(Inspirações do Inverno)
A hora da partida não é como a da chegada
"Eu sou uma alma. Bem sinto que o que darei ao túmulo não é o meu eu, o meu ser. O que constitui o meu eu, irá além.” – Victor Hugo
Muitos esquecem que todos nós envelheceremos. Que a lei inexorável do destino humano impõe um começo e um final a tudo e a todos nós!
Geralmente, o início, como a primavera, é um momento festivo, muito esperado, de grande alegria e contentamento para pais, avós, tios, parentes e amigos enfim. Quase tudo é tolerado, pois todos estão com muita paciência e disposição para “agüentar” as peripécias da criança, que é sempre muito engraçada, plena de vigor.
Porém, o final, como no inverno, pré-dispõe à tristeza, o isolamento, a frieza nos sentimentos, o distanciamento e, inclusive, a impaciência e a intolerância.
Este é, ao contrário do esperado nascimento, o momento negado, rejeitado, de profunda dor.
Muitos chegam, até mesmo, a esquecer que aquele ser envelhecido pelo tempo, doente, triste e distante, é o mesmo que lhe deu a vida, lhe ofereceu momentos significativos e inesquecíveis. E, também, contribuiu de inúmeras maneiras para que a família existisse, senão foi o próprio responsável pela origem de tudo e pela grande parte de sua manutenção.
Eu, particularmente, sonho para mim uma partida quase igual a minha chegada. Senão com muitas festas, mas, pelo menos, com a alegria de um dever cumprido.
Quando cheguei a este mundo, diziam os meus pais, fui muito esperado e festejado, já que sou o último da descendência do “seu” Artur e da “dona” Josefina e, por isso, por eles abençoado. Naquele momento só houve alegria, todos sorriam.
Quando partir, também, não espero tristeza. Mas, anseio pelo cultivo de uma imensa saudade.
Se houver lágrimas, que sejam elas de boas recordações, a fim de que purifiquem minha alma e sejam como um tributo às minhas boas ações.
Vim, como todas as crianças, com a força da esperança, para meus pais. Pretendo, pois, ir com a convicção dos meus filhos de que tudo valeu à pena, por que sei que – para confirmar o que disse o poeta – minha Alma, neste mundo de contradições, não foi tão pequena.
Obviamente, pela minha própria condição humana, ao longo da vida, não só plantei flores. Não só semeei bondade. Pois, certamente, também cultivei espinhos e espalhei inimizade, já que a muitos agradei e a outros tantos decepcionei.
E, por essa razão, o inverno se apresentará frio e restringidor, como toda estação fria e transformadora. Sei que não só haverá perfumes na minha partida. Mas – espero - do incenso exalará o doce e suave aroma da eterna lembrança e, também, alguns lamentos e um pouco de dor que lentamente se dissolverá diante das boas recordações.
Mas - nós que somos de um tempo em que vivência de sentimento não era motivo para se envergonhar e, por essa razão, vivemos, senão praticando, pelo menos espalhando o bem por palavras e ensinamentos cristãos, temos uma missão ainda a cumprir.
Ou seja, inspirar os que estão aos nossos redores ao dever supremo da Vida que é a Ética, ao Amor que é a Tolerância e a Justiça e, sobretudo, ensinar, pelo exemplo, a prática da Caridade, nossa única e sublime herança, bem como o perpétuo dever.
José Paulo Ferrari - (Inspirações do Inverno, aos amigos que ficaram)
Obs.:
A intensa e fria estação chegou e, com ela, nossas recordações vão, aos poucos, invadindo nossas almas, remexendo no passado e incomodando nossos corações. Pois, naturalmente, por influência de sua peculiar ação, nossas almas são levadas às reminiscências da vida e não tem como, também, não vir à nossa consciência o passado e o futuro de nossa existência.
O presente texto não é um lamento e, muito menos, uma profecia.
Não pretende passar dor e, também, promover tristeza.
É, simplesmente, uma concepção poética de um momento a que todos nós estamos destinados, queiramos ou não.
Meu desejo é de que o seu inverno particular seja aquecido com muito amor, iluminado pela esperança e divido pelo espírito de fraternidade, a que chamamos amizade, e que devemos a todos os nossos irmãos de humanidade que, embora rodeados de calor humano, ainda vivenciam – de uma forma ou outra - o espírito da solidão!