MAAT- O EQUILÍBRIO UNIVERSAL
A tradição hermética
A tradição hermética sustenta que houve uma época na vida da humanidade em que todos os homens tinham consciência da unidade do universo e sabiam que o céu e a terra eram complementos um do outro. Ambos refletiam a Consciência maior que os havia pensado e construído. Era um mundo unificado por dentro e por fora, onde tudo estava em tudo, o que estava dentro era igual ao que estava fora, o que estava em baixo era igual ao estava em cima e dessa forma, o universo se mantinha em equilíbrio constante pelas ações que se desenvolviam em um e outro mundo, sendo o mundo dos homens um reflexo do mundo dos deuses e vice-versa.
Essa idéia prosperou inclusive entre os gregos, que em sua cosmogonia criaram uma plêiade de deuses dotados de super poderes, mas tão humanos que eram capazes de hospedar os mais mesquinhos sentimentos do homem, como a luxúria, a inveja, o ciúme, o rancor etc.
Por isso, acreditavam os gregos que os homens tinham uma grande responsabilidade pelo humor dos deuses. O que faziam na terra podia agradá-los ou desagradá-los. Quando devidamente agraciados eles cobriam a humanidade de favores, quando ofendidos castigavam-na com os mais terríveis sortilégios. Por isso, toda a vida espiritual dos gregos era gasta numa ingente labuta para manter o humor dos deuses favoráveis às suas esperanças.
Essa concepção, que era cosmológica em sua origem, religiosa em sua prática, evoluiu mais tarde para o plano social e ético, dando fundamento a elementos culturais importantes que moldaram comportamentos e inspiraram crenças que ainda hoje informam boa parte da nossa vida espiritual. Entre os povos do Oriente deu fundamento às suas religiões; na Grécia clássica foi o alicerce da filosofia moral da civilização helenística.
Tudo isso se destinava à manutenção do equilíbrio social pela prática de um comportamento que, segundo se pensava, era agradável à divindade. Esse equilíbrio era mantido por uma relação de estreita reciprocidade entre homens e deuses. Destarte, os primeiros lhes prestavam culto e os segundos controlavam a natureza para que esta sempre lhes aparecesse sobre uma forma amigável.
Maat, a Deusa da Justiça
Já antes dos tempos históricos essa noção de perfeito equilíbrio entre o mundo dos homens de dos deuses podia ser observada na cultura religiosa dos povos do Nilo. Vem do antigo Egito, anterior aos faraós, a noção de que esse equilíbrio era realizado pela deusa Maat, a qual agia como uma intermediária entre os homens e os deuses, recolhendo na terra os influxos das boas ações praticadas pela humanidade e levando-as para o céu, como alimento para as divindades; e deles ela trazia para a terra as benesses concedidas, como contra prestação das ações humanas realizadas em sua homenagem.
Assim, o equilíbrio universal era mantido pela prática da maaty, ou seja, o viver de forma virtuosa, praticando a verdadeira justiça. Dessa forma, a ética, a ecologia e a responsabilidade social estavam solidamente vinculadas ao espírito religioso e este, por sua vez, refletia no sistema jurídico, formando um todo harmonioso que dava vida à sociedade, regulando as relações do homem para com a divindade e entre eles próprios. Destarte, a pátria e o povo era a noção ampliada da família do rei-sacerdote, a quem incumbia a mediação dessa relação entre o profano e o sagrado, que se realizava através dos ritos apropriados, instituídos pelos próprios deuses.
Maat era uma das deusas mais respeitada do panteão de deuses egípcios. Encarnava vários princípios, desde a idéia de equilíbrio e mediação entre as ações humanas e divinas até a prática da verdadeira justiça. Por isso, o seu simbolismo está estreitamente ligado ao Direito, sendo ela que preside o julgamento das almas dos mortos. O próprio tribunal onde esse julgamento é feito chamado de Salão de Maat.
