ENSAIO SOBRE A VIOLÊNCIA

Olho em volta todos os dias de minha vida e paro em devaneios a me perguntar para onde estamos indo. A sociedade atual vivencia diariamente uma banalização gratuita da violência. As câmeras, a televisão, as redes sociais estão sim, a serviço da informação e estão fazendo o seu papel com maestria inabalável. Não se pode negar que cada vez mais a mídia e a indústria midiática vem agindo com um papel de suma importância na denuncia ao publico de fatos e atos de violência social no Brasil e no mundo. No entanto, é importante lembrar que apenas alertar não está sendo suficiente. Estamos cada vez mais passivos a encarar cenas de morte, assaltos e violências com uma calma fora do humano. Nossos olhos estão marcados por crimes e mais crimes todos os dias. Experimente assistir dois minutos de telejornal e o que você verá serão apenas sobre morte, crimes, problemas sociais. Vez ou outra uma notícia de moda, culinária ou lazer... Mas violado pela criminalidade o seu medo o impedirá até de sair de casa para o seu lazer. A violência de todas as formas imagináveis tornou-se uma fonte de lucros aos meios de comunicação. Ninguém quer saber do professor modelo que executou um trabalho belíssimo em uma instituição de ensino qualquer ou quem sabe do casamento entre duas pessoas pobres, mas que se amam verdadeiramente ao ponto de superarem as dificuldades. Mas se o professor modelo após anos de trabalho desvalorizado, salários miseráveis e atrasados surtar durante uma tentativa de aula estressante com meia dúzia de alunos mal educados, mimados, arrogantes, soberbos e cheios de si, protegidos pelo ECA e pagantes assíduos das mensalidades, logo virará capa de todos os jornais, será preso, condenado e massacrado por todos... E ainda, se o tal casal apaixonado cair na desgraça da pobreza e decidirem planejar um assalto que acidentalmente termine em morte, com toda certeza do mundo serão motivo de debates para meses de programas de televisão sensacionalista.

Deixo claro que jamais, nunca e em hipótese nenhuma estou aqui fazendo apologia ao crime ou protegendo atitudes de transgressão e contravenção a ordem e a ética. Mas estou justamente pontuando um fato lógico. É mais fácil se deliciar com erros cometidos pelos outros do que tentar auxiliar para que tais erros não sejam cometidos. A mídia se alimenta e nos vicia por meio das desgraças sociais. A violência não é um mito: ela existe. Mas ao ser denunciada ela é não sanada!

O que adianta apontar os defeitos visíveis e desbotados se não se apresenta as soluções cabíveis.

Gente: Um professor ganha pouco. O país faz propaganda da educação e diz que “a base de toda conquista é o professor...”, mas essa base atualmente está frágil e desgastada, desgostosa e doente de verdade! Os poderes públicos quando fazem aumento salarial na conta do professor aumenta cerca de 2%. É o que traduzido em real dá uns cinquenta centavos. E sabe por que não se aumenta mais? Porque existe deputado, senador, vereador e secretário de tudo que é coisa que leva cerca de 200% de aumento em cima do que se recebe. Tem gente com cargo arranjado por prefeituras por aí a fora que ganha em um mês o que o professor ganha em seis meses de pó de giz, sala de aula sucateada e patrões antiéticos (e olha que eu não estou me referindo as escolas públicas).

Será que alguém já se deu conta que os professores precisam comer, se divertir, pagar contas e investir na sua própria formação? Alguém já percebeu que nesse nosso país é mais fácil se comprar drogas do que um livro de qualidade? E que os livros de qualidade em nosso país são investimentos caros onde o professor não tem como fazê-lo, pois ou ele compra o livro e come suas folhas ou faz a feira e paga as contas? Mas é claro que sempre tem alguém que só sabe ser do contra pode argumentar: mas ser professor é uma dádiva! É um capricho se lastimar...! Já se ganha o suficiente!

Pois eu vos digo outra verdade: ninguém percebeu que hoje em dia o trabalho que os Pais não fazem em casa estão sendo providenciados pelos tais Professores (ou até poderia Trocadilhar com o termo Sofressores). O aluno não sabe se comportar socialmente é agressivo ou dependente demais, está degradado por causa de problemas familiares que transbordam em sua vida, e nesse meio o professor tem o papel de pai, mãe, psicólogo, psiquiatra, enfermeiro, babá, amigo, policial, perito, e se der tempo ele até pode experimentar dar aulas! Não exagero porque quero. Falo de uma atual realidade (por sinal a minha mesmo).

Atualmente trabalho em três escolas como professora de artes e em uma atuo como professora de língua portuguesa. Você pode estar aí dizendo: “Noooooooooooossa! Ela vive bem”!Trabalha em três escolas!!!!

Não posso fazer outra coisa a não ser rir! Não por deboche, mas por pena de mim mesma talvez. A única coisa que o título “professor” possui certamente é uma sensação de falso Status para quem o utiliza.

