquilo que está acima e além da Matéria.

Pela Intuição é que se observa o cerne, a Essência da vida.

Esse apego à Intuição não era exclusividade do holandês e no correr do tempo seduziu vários outros filósofos, dentre os quais se destaca Rosseau (Jean Jacques, 1712/1778 - Genebra) que chegou a afirmar que o “Pensamento Reflexivo” seria uma doença (sic) e que o Intelecto seria “uma coisa traiçoeira” que se deveria abjurar.

Bérgson não encampou ideias tão radicais, pois via alguma utilidade no Intelecto, à medida que ele proporcionava a convivência do homem com a Matéria.

Mas como os grandes que o precederam, ele também reconhecia que à Intuição estava reservado o “Sentimento Direto da Vida, da Mente e de toda Metafísica”.

Todavia, BÉRGSON achava uma tolice hierarquizar as formas de se adquirir Conhecimento ou Saber, pois cada qual tem sua importância à medida que homem “habita ou existe” em dimensões variadas. Existe, tanto no Campo Material, quanto no Sublime (espiritual, ou mais elevado).

Sobre isso, ele dizia que: quando deixamos o domínio da Matemática e da Física para entrar no domínio da Vida e da Consciência (ou da Biologia e da Filosofia) temos que apelar a certo “Senso de Vida”, cuja origem é o mesmo impulso que produz o Instinto.

NOTA do AUTOR – observe-se que ao não rejeitar completamente o Intelecto, Bérgson usou a linguagem da “Compreensão” para diferenciar os tipos de Conhecimentos possíveis. Afinal, não se pode evitar que as palavras usadas para tal explicação sejam Psicológicas, ie, cerebrais. É imperioso utilizá-las, ainda que tragam uma carga de conotações materiais que lhe foram impostas pela sua origem. Note-se, por exemplo, que “Espírito” quer dizer “Alento, Impulso”; “Mente” quer dizer uma “Medida (como um kg, por exemplo)” e “Pensar” sempre aponta para uma coisa, um Objeto, um Fato, um Ser etc. Mas, apesar disso, só por estes meios grosseiros é que a Alma (a Essência) pode se expressar.

Alguns críticos de Bérgson argumentam que não se pode prescindir do Intelecto, pois é com ele que se “vê” as outras formas de Consciência e que a Introspecção (o olhar para o Eu interior) e a Intuição são simples metáforas materialistas.

Porém, contra-argumenta-se que essa critica só seria aceitável, se não restasse nada além do Pensamento Conceitual e Lógico (o pensamento sobre um conceito, [ie, sobre o que é uma coisa, um fato] regido pela lógica materialista). Se não houvesse a extensa rede de Pensamentos que não se adéquam ao titulo acima (ie, as divagações, as fantasias, os delírios etc.) e que são feitos da mesma substância que formou o Intelecto.

NOTA do AUTOR - por isso, Bérgson dizia que: escavar as sagradas profundezas do Inconsciente será o principal trabalho da Psicologia no novo século. Seara que, posteriormente, foi, de fato, trilhada por Freud e seguidores.

Tempo e Impulso da Evolução.

Assumindo-se o Tempo como a “Essência da vida” e, portanto, o verdadeiro “Impulso da Evolução” (e não só como um mecanismo de luta e sobrevivência, segundo DARWIN) sente-se a “Duração (o acúmulo de Passado)” no “Processo Evolutivo” e, com ela, o aumento das Forças Vitais que geram continuamente o absolutamente novo.

O progresso, o desenvolvimento não acontece por “Ajuntamento de Espaço”, mas sim por “Acumulação de Tempo”, pois é através dele que também se acumula a sabedoria da humanidade.

Vários Pensadores rejeitaram DARWIN, ainda que respeitassem o seu trabalho, porque as suas teses defenderam uma origem puramente materialista, através da Seleção Natural, dos novos órgãos, novas funções, novos organismos e novas espécies.

E, com efeito, é uma teoria minada pelas dificuldades que apresenta, tais como: de que maneira os Instintos se originaram, pois se apenas as qualidades congênitas são transmissíveis como pôde o instinto já nascer “pronto para uso”?

Assim, as incongruências da Teoria Mecânica, saudada por DARWIN como o verdadeiro Processo Evolutivo, acabaram, por efeito contrário, confirmando que há “algo mais na Evolução”.

