O TEMPO
Quando me perguntaram o que eu achava que era o TEMPO, não tive tempo (e por acaso algum dia alguém o teve?) naquele instante (que é parte do tempo) para refletir e responder. E, como sempre acontece, depois de um tempo, (quanto?) vêm-me as idéias e passo a escrever.
Define-se oficialmente o tempo como: duração das coisas - sucessão de dias, meses etc. Mas isso não definiu o tempo, apenas limitou-se a limitar o espaço por onde ele passa impassível.
Sei e sinto que ele sempre existiu e, por causa dele, se pode contar a História.
Certeza tenho também que teve início, mas fim? Não creio.
O homem insiste em limitar o tempo na ilusória esperança de retê-lo e como sabe que, inexoravelmente, ele continuará passando e fugindo, cada vez mais dá valor às partículas infinitesimais do tempo para contar seus próprios feitos. Feitio de homem falível querendo fugir ao medo fulminante de não mais ser ou estar aqui. Por essa razão o tempo vai fugindo do homem...
Há coisas que passam devagar como se o tempo insistisse em fazê-las intensamente sentidas. A dor da saudade, o vazio da solidão, por exemplo. Há outras que gostaríamos de reter e que o tempo as deixasse esquecidas junto a nós: a juventude, os filhos pequenos e tantas coisas preciosas que vemos ir ficando no passado.
- O tempo não passa... Para os impacientes e ansiosos.
Os apressadinhos vivem a correr atrás do tempo, mas a distância é constante e nunca o alcançam.
- De tempos em tempos... Como se existissem vários tempos! Isso só existe para os que não podem ou não querem ter constância e, somente, eventualmente, resolvem agir. Pelo que se deduz aqui, há tempos e outros tempos!
- Dá um tempo...
Quem pede um tempo, está deixando a ele a responsabilidade de mudar as coisas mal resolvidas, não é mesmo? Pedir um tempo é querer fugir do agora... Se eu pudesse, pediria muito mais tempo.
Parece que não vou ter um espaço medido suficiente para tudo o que ainda quero fazer!
Viram o nome humano que dei ao Tempo? Espaço medido.
- Ainda se tem muito que falar do tempo...
Quando se diz: fechou o tempo! Das duas, uma: ou vai cair um temporal ou está acontecendo uma briga daquelas! Por qual razão? O que o tempo tem com isso? Tempo aberto é quando não chove e não tem nuvens no céu, mas não quer dizer que não há briga. Então, paz é tempo aberto? Então, alguém errou em alguma expressão.
Às vezes acontece de algum nenê nascer fora de tempo, mas isso é bobagem, pois ele nasceu precisamente na hora em que tinha que nascer. Hora, minuto e segundo, Deus o sabe...
Já ouviram dizer que devemos dar tempo ao tempo? Por que? Será que ele não tem ciência ou consciência de sua medida e extensão? Se ele é o próprio tempo, deve ter tempo de sobra!!! Como, então, podemos dar tempo ao tempo?!
E não adianta querer matar o tempo, como se fosse mortal ou passivo de morte, inventando passatempos que na verdade só fazem desperdiçar o tempo, pois ele, qual Fênix redivivo, estará mais vivo que nunca.
Nunca, é o tempo que não acontece. É mais um lugar do tempo. Mas brinquemos de passatempo, afinal eles nos ajudam a ignorar que ele está passando!
Por que ele tem esse nome - TEMPO - ?
TEM – é do verbo ter, sinal evidente que existe alguma coisa. PO – será que tem relação com o PÓ, aquilo em que todos nós, os seres vivos, nos tornaremos?
TEM PÓ, faz lembrar falta de consistência e, por dedução, transitoriedade, efemeridade. É preciso pensar nisso. Nossa passagem aqui não é consistente, é efêmera, transitória, coisa alguma fica de nós, a não ser as lembranças das virtudes (ou defeitos), feitos e fatos acontecidos.
Faz-me rir. O Tempo é Filosofia pura!
Vago e divago dentro dele, através dele, apesar dele. Não perco mais o tempo. Fico a cavaleiro dele o tempo todo! Nossa, esse “todo” assusta!
Lastimo quem não entende! Tenho pena dos homens que ficam procurando por ele e indagando:
- Cadê tempo para fazer tudo?
Coitado, perdeu... Ele continuará passando e o homem o perderá para sempre. Tempo perdido. Onde encontrá-lo?
Que contratempo!
Se tem contratempo, tem "pro"tempo? Os contratempos são percalços da vida. Os protempos serão, por acaso, as surpresas boas?
