MACRO ASILO
MACRO ASILO.
Uma vocação incoercível de Imaruí.
1ª Parte
Identificando os problemas e as causas.
Imaruí é um município que está situado ao sul do Estado de Santa Catarina, na verdade, um território abandonado pela inexistência dos vestígios de progresso.
Pois a auto-estrada a BR 101, um corredor natural de riquezas passa ao longo. Dessa forma, não produzindo os efeitos progressistas desejados ao município.
A sede bem como os bairros ou localidades, (nem todos) são banhados pela lagoa que tem o mesmo nome do município.
Essa mesma lagoa era outrora piscosa e esta característica dava condições satisfatórias de sobrevivência à população, pois a abundância e a diversidade do pescado eram visíveis.
Dando aos ribeirinhos uma vida modesta, mas com certa tranqüilidade e dignidade.
Este município tendo em vista a sua localização geográfica desfavorável com relação ao seu relevo e, somando-se a isso, o descaso do poder público eminentemente inócuo, não apresenta condições econômicas para a sua autodeterminação cidadã.
Tendo em vista a sua situação desfavorável, a autoridade executiva tem de recorrer aos cofres de Brasília ou de Florianópolis em busca de recursos para a manutenção desta Comarca, em suma, é um município empobrecido e pedinte.
Imaruí não tem vocação para a indústria e o comércio, e nem tão pouco para a agropecuária.
Com relação à pecuária fica impossível um manejo dessa atividade em virtude da má formação do seu relevo.
Com as características irregulares na sua formação geológica, fica prejudicada a exploração e o remanejamento econômico de pastagem, dificultando dessa forma a exploração no ramo pecuário.
O comércio é inexpressivo e de pequeno movimento, pois não há reciprocidade mercantil em função da renda baixa, e aquela existente é totalmente aleatória, dependendo exclusivamente da pesca.
Com relação à indústria, a bem da verdade existem alguns empresários, verdadeiros heróis que lutam pela sobrevivência da sua empresa, tendo em vista a onerosa carga tributária e a inexistência de mão de obra especializada.
A atividade da pesca artesanal ou profissional está praticamente em extinção, pois a espécie marinha já demonstra exaustão.
A carência do pescado que já é bastante evidente, tem por causa única a ganância exercida pela pesca predatória, bem como pelo desprezo do poder público que não tem uma política voltada à sobrevivência e a manutenção do potencial econômico na atividade pesqueira.
O relevo do município de Imaruí é quase na sua totalidade irregular. São formações geológicas do contraforte da serra do mar.
É arenoso e estéril, condições essas que foram provocadas pelo próprio ser humano.
Pois antigamente a sua capa verdejante era abundante, e existiam várias espécies de madeiras de lei.
A flora nativa era constituída quase na sua totalidade das seguintes espécies: Cedro, Canela e suas variações, Peroba, Sobraji, Louro, Ipê em todas as suas variações da espécie, e outras madeiras menos nobres, mas abundantes.
Tudo isso foi devastado pelo ato impensado do desmatamento desorganizado, para dar lugar às pastagens de morro ruins, bem como às rocinhas de mandioca economicamente inexpressivas, uma cultura tipicamente indígena.
Existe, é verdade, alguma região aproveitável e agricultável, principalmente com a orizicultura, entretanto, não é em uma escala expressiva economicamente, pois a cultura existente do cereal é uma atividade de sobrevivência.
Pela sua característica familiar e por ser de sobrevivência não traz recursos (impostos) para o município.
O arroz in natura é vendido para os engenhos de beneficiamento que estão fora do município, desta forma, cria uma fuga de recursos em impostos, pois o produto é comercializado à margem do código tributário. Uma evidente atividade sonegadora.
No município não há uma atividade dirigida para o beneficiamento do arroz, em virtude de não ser rentável e a produção obtida é de pequena escala.
A pecuária em sua pequena expressão econômica é o de gado de corda, gado esse destinado geralmente para mover os engenhos de farinha de mandioca, puxar o arado rudimentar ou como tração para os carros de boi. Um transporte muito primitivo.
Com a eletrificação rural esses métodos já estão sendo substituídos por motores elétricos, mas ainda não abandonaram o boi para a maioria dos serviços.
Com relação aos bois, esses não se prestam para a alimentação, pois se trata de animais criados em cordas pelos morros existentes; existe é verdade, nas regiões mais ou menos planas, um gado mais aproveitável, entretanto, sem uma pureza genética.
