Arne NAESS - Filósofos Modernos e Contemporâneos
NAESS, Arne
1912 – 2009
“Presidente do GREENPEACE Norueguês em 1988”
“Pense como uma Montanha”. Aldo Leopold
O Pensamento pelo Futuro tem que ser leal à Natureza.
Em c. 1660 o Filósofo Espinosa (1632 – 1677) propôs sua “Filosofia da Natureza” como uma “Extensão de Deus”. Abusando da “Licença Literária”, diremos que propôs ser o Mundo o “corpo físico” de Deus.
Em 1960, o cientista britânico James Lovelock propôs sua Teoria chamada de “Hipótese de Gaia”, na qual defende o ponto de vista da Terra ser um “organismo vivo”.
Reutilizando, novamente, a “Licença Literária” pode-se imaginar que o Homem é um micróbio (ou uma micro vida, semelhante aos milhões que habitam o seu próprio corpo) que se hospeda no interior do “Corpo de Deus”, ou no “Organismo Vivo”.
Pois bem, quando os micróbios que habitam o Corpo do Homem prejudicam sua saúde e ameaçam sua existência, recebem como resposta a mais completa eliminação através do uso de medicamentos.
Mas não se sabe se os Micróbios que habitam o corpo humano tomam voluntariamente, ou por mera ignorância o remédio que os haverá de exterminar.
Quanto ao Homem, sabe-se que sim...
Enquanto escrevo este Ensaio, há poucos quilômetros da minha mesa acontece uma reunião (Rio + 20) que deveria discutir e encontrar soluções para os problemas ecológicos que o Mundo, ou melhor, que a Humanidade enfrenta.
Contudo, antes de seu encerramento uma única conclusão é visível: foi um retumbante fracasso!
Por que?
Se a maioria das pessoas diz concordar sobre a necessidade de que se façam os ajustes necessários para equilibrar o consumo humano com as possibilidades da Terra, por que não se chega a um acordo?
Ganância, arrogância, ignorância? Certamente. E mais o que?
Seremos atraídos, seduzidos inexoravelmente para o fim inevitável que a natureza promove quando lhe convém limpar o Planeta da espécie que lhe é mais perniciosa?
Ou haverá alguma esperança nessa luta que Ecologistas, ou apenas cidadãos conscientes, desenvolvem com tenacidade?
O Ecologismo ganhou vigor a partir do bombardeio de Hiroshima, que obrigou o Japão a se render. Pela primeira vez a Humanidade viu o poder que dispunha para exterminar a vida no Globo.
Os bíblicos cataclismos saltaram da condição de mera hipótese para a de possibilidade. Talvez probabilidade. O “Fim do Mundo” tornou-se palpável. E ao medo atômico, não tardou a se juntar a paúra pelo esgotamento dos recursos naturais (vale dizer: fome e sede) e pela degradação ambiental e climática. O “horror de Malthus*” foi ressuscitado.
NOTA do AUTOR – O Economista Malthus (Thomas Robert, 1766 – 1834 – Grã Bretanha) ficou conhecida pelo pessimismo que impregnava ao seu Pensamento filosófico e foi de sua lavra a trágica equação que previa uma Progressão Geométrica (2, 4, 8, 16, 32) na população da Terra e apenas uma Progressão Aritmética (2, 4, 6, 8) na produção de alimentos. Ou seja, chegaria o dia em que o Planeta não conseguiria sustentar a todos os Homens. Até agora a profecia foi afastada, entre outros motivos, pelo avanço tecnológico que permite melhores colheitas e maior produtividade. Contudo a degradação promovida pela Humanidade pode ser um fator não previsto por Malthus, mas que acabará auxiliando para que seu tenebroso vaticínio se cumpra.
E como o medo e a necessidade geram todas as atitudes, no espaço de poucos anos, Conceitos enraizados foram drasticamente soterrados e o padrão a ser seguido mudou drasticamente. O conceito de Conservacionismo instalou-se definitivamente entre os Homens.
Apesar de todos os pesares, a Consciência de que os Recursos Naturais são finitos e de que a Biodiversidade é imprescindível para a nossa própria sobrevivência adentrou em “Mentes e Corações” e os antigos paradigmas se inverteram. Quase que de chofre, caçador tornou-se assassino; lenhador tornou-se predador e pecuarista latifundiário, praga a ser exterminada. O desenvolvimento a qualquer preço tornou-se um anátema.
NOTA do AUTOR – recomenda-se a releitura de uma das Histórias Infantis mais célebres do Mundo – O Chapeuzinho Vermelho – para medir a extensão da inversão supra referida. Ali, os heróis eram o lenhador e o caçador, enquanto que o vilão era o Lobo. Absolutamente o inverso de hoje.
E são esses novos conceitos, essas novas posturas – em escalas e intensidades variadas – que desenham o Futuro. Alguns rejeitam os excessos dos Ecologistas, principalmente quando seus interesses são atingidos, como se verifica com a famosa “Bancada Ruralista” do Congresso Brasileiro. Outros os incentivam e outros, ainda, os praticam. O certo, porém, malgrado as variações, é que o Mundo se tornou Ecologista.
Novo Mundo em que determinadas Organizações e determinados Indivíduos tornaram-se destaques pelo fervor de suas convicções e pelo vigor de suas lutas. Dentre esses, neste Ensaio abordaremos au passant, o “Greenpeace” e mais detalhadamente Arne NAESS, que foi seu Presidente na Noruega, no final da década de 1980.
Reconhecido como o principal Filósofo norueguês do século XX, NAESS foi o mais jovem professor da Universidade de Oslo. Aos 27 anos já lecionava na Instituição, onde permaneceu até se aposentar em 1970.
