Há algum tempo venho observando o escasseamento de casais namorando em espaços públicos e em espaços observáveis, isto é, partes internas de prédios, muros de residências, portas de escolas, etc.      
     Ao mesmo tempo venho percebendo o aumento de manifestações violentas nesses mesmos espaços.

     Incomoda-me ver naturalizadas formas agressivas das pessoas se consigo mesma, com as outras e com os outros reinos. Não se passa um dia sem que eu as presencie no transito, em transportes públicos, nas ruas, nas relações de estudo, de trabalho, religiosas e familiares.
Andei compartilhando meu incomodo com algumas pessoas e ouvi explicações para possíveis causas: os casais não namoram mais na rua por causa da violência; agora todo mundo transa, já vai direto para o motel ou para a casa de alguém. Ninguém mais namora dentro de carro, é muito perigoso!
     Por outro lado, um líder espiritual afirmava que quem tem alguma educação espiritual não toca as pessoas. Mistura a energia, assimila fragmentos de karmas dos outros, etc. Lembrei-me de comentários quanto a modos de relacionamento social oriental que prescindem do contato físico. Um exemplo foi o do aperto de mão e do abraço, nos quais se encosta em centros energéticos importantes, causando confusão entre as energias.
     Jeito muito distanciado se conviver pensando na nossa cultura latino-americana. Os latinos  gostamos de tapinhas nas costas, apertos de mão, abraços, beijos e amassos. Mas será que esses contatos não são necessários para a nossa saúde integral? Se não o são, porque sentimos tanta falta deles? Porque tanta sensação de carência? Será que a inserção do contato físico no convívio social é uma construção cultural? Porque esse contato faz parte da nossa cultura, se não o vivemos sentimos falta por condicionamento cultural?
     Não sei responder ainda a essas questões, mas o que sei é o que percebo e sinto. Ando pensando sobre a palavra namorar e fiz uma análise própria, totalmente inventada. Fique pensando que  no ”nam”  pronunciando ao contrário, pronunciamos “man”, parecido com “mão”.  Então concluí: namorar é orar com a mão. Ora, a relação com o sagrado no tocar o outros. 
     Carinhos, carícias, beijos  e jeitos de estar “pele-com-pele” podem ser encarados como atos de buscar o sagrado. O Tantra há milênios nos ensina que o ser humano pode alcançar Deus pelo ato sexual. Ensina técnicas de contato sexual para o uso dessa energia para a elevação da energia “Kundalínea”, denominação advinda da sua comparação com uma serpente de luz que habita enrolada o cóccix e sobe pela coluna vertebral iluminando os chackras (centros captadores, armazenadores e distribuidores  de energia) até iluminar o último, no alto da cabeça.
     Quando digo namoro, não me refiro ao ato sexual genital, somente. Sinceramente, acho que para muita gente isso é o mais fácil. Penso numa concepção ampliada de sexo quando incluo o namoro. Acho que sexo sem namoro não leva ao sagrado, mas acho que namoro sem ato sexual genital, leva sim. 
     Um bom namoro é um rito religioso. Religioso no sentido da palavra em latim “religare”. Religa a pessoa a si mesma, ao outro, ao mundo e a Deus. Ora-se com as mãos, com o corpo, com a mente e com a alma que nas pontas dos dedos pode manifestar a sua luz.
     O outro corpo é o templo onde Deus habita e responde as nossas orações em cada arrepio, em cada sussurro e em cada retribuição.
Deus se levanta do seu altar e vem se fundir a criatura orante. O corpo-templo, venerado, atraente e acariciado acolhe e toda a humanidade do ser amante, venerante, atraído e retribui se movendo respondendo e provocando contato. Criaturas e criadores se tocam numa mútua sacralização desse momento-rito de reencantamento do, “se estar vivo” encontrando sentido na existência, sintetizando tudo ao mesmo tempo neste momento.
     Por esse e outros motivos ouso pedir desculpas aos orientais e aos “espiritualmente educados” e lançar-me a bradar aos quatro ventos “namorem e não matem”, aos outros e a si mesmos. Pela volta das ruas repletas de namorados, risos, afagos, dança sagrada dos corpos se acarinhando.
     No trânsito, ao invés de abrir o vidro e mostrar o dedo médio, abra sua janela e o seu coração para mandar e receber um beijo. Ao invés de xingar, de uma olhada e veja algo que te atraia e profira esse adjetivo para quem lhe deu uma fechada.
     Como educadora, lanço aqui idéias para muitas campanhas, mas o mais importante para mim agora é a sacralização do namoro e que ele seja incentivado em todos os momentos e em todos os lugares. O amor-prazer-gozo de viver invadindo todos os campos da vida. Num delírio final, fico imaginando um baile funk ao invés das pessoas pulando, copulando e fazendo gestos enquanto escutam “um tapinha não dói”, vejo todos e todas respirando profundamente e cantando-se com calma, com o corpo e com a alma, algo como diz a canção:
     “No seu corpo o meu momento é mais perfeito e eu sinto no seu  peito o meu coração bater (...) e embora eu já conheça bem os seus caminhos, me encontro e sou tragado pelos seus carinhos e só me encontro se me perco, no seu corpo.”
     E nesse momento, ocorre um Namastê, pois o "deus que habita em mim saúda o deus que habita em ti" e, ambos felizes, sorriem, se encarnam, se encantam e nos reencantam.