Na complexa teologia que os egípcios desenvolveram para justificar suas crenças, a vida além túmulo recebia muito cuidados do que a própria vida diária. Eles viviam muito mais no mundo do espírito do que na carne, propriamente dito. Para eles, o corpo humano era um composto de quatro princípios, onde se alojavam os atributos da vida e os centros de espiritualidade: esses princípios eram chamados de ib, ka, o bai e o akh. O ib (coração), era o órgão dos desejos, ou a mente, a consciência, onde a razão e os desejos se situavam e se desenvolviam. O ka era um principio que pode ser comparado ao que hoje chamamos de duplo astral, uma espécie de entidade que vinha com o corpo quando a pessoa nascia e ficava guardando-o depois que ela morria. Ele habitava no ib (coração) e se desenvolvia a partir dele, se alimentando das qualidades desenvolvidas por esse órgão. Representava a energia responsável pela força vital do homem e informava suas características individuais e seus elementos de personalidade, razões pelas quais, ao morrer, o defunto devia ter seu ka reproduzido em formas de estatuetas, que eram espalhadas pela sua tumba. Essas estatuetas representavam a encarnação de seu ka, ou seja o conjunto de suas qualidades individuais, que deviam ser honradas pelos descendentes, para que esse respeito que o morto conquistara em vida contasse como mérito em seu julgamento no Salão de Maat. Quanto maior o número de estatuetas, maior o ka do defunto ali sepultado.
Já o bai era uma espécie de entidade que corresponde ao que entendemos como espírito, mas somente em sua manifestação externa. Quando o homem desencarnava, o bai se liberava do corpo e se convertia numa forma qualquer de animal ou força da natureza que pudesse representar uma idéia de liberdade. Geralmente o bai era caracterizado por um pássaro com cabeça humana. O falcão era o pássaro preferido para simbolizar essa entidade, razão pela qual esse pássaro tinha uma importância muito grande na iconografia religiosa dos egípcios.
O akh era a entidade que representava a natureza divina presente no homem. Era, por analogia, já que se trata de um conceito de difícil definição, algo assim como “o sopro dos deuses”, correspondente ao “ sopro divino” pelo qual Deus teria animado Adão, segundo a variante bíblica do conceito. Seria essa entidade que, devidamente revê-renciada, possibilitaria ao homem sua volta ao mundo divino e a união final do seu espírito (bai) com Rá, o deus Sol, e sua transformação em estrela. Sua forma exterior era a de um íbis, o pássaro sagrado por excelência, representado pelo deus Thot. As grandes personalidades egípcias, que lograssem atingir o céu de Rá se tornavam estrelas (sahu, sha) , como o faraó Unas, que era reverenciado como sendo a estrela Orion.[1]
Maat – Energia cósmica
É impossível entender a sociedade egípcia sem levar em conta a idéia que eles faziam do símbolo religioso representado pela palavra. Essa palavra é encontrada em sua literatura como designativa de diversas coisas. Em primeiro lugar era representada através de uma linda mulher, a deusa Maat, esposa de Thot (conhecido pelos gregos como Hermes). Maat era a deusa governadora da Justiça, mas designava também uma espécie de tribunal divino que julgava o homem após sua morte, (Os Senhores de Maat). A nível humano Maat era uma manifestação do poder divino na terra, para mantê-la num estado permanente de harmonia e ordem.
Maat, portanto, além de ser uma das deusas do panteão egípcio, podia ser entendida como uma espécie de energia que proporcionava unidade ao universo e prodigalizava condições para um pensar e um agir destinado á manutenção dessa unidade, através de um estado interior de ordem, harmonia e equilíbrio entre todas as forças do universo.
Maat, portanto, era, ao mesmo tempo, uma deusa e um conceito filosófico dos mais importantes na vida dos egípcios. Nas esferas celestes, ou na terra, ou na estrutura psicológica dos seres humanos, Maat devia ser praticada como principio de vida e cultuada como atributo divino na terra para realizar essa harmonia. Maat devia orientar os passos dos homens e dos deuses. Quando ela era desprezada no céu implantava-se a desarmonia naquelas esferas e o desequilíbrio que lá se verificava instalava-se também na terra. Da mesma forma, quando ela era esquecida na terra a desordem se refletia no céu.