Assim como o infinito, inevitavelmente ele teve um começo para que se chamasse tempo. Tudo isso é eterno e ainda será após o homem não mais ser.
Quem o criou? Quem também não tem definição. Se, portanto, não está sujeito às explicações humanas, é absoluto. Nós somos os relativos a medidas de tempo e espaço. Frágeis e efêmeros seres sem conhecimento do que foi ou do que será, do antes ou do depois, que são travessuras do tempo. Somos seres limitados pelo formidável feitor de fronteiras. Conseguem imaginar quem é esse FORMIDÁVEL FEITOR DE FRONTEIRAS? Se não conseguem, depois eu conto...
Pensando bem, quando um lado do casal diz: vamos nos dar um tempo – deveria dizer: vamos nos dar dois meses, seis dias e duas horas, por exemplo. Seria mais lógico, não? Na realidade, esse um aí não quer enfrentar o desamor evidente e deixa para o coitado do tempo a tarefa de ativar a chama quase apagada. Como se pudesse!...
Já ouvi dizerem: parte do meu tempo uso para fazer tal coisa... Quanto desencontro! Primeiro: ninguém é dono do tempo, por que, então, dizer – meu? Depois, por que dizer – parte – se não se pode partir o tempo em pedaços, para que se tenha parte dele?
Podem até perguntar: mas segundo, minuto, hora, semana, mês, ano, século, não são partes do tempo? Não, não são. Isso tudo aí são medidas ideológicas criadas pelo homem, para poder situar fatos dentro da história.
Já imaginaram se não houvesse essas medidas? Seria o caos... Ou seria a inatingível perfeição? Penso, de repente, (essa palavra é uma travessura do tempo para assustar desatentos), que é bom, sim, que haja essas medidas. Se não, enlouqueceríamos!!!
Disseram até que há um tempo para cada coisa: tempo disso, tempo daquilo, como se fosse responsabilidade dele acontecerem coisas. Simplesmente elas acontecem e pronto.
Seria perda de tempo pensar assim, não fosse a necessidade do homem de ilustrar para ensinar... Com isso ele, o homem, está querendo dizer que deve haver paciência, discernimento para fazer coisas adequadas a cada momento (momento: filhote do tempo).
Perder o tempo é não saber onde ele está? Como encontrá-lo?
Faz frio hoje e me disseram:
- Que tempo feio!
Santa ignorância! Estamos no Inverno, é tempo de frio. Ele está como sempre no tempo certo. Nós é que não nos adaptamos a ele. Aqui não temos aquecedor nas casas, agasalhos que realmente esquentem ou, pior, a maioria não pode comprar bons casacos!
Quando chove, é a mesma coisa, só reclamação!
- Molhei a barra da calça...
- A roupa não secou!
- Esqueci o guarda-chuva...
Que coisa esquisita! Nunca consegui guardar a chuva! Ela cai, vira enxurrada e desaparece na terra, no bueiro, no rio... E que trapalhada, quando chove uso sombrinha. Por que sombrinha? Pra quê, se não tem sol para fazer sombra. Sombra grande é sombrona? E sombrinha é sombra pequena?
E o vento, então!
- Que vento irritante!
Esquecem que nós estamos no caminho do vento, não ele em nosso caminho. Ele é lindo!
“O vento é bom bailador,
Baila, baila e assobia.
Baila, baila e rodopia
E tudo baila em redor.”
Como dizia o poeta português Afonso Lopes Vieira. Nesse poema o vento mexe com as flores, folhas caídas, árvores, as ondas do mar... E se vai...
Ele já existia no tempo em que não havia casas, gente, coisas... Eles dois devem ser irmãos: “O tempo e o Vento”. Já Érico Veríssimo escreveu sobre isso.
Ambos são invisíveis, mas a gente sabe que existem.
O tempo é sempre lindo! Tomara nunca me chegue o tempo de reclamar dele, como qualquer velha coroca.
Estou agora (que também é parte do tempo) parada no tempo (eu parei, o tempo continuou), olhar vago na imaginação, em plena madrugada (que é um dos limites humanos do tempo) a refletir sobre o pouco tempo que me resta para fazer tanta coisa que só o tempo me ensinou que é tão bom fazer!
Que desperdício de tempo, o tempo que levei fazendo coisas sem nexo. Quanto tempo perdi perdendo tempo, mas no meu tempo (serei eu dona de um pedaço do tempo?!) não me ensinaram que deveria redimi-lo e fazer, lá atrás, onde o tempo passava vagaroso porque eu era menina-moça, as coisas que já sabia fazer e não fazia!
