Painéis da Existência
Painéis da Existência
Fernanda Leite Bião
http://luzdointerior.wordpress.com/
"Não julgueis que vim trazer a paz à terra. Vim trazer não a paz, mas a espada. Eu vim trazer a divisão entre o filho e o pai, entre a filha e a mãe, entre a nora e a sogra, e os inimigos do homem serão as pessoas de sua própria casa."[1]
— O Evangelho segundo Mateus (10.34-36)
Há cerca de dois milênios, Jesus sabiamente afirmou que não veio trazer a paz, mas, sim, a espada.
O Mestre lançou a possibilidade de conflitarmos com as situações determinantes do contexto social da época (em muitos aspectos, patologias ainda presentes e vigorosas na sociedade atual), convidando-nos ao árduo desafio de forjar a “decisão firme”[2] de encarar “a sombra coletiva e, ao mesmo tempo romper a interior”[3], à medida que nos depararmos com as resistências íntimas e sociais à assimilação da conduta amorosa, condicionamentos ditados pela “supremacia do orgulho e da hediondez”[4].
Os ensinamentos de Jesus nos persuadem — nas palavras de Joanna de Ângelis — a enfrentar a paz sombria “feita de ócio e cansaço”[5], munidos da “espada flamejante da autoconsciência”[6], a descortinar a verdadeira paz, “dinâmica e gloriosa”[7], separando “a mentira da verdade, a usurpação ignóbil da conquista honrada”[8].
Divisões de classes, mitos fundamentados no poder, o sentimento ainda tão embrionário que faltava água e sol para as sementes se remexerem embaixo da terra ou o coração balançar verdadeiramente pela presença do outro. Muitas lágrimas, muitas dores, mas também um novo movimento surgiu no horizonte.
O conflito estava instaurado, no bojo de “uma revolução espiritual como a Terra jamais experimentara outra semelhante”[9].
Quem é aquele outro que compartilha a existência ao meu lado? Será que a cor da sua pele, o lugar onde nasceu e seus costumes podem verdadeiramente me contar quem são? Ou são vestimentas para dar sentindo a uma existência que precisa existir?
Tantos empecilhos para se aproximar do outro. Tanto medo de sair do lugar confortável, inaugurado pelas vivências e reforçado pelo ego, que também é uma roupagem volátil.
Assim, constroem-se as histórias, permeadas por repetições e cheias de dificuldade de visualizar o novo.
Somos seres que desejamos ser. Ser e existir são verbos. Verbos são ações. Ações são projetos. Projetos são a própria vida.
O que acha de fazer uma pequena visita ao seu redor? Olhe a sua volta. Busque experimentar o que a vida tem a lhe oferecer. Presos em nossa própria prisão, a claridade, a luz que também é conhecimento, restringe-se ao conhecido e dificulta a visão do presente.
Não permita que a sua certeza se torne escuridão e seus olhos não possam ver, seus ouvidos não possam ouvir e seu coração não possa sentir. Sinta a sua presença. Ela é permeada da presença do outro.
A história da humanidade vem carregada de uma carga de desamor, de descuido, de omissão. Sujeitos não são objetos hoje, são objetos desde sempre. E, possivelmente, a espada que o Mestre nos trouxe veio cortar os nossos vícios e a nossa capa de ignorância, fazendo que os movimentos em nós fossem causadores de modificações em nossos sentidos e, quem sabe, responsáveis pela instauração de novos comportamentos, mais saudáveis para mim e para o outro.
Desafios são muitos.
Já pensou em começar? No começo de toda empreitada, a insegurança se faz companheira, mas o desconhecido se torna conhecido, à medida que me permito abertura para perceber, compreender e sentir.
Faça um acordo com você mesmo: tente! O campo de possibilidades são inúmeros, mas é preciso perceber e discernir.
[1] BÍBLIA SAGRADA: edição pastoral-catequética. 168. ed. São Paulo: Ave Maria, 2005, p. 1.296.
[2] FRANCO, Divaldo. Jesus e o Evangelho — à luz da Psicologia Profunda: pelo espírito Joanna de Ângelis. 2. ed. Salvador: LEAL, 2005, p. 190.
[3] Ibid., p. 190.
[4] Ibid., loc. cit.
[5] Ibid., p. 194.
[6] Ibid., loc. cit.
[7] Ibid., loc. cit.
[8] Ibid., p. 191.
[9] Ibid., p. 191.