Adepto do montanhismo, foi o comandante de uma bem sucedida expedição à Montanha TIRICH MIR, no Paquistão, em 1950. Além dessa, realizou mais algumas ao redor do Mundo e em todas absorveu uma vasta gama de conhecimentos que serviram para solidificar o amor e o respeito à Natureza que ele naturalmente sempre teve.
Ao se aposentar, aproveitou o tempo livre para desenvolver seu Ativismo e o seu Ideário a favor da Ecologia. Participante ativo (ou Radical*, segundo alguns críticos) de várias campanhas e manifestações, sempre pregou a necessidade de se respeitar os limites do Planeta, a biodiversidade, a bioesfera e, ao cabo, a vida humana, já que tudo isso é feito com a finalidade de lhe garantir a sobrevivência.
*NOTA do AUTOR – em certa ocasião, Arne chegou a se acorrentar às rochas da “Queda Mardalfossen”, na Noruega, para protestar contra a construção de um reservatório.
Em 2005, como reconhecimento pela excelência de sua luta em prol de uma Causa tão nobre – a Causa da Natureza e do Homem – o Filósofo recebeu a Comenda de “Cavalheiro” e não hesitou em utilizar essa nova tribuna para prosseguir as exortações de suas ideias, as quais podem ser resumidas da seguinte maneira:
1 – Pensar como uma Montanha* é
2 – compreender que somos parte (e não Senhores) da Bioesfera.
3 – E entender a nossa responsabilidade em relação aos outros Seres vivos.
4 – Devemos, pois, pensar sobre as necessidades do Meio Ambiente como um Todo e, consequentemente, abandonar a mesquinhez dos desejos individuais e imediatistas.
*NOTA do AUTOR – a expressão “Pensar como uma Montanha” foi criada em 1949, pelo Ecologista estadunidense Aldo Leopold. Guarda Florestal no inicio do século XX, certo dia ele baleou uma loba e escreveu: “alcançamos a velha loba a tempo de ver um brilho verde selvagem morrendo em seus olhos... Percebi e sei desde então que havia algo de novo naqueles olhos, algo conhecido apenas pela loba e pela Montanha”.
A partir desse instante, Leopold teve a ideia de que devemos “pensar como uma Montanha”, reconhecendo não apenas as nossas necessidades, mas as de todos os Seres. E passou a fazer frequentes alertas sobre as implicações ou consequências de nossas atividades e atitudes egoístas e imediatistas. Por isso insistia que: “pensar como uma Montanha”, ou seja, identificar-se com o ambiente em Geral e ter consciência da importância do mesmo em nossas próprias vidas é um ato de suma necessidade para nossa própria sobrevivência como espécie.
A expressão “Pensar como uma Montanha” se tornou direta e intimamente associada ao conceito de “Ecologia Profunda”, criado por NAESS.
Vimos acima, resumidamente, o Pensamento de NAESS e como não poderia ser diferente, o Movimento “Ecologia Profunda” levantou as mesmas bandeiras, as quais podem ser expostas em dois tópicos:
1 – cabe-nos reconhecer que somos “apenas” parte da Natureza e não seu Proprietário ou Senhor. Compreender que não estamos além, acima, ou separados dela. Sem essa compreensão e aceitação, serão inúteis quaisquer tentativas para salvar o Planeta; ou melhor, a vida humana no Planeta.
2 – somos parte da Biodiversidade e dela necessitamos, pois todas as formas de vida são interdependentes. Logo, ao exterminarmos uma espécie, é uma parte de nós mesmos que estamos matando.
Para ele, só protegeremos efetivamente o meio-ambiente e a nós mesmos se adotarmos tal concepção de vida. Conclamou o Mundo a ver que não estamos apartados da Terra e que urge acharmos o nosso lugar nessa cadeia de vidas interligadas, reconhecendo em todas elas, o valor insubstituível de cada uma para a subsistência do Todo.
Também se deve a NAESS a criação do conceito “Eu Ecológico”; ou seja, o percebimento de “si próprio” como um Ser diretamente ligado a uma “Comunidade Maior” que abriga todos os Seres vivos. Desse modo, ampliamos a nossa identificação com o “Mundo dos lobos, dos insetos, das ervas e até das Montanhas”. Perceber-se como um Ser que sabe que o Mundo Natural não é aquilo que lutamos para subjugar, controlar. É, isso sim, o conjunto de todas as Coisas que sustentam os Seres que compartilham o Planeta. É a soma de tudo que existe, inclusive nós. Seres com os mesmos direitos e deveres de todos os outros e que, justamente por isso, não podem extrapolar suas ambições ao ponto de ferir os direitos dos demais. Seres que reconhecem o Mundo Natural como seu próprio lar e que sabem que ao destruir o próprio lar, é a si que condenam.
A “Ecologia Profunda” de NAESS influiu vigorosamente na “Filosofia Ambiental” e no desenvolvimento do “Ativismo Ecológico”, indicando inclusive como é possível para o cidadão das grandes metrópoles, conectar-se com o seu “Eu Ecológico” e a partir daí exercer suas atividades em prol de todos.
Embora tal apossamento seja difícil, reconhece o Filósofo, em virtude das pressões do meio urbano não será de todo impossível se houver firme e convicto desejo do indivíduo, como bem disse o Filosofo e Mestre Zen Robert Aitken Roshi em uma palestra que proferiu no ano de 1984:
“Quando pensamos como uma Montanha, pensamos também como um urso negro, de modo que o mel escorre por sua pele enquanto se toma o ônibus para o trabalho”
São Paulo, 23 de Junho de 2012.