Isso mostra que os egípcios viam a estrutura do céu bastante semelhante à da terra. Uma era o reflexo da outra. Por isso a existência humana continuava a fluir, numa outra forma, após a morte. O homem, ao morrer, passava de uma condição para outra, e para que sua vida continuasse a se desenvolver no outro mundo, era preciso que seu corpo fosse conservado em bom estado na terra, pois quando o seu invólucro carnal dete-riorasse e desaparecesse por completo, o seu ka também desapareceria, comprometendo a continuidade da sua vida além túmulo. Daí o desenvolvimento das técnicas de mumificação que ainda hoje despertam tanto interesse nos estudiosos da civilização egípcia.
Maat era o denominador comum entre todas as estruturas do universo, a divina e a profana, a visível e a invisível. Quem vivesse de acordo com sua lei atravessava, incólume, a Tuat, sombria região intermediária povoada por monstros e demônios de toda espécie, que existia entre a vida terrestre e o território luminoso de Rá, o Deus Sol, principio criador de tudo que existe no universo, com ele fundindo-se, afinal, na sua luz divina. Essa fusão era a salvação definitiva, a sua transformação em astro luminoso.
Por isso Maat era a deusa mais reverenciada no antigo Egito. Seu nome era designativo da ordem cósmica, e também da verdade e da justiça, que eram as virtudes mais apreciadas pela divindade. Os governantes e os funcionários públicos, os homens de responsabilidade na política, na economia, na religião, enfim em todos os setores da sociedade egípcia tinham que render culto sincero a Maat enquanto representação do poder divino, e á Maat enquanto encarnação desse principio na vida do homem.
Como divindade, Maat era tida como filha direta de Rá e esposa de Thot. Era representada por uma bela jovem, às vezes sentada, ás vezes em pé, sempre com uma pena de avestruz sobre a cabeça. Essa pluma era um símbolo da leveza que a alma humana devia ter quando se apresentasse no salão da Tuat para ser julgada pelo tribunal dos deuses chefiado por Osíris. Ali se pesava o coração do defunto e se fosse encontrado peso menor que a Maat simbolizada por aquela pena de avestruz, o defunto era considerado limpo e puro.
Politicamente, Maat encarnava o ideal do estado e simbolizava a própria instituição faraônica. Era uma deusa que exigia dos homens uma vida de retidão, justiça e respeito ás coisas divinas. Era particularmente rígida em relação aos governantes, até pelo fato deles serem os representantes dos deuses na terra. Somente o faraó que tivesse governado de acordo com suas leis obtinha julgamento benevolente por parte do tribunal presidido por Osiris e podia unir-se a Rá, tornando-se também um deus. [2]
Por isso o faraó detinha não só o poder temporal mas também o religioso. Ele era, por excelência, um rei sacerdote. Uma de suas funções mais importantes era a observância dos ritos sagrados, pelos quais Maat se manifestava da terra para o céu e, reci-procamente, do céu para a terra.
Daí se dizer que a função do rei era honrar Maat, distribuindo justiça na terra através de um governo benevolente e justo e conservando o beneplácito dos deuses construindo templos, preservando a religião e respeitando os rituais.
Com isso, acreditavam os egípcios, a grandeza da sua civilização duraria para sempre.
Maat e Maçonaria
O conceito expresso pelo símbolo Maat é conservado na Maçonaria como um dos alicerces em que se apóia a filosofia cultivada pelos Obreiros da Arte Real. Essa idéia será desenvolvida em praticamente todos os graus filosóficos, particularmente os chamados graus dedicados à Justiça (14 a 18 do REAA), onde a deusa Maat aparece como um dos ícones utilizados no simbolismo desenvolvido nesses graus. Com o que foi exposto acima torna-se clara a razão da utilização desse símbolo da tradição egípcia na concepção da ritualística ali praticada. Além disso, recupera-se a beleza da concepção sobre a qual a filosofia desses graus foi construída, mostrando a importância desse estudo para a cultura do verdadeiro maçom, pois esta, como se sabe, está estruturada nesses dois alicerces que são a Justiça e a Virtude. [3]
A tradição hermética
A tradição hermética sustenta que houve uma época na vida da humanidade em que todos os homens tinham consciência da unidade do universo e sabiam que o céu e a terra eram complementos um do outro. Ambos refletiam a Consciência maior que os havia pensado e construído. Era um mundo unificado por dentro e por fora, onde tudo estava em tudo, o que estava dentro era igual ao que estava fora, o que estava em baixo era igual ao estava em cima e dessa forma, o universo se mantinha em equilíbrio constante pelas ações que se desenvolviam em um e outro mundo, sendo o mundo dos homens um reflexo do mundo dos deuses e vice-versa.
