QUAL EPITÁFIO QUE "NOS CABE NESTE LATIFÚNDIO"?
Hoje o Brasil se despede de HEBE CAMARGO, talvez a apresentadora mais renomada da televisão brasileira, uma mulher com imenso carisma, pioneira no que fazia, de evidente vanguarda pois sempre esteve a frente do seu tempo a protagonizar a história dos palcos das programações femininas ,não apenas nos dos programas de entrevistas televisivas, naqueles que entre nós se tornaram um clássico das noites, como também cantando e encenando nos demais palcos artísticos.
Ser entrevistado por HEBE CAMARGO sempre foi o sonho de consumo de muitas famosidades dos meios políticos e das artes, bem como nos das elites socias, posto que sua penetração nas massas era algo impressionante.
Conhecida também por ter opiniões fortes e polêmicas sobres vários assuntos que movimentavam a opinião pública, e por falar o que pensava, Hebe Camargo se despede do mundo a nos deixar lembranças duma mulher bonita, elegante, inteligente, firme, talentosa e sempre muito glamourosa.
O enfrentamento de sua grave doença a classifica como uma mulher de corajosa persistência, pois jamais se deixou abater.
Todavia, neste meu ensaio, o sentimento que me move é sobre o contraste impressionante dos féretros que meus olhos puderam observar há exatamente vinte dias atrás quando, subitamente, perdi um querido amigo.
Meu amigo era um anônimo trabalhador, mas trabalhador mesmo, morreu silenciosamente no seu local de trabalho, sem pompas e sem chance alguma de sobrevida, entre as ferramentas que o auxiliavam no seu labor diário.
Meu amigo era um daqueles cidadãos que como o classificariam os políticos do momento, aqueles que há uma semana das eleições municipais foram prestar suas últimas e justas homenagens à Hebe aqui no Palácio dos Bandeirantes, era um homem socialmente bem pobre, sem influência imediata no mundo que nos cerca, desprovido de letras e de pompas, todavia, lhes digo que com toda certeza foi o amigo mais "rico" que já tive na vida.
Um homem simples, extremamente inteligente e assustadoramente politizado para um ser classificado politicamente como "pobre", o perenemente pobre que todos os políticos do Brasil lutam para as melhorias sociais e para os ter perenemente nas suas urnas.
O que holisticamente me impressionou na despedida do meu pobre amigo rico, aliás, uma cena que jamais esquecerei, foi o seu também bem simples mas não menos digno féretro: ali estavam eu e mais umas seis pessoas, amigas de verdade, juntos aos seus poucos e desolados familiares, sobre um solo cáustico e sob um sol escaldante das quinze horas, em meio a uma fileira enorme de despersonalizadas covas arrancadas duma terra seca e bem vermelha, aonde sob um simples mas emocionado "Pai- Nosso", que ali mesmo iniciamos em voz alta, dele nos despedimos sem aviso prévio e sem flashes algum, na Suprema Fé de que Deus sempre está em qualquer lugar em meio daqueles que se reúnem em Seu nome.
Neste mundo, os contrastes de fato nos assustam e nos obrigam a pensar...
A morte talvez seja o fenômeno que nos deixa o recado mais sábio e preciso sobre a a nossa tão efêmera passagem para destinos totalmente desconhecidos a qualquer um de nós, pobres e ricos, anônimos e famosos.
Uma justa finalização ao tempo de vida terrena através na qual Deus fala seriamente conosco sobre o tão breve tempo que Ele concede a cada um de nós, e que nos tira indistintamente sempre dentro da Sua vontade.
As diferenças, vivas e póstumas, deste nosso mesmo latifúndio ficam sempre por nossa conta.
Deixo aqui, "in memórian", minhas sinceras homenagens tanto à nossa querida Hebe, quanto ao meu querido amigo anônimo, na certeza que ambos terão o mesmo espaço nos mistérios dum céu , já que nos espaços desta terra sempre seguimos por tão distintos destinos.
Entre o dois féretros, as únicas semelhanças que consegui discernir, a tocarem a minha inspiração literária, foram o Mistério que nos cerca em vida e a hermética e tão impessoal cova arrancada da mesma terra vermelha que selou as duas tão distintas despedidas.
Que Deus nunca se esqueça de nós, da pequena e justa parte que nos caberá no Seu eterno latifúndio.