DO MEU PALCO AOS BASTIDORES DAS "APARÊNCIAS"
" Nunca conheci alguém que tivesse levado porrada"
ÁLVARO DE CAMPOS/ EM "POEMA EM LINHA RETA"
Olhar por detrás das cortinas é um assíduo movimento de "palco " que a vida me ensinou a fazer com certa maestria, ademais, se trata dum movimento necessário para que possamos compreender a dinâmica de todos os fatos que nos rebatem no peito e no entendimento .
Se Fernando Pessoa, em todas as suas fantásticas "pessoas" heterônimas ainda estivesse pelo mundo físico, não digo "se não estivesse morto" porque ele e seus personagens estão cada vez mais vivos do que nunca na nossa nada poética dinâmica da vida, decerto que se sentiriam plagiados pelas novelas das telas atuais, em especial pela telenovela global AVENIDA BRASIL.
BRASIL querido a parte, metáfora dispensável, porque obviamente sempre é ele inspiração para outros ensaios mil, o enredo da novela assusta simplesmente pelo fato de ser deveras figurativo da realidade da vida:"uma vingança maquinada por um enredo de vida maquiavelicamente furtado".
Deveras, o ensaio de palco incita a inspiração literária, e eu pergunto: "qual seria a grande novidade?"
Vivemos cada vez mais num mundo de aparências mundanas roubadas e forjadas, sem legitimidade, disputadas a qualquer preço, em que um "ser" para se sentir "sendo", a se dar aparentemente bem no código implantado em todos os setores da vida social , cede ao vale tudo, aceita tudo a qualquer preço, inclusive "gatunar" a história do palco alheio a viver da glória do outro, no medíocre glamour sem lastro, advindo dos escusos bastidores mal -cheirosos que exalam por todos os cantos.
Vivemos a tal " Avenida Brasil" no "dia-a- dia de hoje em dia" de forma inacreditavelmente realista, ainda que possa nos parecer um tanto figurativa...
E haja holofotes para abrilhantar o que não tem mérito algum a nos ofuscar todas as visões mais ingênuas, por ora focadas na superficialidade dos tantos palcos forjadamente ensaiados.
O brilho da festa gatuna, o lixo perfumado, a falta total da ética, do respeito aos costumes arraigados, da valorização do trabalho, do conhecimento, do esforço, da educação, enfim, tudo aquilo que já sabemos, tudo já tão recantado inclusive nos versos dos grandes poetas como o Fernando, daqueles que tinham a grandeza de si lastreada nos valores antigos, todavia sempre pétreos quando a questão é a ética.
Hoje, em meio a tantas falácias e aparências sociais velhacas, se levantarmos, ainda que de soslaio, as cortinas dos bastidores mundanos dos palcos que brilham, do mais distante até os mais próximos à nossa realidade, decerto que o odor nos queimará as narinas.
Já dizia o ditado: "nem tudo que bilha é ouro", no entanto é de assustar o brilho da lataria...que nos engana os sentidos.
A mentira, a multipersonalidade ensaiada, a falsa moralidade, a quebrada manutenção das instituições falidas, a ostentação patética, a falta de compromisso social, o interesse comercial e financeiro no constituído como "sagrado", o bullying contra todos os valores consolidados pelos lastros familiares, enfim, uma bagunça socialmente institucionalizada, mas disfarçada de glamour e arte, que nos faz levantar todas as cortinas dos bastidores antes de simplesmente engolir a realidade das aparências, quase sempre a nos provocar susto, aversão e indignação.
Se a regra de até então era "não confiar em ninguém com mais de trinta anos", lhes asseguro que hoje eu apenas confio em alguém que já levou alguma porrada. São muito poucos, portanto.
Ao restante do respeitoso cenário social das aparências, antes de mais nada, eu levanto as cortinas e dou uma suave espiadela.
É assim que me fortaleço contra todas as falsas aparências.
Afinal, havemos de nos proteger da velhacaria maquiada que nos encena pelos nossos surreais palcos...de tantos perigosos atalhos, pelas nossas tantas avenidas.
Talvez o mais difícil papel dentre os tantos enredos da vida.