Essa idéia prosperou inclusive entre os gregos, que em sua cosmogonia criaram uma plêiade de deuses dotados de super poderes, mas tão humanos que eram capazes de hospedar os mais mesquinhos sentimentos do homem, como a luxúria, a inveja, o ciúme, o rancor etc.
Por isso, acreditavam os gregos que os homens tinham uma grande responsabilidade pelo humor dos deuses. O que faziam na terra podia agradá-los ou desagradá-los. Quando devidamente agraciados eles cobriam a humanidade de favores, quando ofendidos castigavam-na com os mais terríveis sortilégios. Por isso, toda a vida espiritual dos gregos era gasta numa ingente labuta para manter o humor dos deuses favoráveis às suas esperanças.
Essa concepção, que era cosmológica em sua origem, religiosa em sua prática, evoluiu mais tarde para o plano social e ético, dando fundamento a elementos culturais importantes que moldaram comportamentos e inspiraram crenças que ainda hoje informam boa parte da nossa vida espiritual. Entre os povos do Oriente deu fundamento às suas religiões; na Grécia clássica foi o alicerce da filosofia moral da civilização helenística.
Tudo isso se destinava à manutenção do equilíbrio social pela prática de um comportamento que, segundo se pensava, era agradável à divindade. Esse equilíbrio era mantido por uma relação de estreita reciprocidade entre homens e deuses. Destarte, os primeiros lhes prestavam culto e os segundos controlavam a natureza para que esta sempre lhes aparecesse sobre uma forma amigável.
Maat, a Deusa da Justiça
Já antes dos tempos históricos essa noção de perfeito equilíbrio entre o mundo dos homens de dos deuses podia ser observada na cultura religiosa dos povos do Nilo. Vem do antigo Egito, anterior aos faraós, a noção de que esse equilíbrio era realizado pela deusa Maat, a qual agia como uma intermediária entre os homens e os deuses, recolhendo na terra os influxos das boas ações praticadas pela humanidade e levando-as para o céu, como alimento para as divindades; e deles ela trazia para a terra as benesses concedidas, como contra prestação das ações humanas realizadas em sua homenagem.
Assim, o equilíbrio universal era mantido pela prática da maaty, ou seja, o viver de forma virtuosa, praticando a verdadeira justiça. Dessa forma, a ética, a ecologia e a responsabilidade social estavam solidamente vinculadas ao espírito religioso e este, por sua vez, refletia no sistema jurídico, formando um todo harmonioso que dava vida à sociedade, regulando as relações do homem para com a divindade e entre eles próprios. Destarte, a pátria e o povo era a noção ampliada da família do rei-sacerdote, a quem incumbia a mediação dessa relação entre o profano e o sagrado, que se realizava através dos ritos apropriados, instituídos pelos próprios deuses.
Maat era uma das deusas mais respeitada do panteão de deuses egípcios. Encarnava vários princípios, desde a idéia de equilíbrio e mediação entre as ações humanas e divinas até a prática da verdadeira justiça. Por isso, o seu simbolismo está estreitamente ligado ao Direito, sendo ela que preside o julgamento das almas dos mortos. O próprio tribunal onde esse julgamento é feito chamado de Salão de Maat.
