A DESPERSONALIZAÇÃO É O DESAFIO (de Joaquim Moncks, sobre meu poema CARRUAGENS)
“CARRUAGENS
Marco Aurelio Veira
Carruagens desgovernadas
despenham-se ladeira abaixo!
A fúria cega dos homens,
das suas coisas esdrúxulas...
A vida transfigurada
num emaranhado de nós...
Mina viva de bravura, força e astúcia,
monto ágil, determinado e másculo
sobre seus cavalos brancos,
pronto a detê-los todos!
Amarga ilusão vaidosa
esfacelada sob as ferraduras...”
Código do texto: T3277601.
http://www.recantodasletras.com.br/poesias/3277601
Enviado em 15/10/2011.
Confrade Marco! Que estejas bem e em paz com os teus afetos. Como se trata de nosso (de minha parte) primeiro encontro neste Recanto, agradeço os teus inteligentes e bem humorados recadinhos e comentários. Estou gostando de tua verve coloquial e – percebo – fogosa de interlocução. Também me agrada a tua busca de conhecimentos, que – parece-me – tens encontrado em alguns de meus escritos aqui publicados. Fico muito feliz e lisonjeado. Grato, muito agradecido... O "Carruagens", acima, me agradou muito pela linguagem enxuta e rasamente codificada (pela ausência do mergulho vertical e polivalente das figuras de linguagem, especialmente as METÁFORAS), ao menos no início da peça, e, na medida em que se escoam os versos, criptografa-se a Palavra para construir as imagens, fosso definidor da linguagem poética, em todos os tempos. Pena que em quase todos os teus versos (já li umas vinte obras, incluindo vários sonetos) haja uma interferência muito forte da primeira pessoa, denunciando o criador/narrador, que passa a fazer parte – fortemente – do contexto. Seria necessário, na 'transpiração', que é o segundo momento de criação – na qual deve predominar o exercício intelectivo – uma maior preocupação com a "despersonalização" do contextual da peça, mesmo que se saiba, por definição, que em Poesia ocorre um subjetivismo que a caracteriza, como ensina o Prof. Massaud Moisés, da USP, cabeça lúcida no assunto da criação literária. E essa intromissão da autoria, no texto, ocorre muito mais no SONETO do que no POEMA, que é o exemplar do gênero, na contemporaneidade, já vão cerca de 90 anos, no Brasil... Talvez porque na sonetística a intimidade intelectiva valha mais, fruto de muitos momentos de convivência na confecção do verso. No verso clássico, o talento intuitivo pesa menos, sobressaindo o artesão, contando sílabas, fazendo rimas, ajustando as ideias ao tamanho do verso, cuidando dos enjambements, que – segundo a Wikipédia – é “a ruptura de uma unidade sintática (uma frase, proposição ou sentença) no final de uma linha ou entre dois versos.”. Percebo, rasamente, também, que há uma característica importante na tua Poética: a UNIVERSALIDADE. O teu verso (em geral) não é apenas bilateral (o Eu e Tu) e, sim, indigita o semelhante, busca o próximo, como na dicção bíblica. É esse apanhado da dimensão humana o que leva à CONFRATERNIDADE como proposta de troca e de interação. Esse "esfacelar-se sob as ferraduras" é denunciador do que falo... Nosso fado é o de estarmos na mesma “carruagem desgovernada”, a qual pode ser a de Apolo. Aquela que, ainda segundo a Wikipédia, carregava “o deus da divina distância, que ameaçava ou protegia desde o alto dos céus, sendo identificado com o sol e a luz da verdade. Fazia os homens conscientes de seus pecados e era o agente de sua purificação”. Cada um de nós, afinal, pode ter dentro de si o apolíneo redivivo, com o comedimento que cabe à devida situação. Deuses e homens são bichos oriundos da mesma fonte. É conveniente lembrar que a Poesia é o espírito e o poema é a matéria carnal...
– Do livro A POESIA SEM SEGREDOS, 2012.
http://www.recantodasletras.com.br/ensaios/3633720
Joaquim Moncks
Enviado por Joaquim Moncks em 26/04/2012
Reeditado em 26/04/2012
Código do texto: T3633720