E as carnes desses animais (os de corda ou de morro) não têm as características saudáveis, pois em função do clima, do relevo e da falta de cuidados, estes animais são infectados com os bichos parasitas, tais como, o berne e o carrapato muito abundante nessa região e outras doenças em função da alimentação pobre.
As carnes são de uma rigidez muscular muito grande, pois os animais são submetidos ao trabalho nos engenhos e nos arados. Alem disso, temos de considerar o seu habitat natural constituído de regiões íngremes e pastagens pobres.
O gado para o corte propriamente dito, não é existente pelas razões que acima expusemos.
A cultura da mandioca (Manihot utilíssima) é disseminada de um modo geral, principalmente pela orla litorânea e adjacências.
A cultura desse tubérculo é primitiva, desordenada e de caráter familiar hereditário. Um verdadeiro resquício de costume aborígine.
Não existe uma intenção em agregar e ou racionalizar essa atividade secular, por isso, ela é exclusivista e familiar, transformando-se numa verdadeira ilusão.
Um hábito por demais arraigado na população caiçara, ficando assim evidente que praticam essa atividade de antanho como uma homenagem aos antepassados.
Nota-se esse comportamento produtivo de mandioca em quase todo o município. Fica evidente tratar-se de um costume indígena, onde cada clã tem a sua rocinha de sobrevivência.
As demais culturas existentes são insignificantes, pela qualidade, quantidade e pelo modo com que são executadas.
Sem uma assistência técnica dirigida eles continuam a cultivar do mesmo modo que os seus ancestrais, achando que esse é o método correto.
A pesca é uma atividade eminentemente e literalmente extrativista por sua própria condição, desta forma, não há uma preocupação com a preservação e manutenção das espécies.
Por conseguinte, não existe uma conscientização dirigida ao meio ambiente, na verdade, falta educação nesse sentido.
É uma atividade gananciosa sem controle, sem educação ambiental, por isso essa é a atividade que mais degrada a lagoa que já apresenta sinais visíveis de exaustão.
A poluição sistemática que é causada por vários fatores adversos, tem contribuído seriamente para a extinção do pescado.
Desta forma, assim apressam a extinção pura e simples das espécies marinhas, bem como da própria lagoa que já tem o seu espaço físico reduzido por enes fatores.
Não há um controle ou uma fiscalização por parte do poder competente para essa atividade, nem ao menos uma política primária dirigida com o foco para uma orientação à pesca, para que seja exercida de forma mais racional e conseqüentemente mais lucrativa.
O pescador arca com todo o investimento na arte da pesca, bem como com o seu trabalho cotidiano e com a manutenção da arte de pesca.
Com isto, evidentemente, há certa renda em contrapartida pelo seu trabalho, mas em se tratando de um processo quase primitivo como não poderia ser de outra forma, é naturalmente aleatório.
Na verdade, quem mais ganha com o seu trabalho é o atravessador. Que o próprio nome identifica como um explorador que lhes compra o pescado na porta da casa e paga no final de semana.
Desta forma, ensejando ao dito atravessador um lucro exorbitante de três ou quatro vezes maior que o inicial, todavia sem ao menos ter investido um Real sequer na atividade especulativa.
É esse mesmo atravessador quem arbitra o preço, às vezes de forma injusta, pois o mesmo não obedece às leis do mercado (oferta e procura), mas sim a sua ganância por maiores lucros.
Falta aqui a presença ou a mão do poder público para racionalizar a comercialização, fazendo-se presente e dando apoio às iniciativas para se constituir cooperativas.
Esses organismos uma vez constituídos por pescadores, ordenariam uma pesca mais sensata e, como conseqüência, aufeririam maiores lucros em benefício dos próprios cooperativados, afastando de uma vez o atravessador especulativo do sistema.
Além de ser uma forma organizacional perfeitamente constituída pela classe, o município em contrapartida arrecadaria mais imposto com a comercialização efetuada por essa instituição.
Se assim fosse, o poder público poderia prestar melhores serviços à população, tirando o atravessador do sistema que somente sonega e nada arrecada para os cofres empobrecidos do município.
Infelizmente não existe essa preocupação pública e cidadã, porque o poder público sofre de dormência intelectual e falta de vontade política.
Como podemos observar, o poder público é simplesmente: ineficaz, inepto, feudal. Interessando-se apenas pelo poder e para o poder.