Na complexa teologia que os egípcios desenvolveram para justificar suas crenças, a vida além túmulo recebia muito cuidados do que a própria vida diária. Eles viviam muito mais no mundo do espírito do que na carne, propriamente dito. Para eles, o corpo humano era um composto de quatro princípios, onde se alojavam os atributos da vida e os centros de espiritualidade: esses princípios eram chamados de ib, ka, o bai e o akh. O ib (coração), era o órgão dos desejos, ou a mente, a consciência, onde a razão e os desejos se situavam e se desenvolviam. O ka era um principio que pode ser comparado ao que hoje chamamos de duplo astral, uma espécie de entidade que vinha com o corpo quando a pessoa nascia e ficava guardando-o depois que ela morria. Ele habitava no ib (coração) e se desenvolvia a partir dele, se alimentando das qualidades desenvolvidas por esse órgão. Representava a energia responsável pela força vital do homem e informava suas características individuais e seus elementos de personalidade, razões pelas quais, ao morrer, o defunto devia ter seu ka reproduzido em formas de estatuetas, que eram espalhadas pela sua tumba. Essas estatuetas representavam a encarnação de seu ka, ou seja o conjunto de suas qualidades individuais, que deviam ser honradas pelos descendentes, para que esse respeito que o morto conquistara em vida contasse como mérito em seu julgamento no Salão de Maat. Quanto maior o número de estatuetas, maior o ka do defunto ali sepultado.
Já o bai era uma espécie de entidade que corresponde ao que entendemos como espírito, mas somente em sua manifestação externa. Quando o homem desencarnava, o bai se liberava do corpo e se convertia numa forma qualquer de animal ou força da natureza que pudesse representar uma idéia de liberdade. Geralmente o bai era caracterizado por um pássaro com cabeça humana. O falcão era o pássaro preferido para simbolizar essa entidade, razão pela qual esse pássaro tinha uma importância muito grande na iconografia religiosa dos egípcios.
O akh era a entidade que representava a natureza divina presente no homem. Era, por analogia, já que se trata de um conceito de difícil definição, algo assim como “o sopro dos deuses”, correspondente ao “ sopro divino” pelo qual Deus teria animado Adão, segundo a variante bíblica do conceito. Seria essa entidade que, devidamente revê-renciada, possibilitaria ao homem sua volta ao mundo divino e a união final do seu espírito (bai) com Rá, o deus Sol, e sua transformação em estrela. Sua forma exterior era a de um íbis, o pássaro sagrado por excelência, representado pelo deus Thot. As grandes personalidades egípcias, que lograssem atingir o céu de Rá se tornavam estrelas (sahu, sha) , como o faraó Unas, que era reverenciado como sendo a estrela Orion.[1]
Maat – Energia cósmica
É impossível entender a sociedade egípcia sem levar em conta a idéia que eles faziam do símbolo religioso representado pela palavra. Essa palavra é encontrada em sua literatura como designativa de diversas coisas. Em primeiro lugar era representada através de uma linda mulher, a deusa Maat, esposa de Thot (conhecido pelos gregos como Hermes). Maat era a deusa governadora da Justiça, mas designava também uma espécie de tribunal divino que julgava o homem após sua morte, (Os Senhores de Maat). A nível humano Maat era uma manifestação do poder divino na terra, para mantê-la num estado permanente de harmonia e ordem.
Maat, portanto, além de ser uma das deusas do panteão egípcio, podia ser entendida como uma espécie de energia que proporcionava unidade ao universo e prodigalizava condições para um pensar e um agir destinado á manutenção dessa unidade, através de um estado interior de ordem, harmonia e equilíbrio entre todas as forças do universo.
Maat, portanto, era, ao mesmo tempo, uma deusa e um conceito filosófico dos mais importantes na vida dos egípcios. Nas esferas celestes, ou na terra, ou na estrutura psicológica dos seres humanos, Maat devia ser praticada como principio de vida e cultuada como atributo divino na terra para realizar essa harmonia. Maat devia orientar os passos dos homens e dos deuses. Quando ela era desprezada no céu implantava-se a desarmonia naquelas esferas e o desequilíbrio que lá se verificava instalava-se também na terra. Da mesma forma, quando ela era esquecida na terra a desordem se refletia no céu.
Isso mostra que os egípcios viam a estrutura do céu bastante semelhante à da terra. Uma era o reflexo da outra. Por isso a existência humana continuava a fluir, numa outra forma, após a morte. O homem, ao morrer, passava de uma condição para outra, e para que sua vida continuasse a se desenvolver no outro mundo, era preciso que seu corpo fosse conservado em bom estado na terra, pois quando o seu invólucro carnal dete-riorasse e desaparecesse por completo, o seu ka também desapareceria, comprometendo a continuidade da sua vida além túmulo. Daí o desenvolvimento das técnicas de mumificação que ainda hoje despertam tanto interesse nos estudiosos da civilização egípcia.