Quem sabe ainda não era tempo de fazer? Será que agora terei a dádiva de merecer mais tempo para fazer tudo o que sonho e quero?
Agora que estou mais perto da hora de não mais contar o tempo com as contas do homem, que meu espaço medido já está bastante longo, ele passa por mim muito depressa: quando penso nele, ele já passou de novo.
Nem bem começou um ano, forma humana de medir o tempo, e já estamos no fim dele. Deve ser porque aprendi a dar valor a cada ano que passa e se acumula em minha vida. Agora (de novo um pedacinho do tempo) dou muito valor também a cada dia, cada minuto vivido.
Já notei também que por passar tão rápido por mim, tanto e tantas vezes, eu nem o vejo! Quando vi, já foi. Vi o quê, se não se pode ver o tempo?
E aí fico parada no tempo, admirada! Mas, espera, como fico parada no tempo se ele não pára? Socorro, por favor, me dê um tempo para pensar. Mas será que o tempo vai me dar essa chance de tê-lo comigo? Como se faz para se dar um tempo, se não existe dois tempos, três tempos...
Durante o tempo que me falta para sair deste espaço limitado e passar a fazer parte do ilimitado tempo, tentarei e tanto e como, fazer o que já deveria ter feito há tanto tempo (e é muito tempo!): escrever, escrever sobre tudo. Mais que qualquer coisa: escrever.
Registrar tudo para fugir do esquecimento, fruto do tempo passante nas pessoas alienadas e sem memória; registrar sobre a vida sofrida, sentida, amada e usufruída e por tudo isso bem vivida.
“Não conto o tempo que tenho,
Tem sempre alguém pra contá-lo.
E por conta da conta que se perdeu,
Vivo intensamente o meu tempo:
Se me deram, então é meu.
Um dia hão de parar a contagem
E passarei daqui à eternidade
Levando a grande vantagem
De ter vivido sem ter idade...”
Esses versos são meus, a apaixonada pelo tempo. Se quiserem ler o restante do poema, coloquei no final. Em certo momento desse poema escrevi:
... E se o tempo desgasta
Alguma parte do meu corpo...
Pensa comigo: não é o tempo que desgasta meu corpo. Ele é que se foi desgastando de tanto viver!
Dê-me um tempo, Vós o Doador do Tempo, e lhes direi mais dele.
Se me der mais um pouco, farei muito dentro dele, antes que ele escorra por entre os dedos da minha existência, como grãos de areia de uma ampulheta que não se pode conter, a não ser no tempo certo.
Espera, por acaso, há um tempo errado? Ou seríamos nós que estamos em desarmonia, desacordo, desencanto ou desavença com o momento, esse hausto do tempo? Esses tais são desatentos.
Sempre é tempo. Sempre é estar ao lado dele, sem perda, sem desperdício. É estar emparelhado com ele e jamais sozinho. É estar aqui e agora, atuante, dinâmico, vivo, sempre!
É fazer parte da infinita energia da Vida...
Sempre, de escrever, é tempo.
Sempre é o próprio tempo!
Sempre é tempo!
Tempo é sempre
Eternamente!!!
-o-
CONTINUAÇÃO DO POEMA:
Vivo com o que sinto,
Não com o que uma determinada
Idade poderia me dar.
E sinto o que vivo
Com a mesma intensidade,
Passe um ou trinta anos.
Se tombo, levanto.
Se vergo, não quebro.
Refaço caminhos, piso desenganos.
E vivo e vibro.
Ah! Como vibra
Cada fibra de mim!
E se o tempo desgasta
Alguma parte do meu corpo,
Como mutante,
Refaço em outra a que se perdeu.
Reponho, reparo,
Renovo, substituo,
Mas continuo vivendo.
Vivo sem sentir se há idade
Ardente e apaixonadamente,
Extravasando, excêntrica, o meu eu,
Em pranto, em risos, em emoção,
Como se dentro em mim
Coisa alguma houvesse
A não ser um imenso,
Intenso, vibrante coração!
E reparto versos como reparto um pão
Para que cada um tenha um pedaço de mim.
E repartindo-me, renovo-me
Em cada parte partida,
Enquanto fizer versos e tiver vida.
Aproveite a Rachel antes que acabe.
Rachel dos Santos Dias
(Na 1ª postagem, esse texto teve 106 leituras. Vamos ver quantas terá agora, com as modificações feitas!)