BLOQUEIOS À COMUNICAÇÃO

Recebo a visita de Maria, preciosa leitora-escriba de Blumenau/SC, que apresenta um texto que se presta ao estudo. Vamos à leitura analítica:

“CHAMUSCAS DE RANÇO

Na manhã de minha escuridão o sol voltou a brilhar. Taciturno, musgueado e encrespado de nuvens e ranços de névoas sem fim. Fumaceando flocos algodoados de lágrimas, que brotam lentos e tristes da terra chamusqueada de reflexos de ausências. No pouco que se pode ver, aparentes fontes emparedadas, descem cândidas e cegas à tantos chumaços de mágoas e feridas plantadas por mãos, insensíveis e cardeadas de espinhos e pétulas azedadas por conclusões precipitadas. Copas ponteagudas e frisadas, apontam que só a graça vinda dos céus permitiu o perdão da culpa pelo fogo que a tudo quase exterminou. E no alto dos telhados dourados de barro, as chaminés anunciam que apesar dos pensamentos nebulados a flor dourada tremula ternuras pelas tramas, de vida, esverdeadas de amor...

Enviado por Maria em 13/03/2012.

Código do texto: T3551695.”

http://www.recantodasletras.com.br/prosapoetica/3551695

Eis um exemplar da modalidade prosa poética, bem construído quanto à apresentação, que chama a atenção pela utilização de um punhado de metáforas e outras figuras. No mérito, o que falta é a visão do outro pólo da relação literária: o leitor. Transparece que não há preocupação com o receptor, devido ao intimismo hermético da autora. Quanto à forma (que é sempre o “xis” faltante, na maioria dos textos) merece todas as loas. Entretanto, do início ao fim o texto é de possessão (indivisível) da criadora, e retrata o seu estado de espírito (ou o seu alter ego), imbricado por demais para que se estabeleça interlocução com o receptor. O palavreado bonito e cursivo parece não se destinar ao leitor, e, sim, ao universo pessoal da autora e sua inventiva: falação de si para si, muito pouco entendível por terceiro... Essa ocorrência é pouco encontrável na espécie Prosa Poética. O subjetivismo exagerado (típico da possessividade sobre a obra) aparece muito frequentemente em Poesia – beirando ao enigma pela codificação – falseando o entendimento. Em alguns momentos, a peça atual possui uma plasticidade de fazer inveja aos iniciados, como se pode ver na frase final desse texto de estranho nome, tatuando expressões regionalistas (RS), nem todas dicionarizadas. O estilo resta indefinido e o conteúdo prejudicado pelos bloqueios... Com base neste trabalho, já é perceptível o nítido avanço no universo plástico e rítmico da extensa obra da autora, no Recanto...

– Do livro AVE FUGIDIA – palavra & diversidade, 2011/12.

http://www.recantodasletras.com.br/ensaios/3556938