Existe apenas o interesse em dar emprego em troca de votos e locupletar-se com o salário avantajado do poder executivo que, por certo, é acrescido dos expedientes da maldita corrupção.
Para se exercer o pecado público da corrupção não se exige sagacidade intelectual. Parece que ela é endêmica em todos os poderes ou no próprio homem e se espalha pela Nação inteira.
Não sei por que qualquer analfabeto que se elege, é logo tido como um corrupto contumaz?
Administrar a coisa pública é uma atividade somente dos homens de bem e pelo visto estamos carentes dessa espécie rara.
Aqui neste município impera uma política retrógrada e sem uma filosofia definida, entretanto, nota-se uma ausência de idealismo político que deveria ser direcionado em benefício do povo, contudo, persiste uma disputa acirrada e truculenta pelo poder.
Por certo, deverá existir uma compensação muito lucrativa no desempenho da arte política.
Os políticos exercem para si mesmos a famosa lei de Gerson, que é o de levar vantagem em tudo, mesmo que seja em detrimento e prejuízo do povo e, quanto a esse mesmo povo, o negócio é mantê-lo à distância, carente, pedinte e sem uma cidadania digna.
Tem político que afirma com o leviano descaramento dizer que, o povo quer somente foguete, dança e porrete.
2ª Parte
Identificando o fenômeno e sugerindo ações.
Diante das dificuldades aqui expostas, e ao ver com maior profundidade o perfil sociológico dessa comunidade desprotegida pelos fatores naturais e pelo poder público modernamente feudal, verifica-se um fenômeno que já vem ocorrendo faz um século e não é observável.
O fenômeno a que me refiro diz respeito à migração que se processou e continua a se processar de forma paulatina e contínua, provocando um efeito sui generis, como tentaremos explicar ao longo desta exposição.
Os jovens e até famílias inteiras, diante da inexistência de meios de sobrevivência para si e para a sua prole, migram obrigatoriamente para outros centros mais promissores.
Essa mobilidade humana vai à busca de sua sobrevivência e de sua cidadania, coisa essa que apenas soa bonito e doce nas bocas dos políticos néscios e alienados.
Normalmente os que migram deixam aqui um terreninho ou uma casa, algo como um cordão umbilical, uma ligação com a sua origem ou, talvez, uma estratégia para o fato de não dar certo a investida em outras plagas, desta forma, teriam como recuar sem grandes preocupações.
Isso feito, eles se estabelecem em outros lugares onde possivelmente haja trabalho como, por exemplo, Porto Alegre-RS, São Paulo-SP, Joinville-SC, Criciúma-SC, Tubarão-SC e Florianópolis-SC, nestes lugares eles trabalham, estudam e vivem.
A maioria lá onde se estabeleceu forma-se, trabalha, constitui família e cresce. De certa forma evoluem, e após alguns anos os mais idosos, geralmente se aposentam e num processo inverso voltam para a terra natal.
É uma volta às origens em função de um saudosismo ou em busca de uma calmaria com relação à segurança, pois agora, já com uma renda mensal fixa (aposentadoria) que lhes assegura uma sobrevivência modesta e honesta, desfruta cada um, a seu modo, de certo laser.
E assim conclui-se o fenômeno do ciclo da migração com a famosa volta da população a sua origem, agora já bastante envelhecida.
Acomodam-se sem grandes preocupações num faz niente, pois já haviam planejado esse retorno quando aqui deixaram um terreninho ou uma casa.
Com esse processo de migração e o conseqüente retorno, gera um fenômeno, é o fenômeno do aumento da densidade populacional senil.
Imaruí em função das suas próprias carências naturais e ou provocadas, transformou-se e continua a se configurar a olhos vistos como um “macro asilo”.
Não há necessidade em ser um sociólogo para verificar a existência desse fenômeno.
Tentaremos abaixo identificar alguns aspectos ou ocorrências que nos indicam a existência desse evento.
a) É visível a população envelhecida, embora não exista uma estatística confiável nesse sentido, entretanto, é notório o crescimento da massa habitacional em estado de senescência.
b) A freqüência de óbitos nessa faixa etária é um fato observável, essa ocorrência de morte é sinal aparente de envelhecimento, pois essa mesma massa senil é mais suscetível a doenças levando-a ligeiramente ao estado terminal.
c) O único segmento do comércio que prospera nesta cidade é o de farmácia, pois a população senilizada é um prato cheio para as farmácias, principalmente com o uso abusivo e corriqueiro da prática da empurroterapia. Esta é a modalidade de indicar o medicamento sem uma consulta prévia com o médico, o idoso é um alvo fácil de ser atingido.
d) Outro aspecto a ser observado e constatado é o da proliferação de religiões de tendências várias, pois somente na sede onde residem mais ou menos três milhares de pessoas, existem sete ou oito tendências religiosas, fora as que estão interiorizadas.