Maat era o denominador comum entre todas as estruturas do universo, a divina e a profana, a visível e a invisível. Quem vivesse de acordo com sua lei atravessava, incólume, a Tuat, sombria região intermediária povoada por monstros e demônios de toda espécie, que existia entre a vida terrestre e o território luminoso de Rá, o Deus Sol, principio criador de tudo que existe no universo, com ele fundindo-se, afinal, na sua luz divina. Essa fusão era a salvação definitiva, a sua transformação em astro luminoso.
Por isso Maat era a deusa mais reverenciada no antigo Egito. Seu nome era designativo da ordem cósmica, e também da verdade e da justiça, que eram as virtudes mais apreciadas pela divindade. Os governantes e os funcionários públicos, os homens de responsabilidade na política, na economia, na religião, enfim em todos os setores da sociedade egípcia tinham que render culto sincero a Maat enquanto representação do poder divino, e á Maat enquanto encarnação desse principio na vida do homem.
Como divindade, Maat era tida como filha direta de Rá e esposa de Thot. Era representada por uma bela jovem, às vezes sentada, ás vezes em pé, sempre com uma pena de avestruz sobre a cabeça. Essa pluma era um símbolo da leveza que a alma humana devia ter quando se apresentasse no salão da Tuat para ser julgada pelo tribunal dos deuses chefiado por Osíris. Ali se pesava o coração do defunto e se fosse encontrado peso menor que a Maat simbolizada por aquela pena de avestruz, o defunto era considerado limpo e puro.
Politicamente, Maat encarnava o ideal do estado e simbolizava a própria instituição faraônica. Era uma deusa que exigia dos homens uma vida de retidão, justiça e respeito ás coisas divinas. Era particularmente rígida em relação aos governantes, até pelo fato deles serem os representantes dos deuses na terra. Somente o faraó que tivesse governado de acordo com suas leis obtinha julgamento benevolente por parte do tribunal presidido por Osiris e podia unir-se a Rá, tornando-se também um deus. [2]
Por isso o faraó detinha não só o poder temporal mas também o religioso. Ele era, por excelência, um rei sacerdote. Uma de suas funções mais importantes era a observância dos ritos sagrados, pelos quais Maat se manifestava da terra para o céu e, reci-procamente, do céu para a terra.
Daí se dizer que a função do rei era honrar Maat, distribuindo justiça na terra através de um governo benevolente e justo e conservando o beneplácito dos deuses construindo templos, preservando a religião e respeitando os rituais.
Com isso, acreditavam os egípcios, a grandeza da sua civilização duraria para sempre.
Maat e Maçonaria
O conceito expresso pelo símbolo Maat é conservado na Maçonaria como um dos alicerces em que se apóia a filosofia cultivada pelos Obreiros da Arte Real. Essa idéia será desenvolvida em praticamente todos os graus filosóficos, particularmente os chamados graus dedicados à Justiça (14 a 18 do REAA), onde a deusa Maat aparece como um dos ícones utilizados no simbolismo desenvolvido nesses graus. Com o que foi exposto acima torna-se clara a razão da utilização desse símbolo da tradição egípcia na concepção da ritualística ali praticada. Além disso, recupera-se a beleza da concepção sobre a qual a filosofia desses graus foi construída, mostrando a importância desse estudo para a cultura do verdadeiro maçom, pois esta, como se sabe, está estruturada nesses dois alicerces que são a Justiça e a Virtude. [3]
[1] E. Wallis Budge, op citado, Vol I, pg. 418
[2] “ Como poder moral”, escreve Budge, “ Maat era a maior de todas as deusas. E na sua forma dual, era a deusa do Norte e do Sul, personificando a Senhora que presidia o Tribunal dos deuses, personificação da justiça. Julgando pelo peso dos corações, ela assumia muitas vezes a forma de uma balança”. E. A Wallis Budge, op citado pg. 418
[3]Para maiores referências sobre esse tema veja-se a nossa obra “Conhecendo a Arte Real”- Madras, 2007