DITADURA, DEMOCRACIA E LIBERDADE

Ditadura, Democracia e Liberdade

Ditaduras são regimes de exceção. Governos ditatoriais utilizam o Terror como arma política. Ditaduras têm, em geral, a finalidade de conservar a ordem vigente ou de restabelecer a ordem. Mas nem sempre é assim. Nas Ditaduras Revolucionárias, classes progressistas, as massas, os trabalhadores, o povo agem em nome do futuro e dos interesses da maioria. Exemplos disso foram o Governo Jacobino durante a Revolução Francesa e a Revolução Russa em sua fase heróica - da tomada do poder à vitória na guerra civil. Nesses casos, o Terror era um instrumento do povo contra os inimigos da revolução e de suas conquistas. Durante o Governo Jacobino vigorou o sufrágio universal, isto é, a expressão máxima da democracia moderna. Durante os primeiros anos da Revolução Russa gvoernaram os Sovietes - Conselhos de Operários, Camponeses e Soldados - a expressão máxima da democracia direta em nosso tempo, a democracia direta dos trabalhadores. Desse modo, podemos encontrar exemplos na História em que podemos colocar Ditadura versus Democracia e outros em que a Ditadura é uma expressão da Democracia, como no caso das Revoluções.

No entanto, é sempre importante ressaltar que a maioria absoluta das ditaduras foram regimes cesaristas, bonapartistas ou fascistas e, portanto, governos marcados pela repressão sistemática e pela diminuição das liberdades para a maioria. Parece ser exatamente este o ponto. O que define uma democracia é se um governo representa ou não os interesses da maioria. Nas atuais democracias representativas isso não ocorre, sendo, portanto, muito mais governos constitucionais, liberais e eletivos do que propriamente democráticos. Infinitamente mais democráticos, por exemplo, são os governos nem sempre constitucionais, fruto do improviso histórico que são as revoluções.

Numa democracia autêntica prevalece a vontade da maioria. O que cabe perguntar é: isso basta? Nesse sentido, o que pode ser justificável de um ponto de vista histórico numa guerra revolucionária não pode jamais ser a regra em tempos de paz. Não só ditaduras devem ser rechaçadas, mas o próprio valor da democracia deve ser relativizado. Hoje é comum dizer que a democracia tem valor por si só, que a democracia tem um valor universal e que as sociedades democráticas são sociedades livres. Afirmativas no mínimo ingênuas. Se a Ditadura é a Tirania de uma Minoria sobre a maioria, a Democracia é a Tirania da Maioria. Os Governos Monárquico, Aristocrático, Oligárquico, Tirânico, Ditatorial de Um ou de Poucos são contrapostos à Democracia que seria, na visão atual, o regime mais perfeito ou menos falho. Existe, entretanto, um fato histórico que põe em xeque esta visão: o Julgamento de Sócrates. A Democracia Ateniense, por mais que convivesse com a escravidão e com um número restrito de cidadãos, incorporou realmente os homens livres e pobres nos negócios do Estado. O Governo era a Assembléia Popular. A cidadania e o exercício da cidadania representavam o que havia de mais admirável na pólis ateniense. E, mesmo assim, Sócrates, um bom cidadão, que serviu o exército e participou da gestão do Estado quando teve de fazê-lo (os membros do Conselho da Cidade eram sorteados), e que exercia a sua liberdade democrática ao defender os seus pontos de vista em praça pública e ensinar a outros, sem cobrar dinheiro, os seus conhecimentos, foi executado, não por um governo ditatorial, mas por um governo realmente democrático. Isto é uma reflexão importante hoje: só a democracia não basta. Mesmo que vivêssemos numa verdadeira democracia (o que não é o caso de nenhum país de hoje; é só ver os protestos dos trabalhadores e jovens europeus que questionam os seus governos democraticamente eleitos por cumprirem o que é mandado pelo FMI, pela União Européia e pelo Mercado e não ouvirem o clamor popular; ou os governos do mundo, dos Estados Unidos ao Brasil, em que os políticos fazem milhões de promessas nas eleições e não são, na prática, obrigados a cumprir nada daquilo que prometeram), ainda assim, a liberdade não seria irrestrita e seria este governo ainda insuficiente para a realização da liberdade e da felicidade geral e do potencial humano em sua plenitude. A Democracia não basta; é preciso o Regime da Liberdade. As liberdades e os direitos das minorias e dos indivíduos devem ser garantidos, mesmo contra a vontade e a concordância da maioria. É o sagrado direito de divergir. A Ordem como tal precisa deixar de existir. Sócrates, o mártir da filosofia, também foi vítima da Democracia e, com isso, também o seu algoz, pois não é possível uma postura ingênua diante de um regime que mata quem diverge dele, sendo a base desse regime o direito de divergir, mas direito esse enquadrado pelo entendimento, interpretação e vontade da maioria e de seus representantes, pela moral, os costumes e a ordem constituída.

Nos dias de hoje é preciso ir ainda mais fundo nesse debate, pois existem Democracias de Fachada como a Brasileira. Ditaduras disfarçadas, com uma máscara democrática, são a regra. Regimes bonapartistas e fascistas declaram o seu amor ao Estado Democrático de Direito e se perpetuam por meio do voto direto da população de dois em dois anos. Mas isso basta para chamar esses governos de democráticos? Democracia não é só voto. É a garantia de direitos e liberdades fundamentais, num governo constitucional ou não, e o respeito à soberania popular. Onde existe isso hoje no mundo? Se nem a Democracia é o bastante, se as Democracias de hoje são Ditaduras Disfarçadas e as Ditaduras são regra geral regimes contrários aos interesses do povo, lutar por Democracia Real ainda é pouco; lutar pela Ditadura da Maioria é pouco. O único governo que pode ser tolerado é o das pessoas sobre as coisas e não das pessoas sobre as pessoas como se essas fossem coisas. O Comunismo pensado era essencialmente isso. Uma Anarquia Igualitária, uma Sociedade Livre formada por Homens e Mulheres Livres. As Revoluções são a Licença Poética deste Soneto. Somente elas têm o direito histórico de ser mais livres do que a própria Liberdade. A TODO O RESTO, A ÚNICA REGRA APLICÁVEL, É A BUSCA DE UM GOVERNO DA LIBERDADE. Nenhum outro merece obediência ou respeito. Nenhum outro governo merece o nosso apoio ou lealdade. Nenhum outro governo merece governar. Tudo que não é verdadeiramente livre deve perecer.