É um fenômeno que está ocorrendo e as religiões são mais espertas do que o poder público, elas, as religiões, se estabelecem para dar “apoio espiritual” ou terapia de apoio existencial para essas pessoas que, de forma irrecusável, caminham para o fim.
Aliás, essa é uma necessidade subjetiva do ser humano, que é o de preparar-se para o desconhecido e o imponderável.
Isso deveria ser o enfoque real das religiões, fazer com que o ser humano se depare com o sobrenatural e morra em paz com a sua fé inexplicável.
e) Outro aspecto observável é o aparato direcionado para a saúde pública, pois o hospital e o posto de saúde estão constantemente abarrotados, destarte, estarem mal equipados e sucateados.
Já está havendo uma preocupação por parte do governo federal e do estadual, que com uma política de saúde pública, está implementando projetos elogiáveis nesta área.
Aqui neste item, o poder público municipal teria uma presença pífia se não fosse à mão protetora do governo federal e estadual.
Este mesmo poder público municipal, ainda não se plugou no problema que cresce dia-a-dia, fazendo ouvidos moucos para um problema perfeitamente visível e demonstrável.
Pelo que acima foi exposto, eu quero demonstrar que, sem um estudo sociológico mais profundo, Imaruí tem uma vocação nata gerada pelas suas próprias carências, inclusive a cultural, de tornar-se um macro asilo natural.
Não querendo ser pessimista, mas apenas observador do fenômeno já existente, eu tenho que de antemão, considerar Imaruí um macro asilo já solidamente constituído.
Pois todas as condições, os sintomas e os aspectos aqui apresentados, são de fácil observação e constatação, características essas que nos levam a identificar a ocorrência desse fenômeno sociológico.
3ª Parte
Das responsabilidades do Poder Público.
O que deveria fazer o poder público municipal com relação a esse fenômeno?
a) – Prover o município com todas as instalações de infra-estruturas dirigidas à saúde pública, tais como:
Hospital devidamente equipado, assistido por um corpo clínico especializado e dedicado, bem como também por técnicos capacitados na área de saúde pública.
Postos de saúde deverão ser instalados nas localidades de maior concentração populacional, evitando assim que se desloquem para a sede com os custos inerentes. (refeições, passagens etc).
(b) - Contratar assistentes sociais, psicólogas (os) para introjetar uma nova visão de vida nessas pessoas e, acima de tudo, trabalhar a suas auto-estimas, pois a baixa-estima é uma endemia que já é notada em função do desprezo e do desengano que estão sendo submetidos.
Essa baixa estima, acreditamos que provem, principalmente, da incredulidade do povo com relação aos reais interesses dos políticos.
(c) - Instalar ou fundar centros comunitários para reuniões, encontros, palestras, jogos, bailes e apresentações folclóricas e etc.
(d) - Estimular os idosos não somente com o lazer, mas fazê-los se tornarem e se sentirem úteis, executando trabalhos de artes e outros ofícios de aptidões várias, e que venham também lhes render algo pecuniário e, acima de tudo, ensinar aos mais jovens o que aprenderam na vida, dessa forma, podendo transmitir conhecimentos.
Liberdade – Igualdade – Fraternidade.
Não discriminá-los em função da longevidade ou do nível social.
Ser idoso ainda é ser sábio.
Irmaná-los numa confraternização amigável, simpática, com propósitos bem definidos e encetados para o sentimento da benquerença.
Não impingi-los ou exigir confissões políticas ou religiosas, a liberdade deverá ser exercida com toda a sua amplitude racionalmente.
Assim, eles se sentirão cidadãos livres e aceitos pela sociedade; e esta sociedade senil deverá ser representada pelo poder público municipal que outrora não soube cumprir com o seu dever.
O poder emana do povo, para o povo, e em nome dele deverá ser exercido como preceitua a Carta Magna. (A Constituição Brasileira).
Eráclito Alírio.