O CARÁTER TRANSITÓRIO DA VERDADE

A grande verdade é que ela não é absoluta, posto que, é justamente esse caráter transitório que lhe confere a premissa de qualquer indagação. Não fosse assim, a verdade, não nos municiaria de elementos pelos quais poderíamos questioná-la, ao contrário do dogma ou do axioma que se lhes atribui uma "verdade" inconteste.

Mas também poderão dizer: não é verdade que o sangue é vermelho, a folha de uma planta verde? Bem, ai se poderia dizer que não se trata de ser verdade ou não se tais exemplos constituem assertivas verdadeiras, mas, como toda a linguagem e, por consequência, toda denominação e também a "verdade" são elementos convencionados. É por isso que, a meu ver, toda nossa História se baseia em fundamentos orais, depois descritivos. O caráter oral da linguagem e da "verdade" estão submetidos ás convenções e cultura de uma determinada fração de grupos constituintes de uma sociedade. Porém, não se pode negar que certas convenções são tão universais que logo se lhe atribuem valor de verdade: é o caso da cor do sangue e da folha de uma planta.

Mas tomemos a "verdade" buscada num inquérito policial: não basta o suspeito afirma-se como o autor de determinado crime. Será instaurado o inquérito que, além de se debruçar sobre a confissão, terá que levantar causas, testemunhas, perícias, laudos, fazer interrogatórios para que se chegue de fato ao autor do apurado. Então, somente a confissão, ela por si só, não qualifica o confessante como possível candidato à condenação.

Vejamos outro exemplo: num teste de paternidade costuma-se considerar 99,999% de probabilidade para se declarar ser esse ou não pai ou mãe de determinada criança. Duas coisas se desprende disso: primeiro, fala-se em probabilidade, portanto, não se trabalha com o conceito de verdade; e sendo mera probabilidade, trata-se de cálculo matemático, e como tal, sujeito a oscilações. Segundo, os 0,01 restantes podem ser o elemento negatizante daquela certeza, ou verdade, como queiram. Noutras palavras: se a verdade fosse determinada por cálculos e ou estatísticas, nenhuma pesquisa traria em seu método "a margem de erro", posto que a necessidade de se adotar uma "margem de erro", demonstra que, ainda que mínima, essa margem aponta para uma incerteza da conclusão apurada.

Com o que acabamos de colocar como exemplos da transitoriedade da verdade e, por consequência da sua convencionalidade, pode-se dizer que se trata tão somente de mero consenso coletivo. E mais, sendo consenso coletivo, configura-se ai uma espécie de contrato para que as relações, numa determinada sociedade, se estabelizem para a felicidade geral e harmonia de todos.

Concluímos do que se disse, que a verdade não é algo dado, imutável, irretocável ou imune a alterações. Ao contrário, vimos que ela é tão mutante quanto o vírus da gripe e que, sem nos propormos a algozes da verdade, temos claro que, mesmo que se reconheça seu caráter alternante, não podemos negar que sua "aceitação" tem conseguido manter-nos mais dóceis, ou menos selvagens, como diriam os pessimistas. Por outro lado, sua aceitação inconteste também tem o efeito colateral de nos tornar menos críticos e mais cegos.