Juntando as três escolas uma ajuda de custo de alguns reais a mais, chegando de forma suada e apertada a quase R$. 1.100,00. Isso se os malditos descontos sindicais não surrupiarem o pouco que conquisto ( Descontos estes que não sei ainda pra que servem de verdade!)

Eu amo o que faço, mas já entrei em crise várias vezes. Pergunto-me o que estou fazendo. Se estou errando e em quê! Mas sempre conversos com meus amigos de trabalho, sofressores como eu e atuantes em áreas diferentes. É estranho, mas fico até aliviada em saber que o problema não aparece apenas em minhas aulas. Compartilhamos casos e problemas e às vezes imagino que nossas conversas devem parecer com as reuniões dos Alcoólicos Anônimos com a diferença que no nosso discurso poderíamos até finalizar dizendo “mais um dia, sobrevivemos à sala de aula e nesse mês sobrou dinheiro para fazer a feira sem faltar nenhum item!”

Não pelo o que faço, pois amo dar aulas, mas digo bem: Dar Aulas. Mas na maioria das vezes a “clientela” não está socialmente preparada para assistir aulas, e as escolas estão longe de estarem preparadas também. E já que falei de clientela, surge aí àquela estúpida ideia de venda de educação: Não se vende educação, minha gente! É por isso a educação está do jeito que tá, pois a escolar virou empresa, os professores são operários que se alfinetam entre si para ficarem bem vistos aos olhos dos patrões (o típico babão). E aí esquecemos que nossos alunos não são clientes... São pessoas. E a cada vez que ouço um patrão referir-se ao aluno como um cliente, sinto-me uma lavadeira de roupa da casa-grande. Aí sinto uma irremediável vontade de retornar ao nosso tema inicial sobre a mídia. A mídia tão encantadora! O que ela faz diante disso tudo? Nada!

Não consigo entender como a mídia sabe de tudo, dos grampos, das Cachoeiras, das pizzas dos outros e de tantas Torres esfareladas por nossa política suja e colonial e não se posiciona de forma prática e preocupada em relação aos efeitos desse nosso desdém. Tudo o que acontece no nosso meio é culpa NOSSA! Tanta intolerância, falsa modéstia, falsos deuses, falsas curas, e falsa cultura de massa que amassa e nos engole, antropofagicamente!

E o que dizer então dos Falsos humoristas... Essa classe pobre coitada (de espírito artístico) que acha que fazer humor é tripudiar dos outros e de suas diferenças! Que tem certeza e que nos faz achar que humor é perverter a juventude com frases sem sentido e repetidas centenas de vezes até que nos façam adestrar, além de transformar a mulher como um fruto proibido, vazio e que não sabe nada a não ser rebolar suas bundas de plástico, seios postiços, cabelos escovados e aplicados. (não sou também contra a beleza, o culto a forma é algo louvável, já diziam os gregos antigos. Mas a produção de mulheres objeto em troca de dinheiro não quer dizer que elas são valorizadas pela mídia... É apenas uma forma branda de escravidão pela imagem!) é só você analisar que nesses programas de humor as mulheres lindas são apenas mulheres lindas. E sei que muitas são inteligentes, complexas e até mais do que os homens do humor! Mas esconder-se por trás da beleza é esconder-se por trás de si mesma! E de toda forma não fugimos da violência gratuita, que nos viola, nos faz nus, despidos estripitizicamente ao gosto das palavras enfáticas de Odorico Paraguaçu exímio político fictício, mas que tem de um tudo da crítica que iniciei antes. Ele é sim uma caricatura de nós mesmos e de nosso povo, de nossa política, de nossa violência que só serve para capa de jornal que no outro dia será esquecido por uma matéria mais impactante e violenta, pois quanto mais sangue, mais lucro, a cada gota desperdiçada, mais notas na conta.

E quando chegamos a nossas salas de aula, eis os nossos pupilos, inebriados por esse bombardeio de violência, envenenados por essa poluição gratuita e acima de tudo, desnorteados! E após tudo isso e tudo o que nós passamos se não guiarmos bem esses pupilos eles podem chegar a se tornar aquele casal sofredor que rouba para não morrer de fome e morre por não saber roubar! Mas será mesmo que a culpa é do professor que já não tem quem olhe por ele mesmo?

Não sei.

Eu só sei o que apesar de todo esse desabafo textual a programação da TV, dos jornais, das redes sócias não vão mudar. Sei até o que vai passar na programação de daqui a pouco: Mais um assalto, mais um viciado, mais um humorista sem graça, mais uma mulher rebolando e no fim da noite quem sabe mais um morto. Um morto não só para a sociedade... Mais um morto para si mesmo que por não saber viver também este nem soube morrer. Mais uma capa de jornal, mais uma notícia pra TV, mais uma foto impactante, mais uma taça de sangue para brindar as vendas de mais um jornal nas bancas da manhã seguinte!

Santa Rita; 13 de Julho de 2012

retificado em 11 de fevereiro de 2013