Memórias Póstumas de um Escritor Vivo
Memórias póstumas de um escritor vivo.
Por t.H.R.Oliveira
Estar parado aqui é aprova do que o que eu mais temia aconteceu
Lá (aponta para um corpo velho e morto) está o fato que sempre me recusei em aceitar
Nunca acreditei que isso fosse acontecer comigo
E agora é difícil olhar pra trás
Reconhecer os erros que cometi
É difícil ver que mesmo para mim o tempo passou.
Quando se é jovem, parece que você indestrutível
E que não há nada no mundo que você não possa fazer
Que não há nada que você não possa ter
Eu era belo, jovem, inteligente
Eu achava que todo o que eu fazia era certo
E que era necessário, por isso nunca senti culpa
Deixei de lado tudo o que eu acreditava não ser importante
Me acorrentei no meu mundo de fantasia
Mundo esse que agora está aos pedaços
Malditas palavras, malditas correntes
Malditos momentos de solidão
Que eu tanto saboreei no auge da minha criatividade
E assim eu deixei passar todo o resto
A vida que eu perdi
Os amigos
Os amores...
Digo, O AMOR que eu perdi
A única pessoa em toda a minha vida que realmente teve o meu amor
A pessoa que povoou minhas estórias
Que era meu protagonista no mundo em que criei
A pessoa perfeita
Tanto tempo eu sonhei em adormecer naqueles braços
Mas foram só sonhos
E depois, tinta e papel
A minha vida não passou de palavras e ilusões
Um grande sonho no qual o tempo não existia
Mas os passos do tempo foram lentos, assim eu pensei
Quando dei por mim eu estava lá (aponta novamente para o corpo)
Velho, feio, sozinho, morto.
Não vai demorar muito e eu serei apenas uma lembrança
E sem muito esforço essa lembrança vai desaparecer
O que eu fiz?
As minhas palavras já se perderam com o vento
Ninguém as lê
Quem eu fui?
Quem eu fui?
Mesmo agora a dor é algo que permanece
E por incrível que pareça, dói ainda mais
Eu desejei desaparecer
Por um tempo, o mundo real simplesmente não parecia o meu lugar
Por isso eu fiz o meu mundo
Por isso eu deixei tudo para trás
Não aguentava mais sofrer
Mas o mesmo sofrimento do qual eu tentei fugir me acompanhou
E agora, ao meu lado, ele é o demônio que não me deixa esquecer
Que a minha vida não passou de um vazio
Talvez eu mereça o que me aconteceu
Morrer sem que ninguém notasse a minha ausência
Eu sempre fui ausente
E isso sempre foi conveniente
Mas não há mais espaço em mim para suportar a agonia
Eu simplesmente não consigo olhar o passado
E me dar conta que mesmo agora
Como o meu corpo morto atrás de mim
Eu ainda sou obrigado a andar pra frente
O tempo me diz, ele não para
E com os seus passos lentos e cruéis eu tenho que ir
O que está além, eu não sei. Não me pergunte
Eu nem ao menos queria saber
Eu só queria voltar
Reviver os meus tempo de juventude
Rever os meus amigos
Ter a chance de amar a pessoa que ainda possui o meu coração
Ficar com ela e nunca deixá-la
Queimar tudo o que escrevi
Destruir o meu castelo de sonhos
E viver
Pelo menos uma vez, viver e não me arrepender
Mas o tempo e a dor não me deixam
Me prendem aqui, com as mesmas correntes que eu me acorrentei na fantasia
E me obrigam a andar
Me fazendo ver o que passou ficando para trás
Fazendo-me perceber que eu não existo
Que não sou importante
E que meu tempo passou
O que me resta perguntar no final de tudo
E o que mais dói só de pensar é:
Quem me amou afinal de contas?