A árvore de natal do diabo

Há poucos dias o “Fantástico” exibiu uma série de denúncias onde, o repórter Eduardo Faustini se infiltrou disfarçado de gestor hospitalar, e desnudou a máfia das licitações que atua no Rio.

Com câmera escondida foi fartamente documentado como agem os “licitantes”. Não sei por que, a coisa sequer me causou estranheza.

A Licitação teria como meta, “... princípios constitucionais como a legalidade, a isonomia, a impessoalidade, a moralidade, a publicidade e a eficiência, com o intuito de proporcionar à Administração a aquisição, a venda ou uma prestação de serviço de forma vantajosa, ou seja, menos onerosa e com melhor qualidade possível. É a chamada "eficiência contratória" (Kikipédia)

Lícito, pois, significa em primeira análise, de acordo com a lei, não, necessariamente, com a honestidade. Embora, moralidade conste na definição supra, soa difusa, intangível.

O pressuposto desses fatos é que, como os contratos são públicos, todos pagam, tendo, por isso, direito de saber pelo quê estão pagando e quanto.

Os gestores de estatais e autarquias, não raro, são frutos de indicações políticas, de eleitos que receberam polpudas “doações” de empresários interessados em “prestar serviços” ao estado , daí, que origem desse hábito é antes política que administrativa.

A lei de per si, se revela inócua para tolher a desonestidade. Pode-se contratar “legalmente” um bem ou serviço ao preço de um milhão de reais, quando seu valor de mercado seria de trezentos mil. Afinal, na prática, o único princípio vigente é que, vence a menor proposta, a despeito de outros valores quaisquer.

Quase nunca há uma câmera escondida, ou fiscalização competente, e, como a busca é pela “licitação” e não pela honestidade, ou seja, mero jogo pra torcida, a coisa corre frouxa.

Por qual outra razão uma das maiores economias do planeta exibiria esse padrão quintomundista de vida, senão, pela corrupção que grassa “como nunca na história desse país?” ( em bom lulês)

Safadeza ainda que “legal” permanece sendo safadeza. Começo, como Platão, a duvidar da possibilidade de saúde moral na democracia. Afinal, não carecemos ser gênios para entender que há essa simbiose entre corruptos e corruptores, uma maravilha “natural” ou uma protocooperação, como o anu e o búfalo.

O povo não deveria escolher seus governantes já que o “critério” é o da melhor lábia, qualidade deveras útil, para evadir-se a compromissos, bem como, aos clamores da justiça.

O pior é que no lastro dessa escolha, delega-se poder a esses, para descerem ao quarto, quiçá, quinto escalões da administração, onde colocam “gestores” cujo preparo “técnico” é especialidade em organizar carreatas e “bandeiraços”.

Deveríamos instituir a meritocracia, um concurso público nacional; todos os postulantes passariam, para se inscrever, por um “bafômetro” moral, de modo a, (como a mulher de César) além de serem honestos, também parecerem honestos.

Não delegaríamos para gerir bens de terceiros, quem não cuida bem das próprias inclinações ao erro. “ Tu julgarás a ti mesmo – respondeu o rei. – É o mais difícil. É bem mais difícil julgar a si mesmo que julgar os outros. Se consegues fazer um bom julgamento de ti, és um verdadeiro sábio.” Saint-Exupery

Claro que isso vetaria a inscrição da maioria dos postulantes. O Estado gastaria com tal concurso 10% do que se gasta com uma campanha política, sem dever favores a ninguém, vetando, assim, os conchavos.

Mas, teríamos juízes honestos em número suficiente para garantir a lisura dos resultados do mega-concurso que escolheria nossos governantes?

Nessa sociedade hipócrita que cultua desvalores, como, irreverência, promiscuidade, safadeza, aplaudindo o “jeitinho brasileiro” teria que haver uma colossal guinada na contramão.

Outro dia, se veiculou um “comercial” do energético Red Bull, onde Jesus bebia e andava sobre as águas; questionado por um apóstolo, como fazia aquilo, ao invés de atribuir ao produto que “te dá aaaasas” Ele aconselhou que bastaria pisar onde tinha pedras.

Claro ficou, pois, que o objetivo não era anunciar ao produto, mas, blasfemar do Santo. A coisa foi tirada do ar, graças a alguns protestos, mas, a maioria achou engraçadinho, pois, combina com o espírito fraudulento desse mundo. Certo é que, há muito safado usurpando ao Senhor, o que não O transforma em fraude. Já não consumia aquela porcaria de produto, agora menos.

Claro que há um preço a pagar, virtude se aprende, como disse Demócrito. “É preciso que eu suporte duas ou três larvas se quiser conhecer as borboletas...” Saint-Exupery

No caso daqueles, as borboletas das altas somas nascem, sem serem gestadas no casulo do trabalho.

Do jeito que a banda toca, com os exemplos que vivenciamos atualmente, oriundos dos ambientes políticos, é mais fácil um vampiro doar sangue, que, extrair honestidade de lá onde grassa o vício.

Quanto aos “licitantes” do princípio, porém, deveria se lhes aplicar como juízo, comprarem suas coisas particulares com a mesma relação custo-benefício que “pagam” os contratos públicos.

Em menos de uma década estariam falidos, quiçá, morreriam por inanição, higienizando assim, o tão poluído meio.

Sei que estou viajando na maionese, pois, esperar uma reforma política, ademais, em tais termos, é utópico como um congresso de raposas ter como prioridade de pauta, legislar para proteger às galinhas.

Não defendo uma revolução, até porque, para isso, seria necessária uma geração de homens com H, e a nossa, está tão domesticada pelo carnaval, futebol, BBB, e as drogas literais, que as aranhas poderiam apanhar as moscas prescindindo da teia, como cantou alguém: “nossa indignação é uma mosca sem asas; não ultrapassa as janelas de nossas casas...”

Como os aracnídeos, nossos bravos “representantes” passam todas as noites de nossa omissão, urdindo, e quando clareia o dia, as presas, estão no papo.

Concomitantemente, nossos pujantes meios de comunicação laboram na produção de psico-entorpecentes, os quais, consumidos em doses regulares, atrofiam nossas frágeis asas.

Afinal, depois de uma denúncia como essa, que enche nossas “barrigas” de zelo e indignação, os mesmos veículos voltam ao normal, a exibir seus heróis de plástico, tão úteis à glamorização do vício.

O Quintana disse que com aranhas pingentes se enfeita a árvore de natal do diabo; possivelmente, Brasília tenha a maior árvore do mundo, e a do Rio, como vimos, não faz feio...ho ho ho

Leonel Santos
Enviado por Leonel Santos em 03/04/2012
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