Atestaram a veracidade e a validade das teses de BÉRGSON, à medida que confirmaram que a vida é muito mais que a sua maquinaria.

Que é, na verdade, uma “Força” que pode crescer e moldar as suas circunstâncias, podendo até restaurar-se quando necessário.

Mas, alerta BÉRGSON, não há um “projeto externo” que faça com que tais potencialidades aconteçam. Tudo se faz internamente, pois, se assim não fosse, só se teria outro tipo mecanismo, ainda que invertido.

Por isso, ele insistia que as potencialidades pertencem à própria vida, distribuída entre as suas várias formas (ie, todos os seres vivos).

É, pois, esse “algo a mais” que produz a Evolução Criativa.

NOTA DO AUTOR – tenhamos em Mente que várias incorreções que anteriormente eram apontadas na Teoria de Darwin foram revistas, fomentando uma revalorização de seus estudos.

No seu inicio, a vida é quase tão inerte quanto à matéria, como se o Impulso Vital fosse demasiadamente fraco para arriscar a aventura do Movimento.

Mas ao evoluir, a vida avança em direção à liberdade do voo. Por isso, em toda Evolução, a maior recompensa é dada a quem aceita o risco maior.

Por isso, BÉRGSON enxerga a vida em três linhas de Evolução:

1ª – quando a Vida se queda na imobilidade dos vegetais.

2ª – quando a Vida é impulsionada apenas pelo Instinto Bruto, como nas abelhas e nas formigas.

3ª – quando a Vida atinge o ápice e busca a liberdade, despindo-se de seus instintos primários e assumindo o “risco de pensar”.

É certo que o Instinto continua sendo a maneira mais direta de sondar a Realidade e captar a Essência das coisas, do Mundo; mas a Inteligência (passageira privilegiada no “carro da Evolução”) assume cada vez mais o papel de fiel depositária dos interesses da própria Evolução.

A Vida e Deus

Para o filósofo, essa vida continuamente criativa é o que se pode chamar de Deus. Logo, Deus e a Vida são a mesma coisa.

Mas, ressalte-se, não o Deus onipotente e infinito que as religiões vendem no “atacado e no varejo”.

Tampouco onisciente, já que segue em direção ao conhecimento, à plena Consciência.

Não é um Deus “pronto para uso”, pois Ele é a vida, a ação, a liberdade e estas são conquistas a serem feitas e não herdadas.

Paralelamente ao divino, são as lutas, as derrotas e as vitórias do homem que formam o “Elã Vital”, ou seja, a ânsia que o impulsiona em sua busca interminável.

Assim, Deus e homem partilham dos mesmos impulsos, das mesmas buscas infindas e isso faz com que seja praticamente impossível traçar uma linha que os diferencie.

São as duas faces de uma mesma moeda chamada “Vida”.

Adendo – Conhecimentos Relativo e Absoluto

Acerca da Intuição e do Pensamento Reflexivo, nota-se que BÉRGSON usou esses conceitos para analisar os tipos de Conhecimento que são possíveis ao homem. Têm-se então que:

1. O Conhecimento Relativo, feito através do Intelecto e da Racionalidade, só consegue ofertar um Saber relativo, longe da Essência das coisas estudadas.

2. O Conhecimento Absoluto, oriundo da Apreensão Intuitiva (ou da captura de dados através da Intuição) oferece o “Saber Total” sobre as coisas estudadas. As suas “Essências”, ie, como as coisas são realmente.

Segundo KANT, o segundo tipo de Saber não é possível ao homem. Porém, BÉRGSON insistiu no contrário, afirmando que poderia, sim, ser viável desde que a Intuição fosse “treinada”, em conformidade com o senso de tempo. Para ilustrar seus argumentos, citou o seguinte exemplo: é possível conhecer uma cidade através de fotografias, mas será um Conhecimento Relativo, parcial, incompleto.

Porém, ao se caminhar pela mesma, é possível sentir o Tempo e, também, a sensação dos “vários tempos” que se desdobram pela cidade. E como está no “Tempo”, no “Passado”, a Essência das coisas será possível, segundo BÉRGSON, captar a Essência da própria cidade. O mesmo, claro, se dá em relação ao Mundo, às Coisas, à Vida etc.