Por mais que eu procure me conhecer

Por mais que eu procure me encontrar, me conhecer ou me revelar, buscando descobrir aquele que realmente sou ou aquilo que realmente me move, sinto-me arredio de mim mesmo, sinto-me perdido nos labirintos dos muitos que sou, sinto-me embaraçado nas vielas dos mitos e crenças que me suportam, sinto-me atolado na areia movediça de meu inconsciente, sinto-me traído pela convicção de que sou consciente, quando no fundo borbulha em mim latentes processos desconhecidos de minha capacidade de gerenciamento mental ou de prospecção consciente.
 
Invejo a ingenuidade daqueles que se acham totalmente conscientes de seu viver, Invejo a simplicidade dos que se veem cônscios de si mesmos, na simplicidade daqueles de bom coração que se imaginam donos cientes do gerenciamento de si próprios. Não consigo a pureza da alma dos que se acham conhecedores profundos de suas vontades e de suas decisões, não possuo a virtude ingênua dos que não sabendo como funciona realmente os porões de sua existência mental e de suas realizações pessoais se julgam capazes de conhecê-las por completo.
 
Infelizmente o muito pouco que me conheço, mal cria ranhura superficial na profundeza do que sou e do como opero mentalmente. Sou múltiplo, sou mutável, sou complexo, sou transparente a mim mesmo, sou parte genética, sou parte fenótipo, sou parte o que eu creio que queira ser, posto que talvez no fundo até a parte que eu queira ser me é dada por outorga pelos muitos que me compõem. Sou a vida que levo, sou a alimentação que ingiro, sou a medicação, as drogas e o álcool que consumo, sou os sustos que levo, o medo que sinto, o amor que me cerca, o abandono que possa ter experimentado, sou o que aprendi, o que experimentei, o que sofri e o que fui de feliz.
 
O que me choca é a arrogância de alguns que se acham senhores absolutos de si próprios e capazes de legislar sobre a capacidade mental, pessoal, intelectual, emocional e sentimental da realização do seu ser como se único fosse. Melhor para eles, pior para mim que não me encontrando me sinto obrigado a fazer a minha mínima consciência mais ativa, participativa e mediadora na “educação” de minha humanidade. 

Arlindo Tavares
Enviado por Arlindo Tavares em 13/04/2012
Código do texto: T3611279
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