A filosofia e o positivismo na obra de Antero de Quental

A filosofia e o positivismo na obra de Antero de Quental

Este ensaio se trata de uma aproximação da poética de Antero de Quental com as temáticas filosóficas e também positivistas que o cercaram contextualmente do século IXX e que foram decisivas na construção de sua poeticidade. Vamos nos referir sobre o se ecleticismo de Antero e sobre sua inclinação positivista sem se declarar publicamente adepto do positivismo, sendo pois um poeta adepto do plano filosófico metafísico. Ao longo de sua obra e notável sua admiração pela ciência positivista e evidente sua defesa da ciência contra a religião.

Antero Tarquínio de Quental, também conhecido como “poeta filósofo”, nasceu em 1842 na cidade de Ponta Delgada, em Portugal. Numa família de formação liberal. Teve formação católica e bem tradicional, mas construiu através de seus estudos e pelo seu gosto aguçado das leituras de: Balzac, Hegel, Victor Hugo, Proudhon, uma personalidade intelectual e moral, que se desenvolve em contato com o farto ambiente livresco da Universidade de Coimbra, onde segue aos treze anos e mais tarde vem a licenciar-se em Direito. Ao mesmo tempo em que sua forte tradição tradicionalista e católica sofre profundo abalo na medida em que ele se aproxima das idéias circulantes no meio acadêmico. Antero pelo seu temperamento revolucionário levou a ser ideólogo da geração literária, onde deve muita importância na Questão Coimbra e nas Conferências de Cassino, começando desde Coimbra a exercer grande influência sobre sua geração. Antero de Quental adere às ideias modernas do seu tempo (republicanismo na política, realismo na arte), destacando-se logo em 1865-1865, pelos ataques que faz aos defensores das concepções mais tradicionais em arte, como o Feliciano de Castilho, na polêmica conhecida como a Questão Coimbrã. Após a formatura, seguindo exemplo de Proudhon resolve aprender o ofício de tipógrafo na Imprensa Nacional (1866), seguindo logo a seguir para Paris onde apoia os operários franceses. Não tarda a regressar a Portugal e a viajar para os EUA.

Em 1868 fixou-se em Lisboa, onde funda com antigos colegas da universidade o Cenáculo, na Casa de Jaime Batalha Reis. Nesta fase destingiu-se como um grande paladino das ideias republicana. Nos anos seguintes Antero e vitima de uma misteriosa doença que lhe trás mal-estar e pessimismo fazendo com que se afaste do convívio social. Deprimido suicida-se em 1891.

Antero de Quental foi um verdadeiro líder intelectual de sua geração realista em Portugal, dedicando-se inteiramente aos grandes temas que envolvem a reflexão dos grandes problemas filosóficos e sociais de seu tempo e contribuindo de modo decisivo para implantações das ideias renovadoras da geração de 1870, a geração de Eça de Queirós. Os sonetos em que expressa suas inquietações religiosas e metafísicas constituem a parte mais importante em sua obra poética. É considerado um grande sonetista da literatura portuguesa ao lado de Camões e Bocage.

A sua poesia esta impregnada de conceitos que se estabelecem em forma de filosofia e um tanto positivista, que por sua vez exercem sobre a obra de Antero de Quental uma forte influência. O tema que será aqui abordado retrata uma poesia de cunho filosófico na qual o poeta não abre mão na hora de transformar sua arte numa espécie de instrumento e um desabafo, de um homem que esta a todo tempo confrontado com temas que por muito é parte fundamental da filosofia racional, a eterna busca de entender o ser divino. Muitas vezes quando confortado com temas dessa natureza o homem moderno, dotado de capacidade intelectual, se ver aprisionado a eternas reflexões existenciais, onde muitos deles, como é o caso de Antero, dotado de um poderosíssimo espírito perceptivo do contexto social e de um poder artístico – poético, transforma por meio da arte, todas essas inquietações filosóficas em matéria de sua produção artística. Serve, pois essas interrogações acerca da existência própria e divina como um objeto de composições artísticas, seja ela no campo poético-literário, na pintura, escultura ou em qualquer outro meio que por meio dele o artista possa debruçar sobre sua produção toda sua inquietação a respeito desse eterno confronto intelectual.

O positivismo passou a indicar uma doutrina filosófica e cientifica fundamentada sobre o que é real, aquilo que pode ser observado pela experiência. Após a revolução Industrial, o avanço das ciências naturais e a tecnologia determinaram uma forte reação contra os sistemas abstratos, onde se podemos perceber por esse viés a substituição de temas profundamente sentimentais presentes no romantismo por uma linguagem artística mais concentrada na realidade, naquilo palpável, que substitui a visão sonhadora idealizada pelo homem romântico, é justamente por essas radiações culturais de mudança em que se sobressaem as poesias de Antero de Quental. Portanto o progresso cultural e científico, levou a crença de que o homem pudesse resolver todos os problemas existenciais e sócias pelo descobrimento das causas biopsíquicas (raça), condicionamentos ambientais (meio) e das determinações temporais (momento histórico). De outro lado a desilusão dos ideais de liberdade, igualdade e fraternidade, provocada pelo fracasso da Revolução Francesa levaram a critica da sociedade burguesa, que assentara bases sobre o individualismo e o egoísmo transformando em um Materialismo repleto de ideias positivistas, realistas, deterministas, evolucionistas, cientificistas, liberalistas, contra-espititualistas, anticlericalistas, e ateístas. Muitas dessas ideias de cunho positivistas decidiram decisivamente na obra de Antero de Quental. Além das fortes ideias também do pai do positivismo Auguste Comte (1798-1857). “Segundo a sua teoria dos três estados”, a humanidade passará por três fases de desenvolvimento. No estado “teológico” regido pelo politeísmo, a imaginação popular criara seres sobrenaturais para explicar os fenômenos da natureza, sendo a sociedade dirigida pelo militarismo. No segundo estado “metafísico” a imaginação é substituída pela razão ou argumentação, e a sociedade é dirigida por juristas que estabelecem contratos sociais entre governantes e governados. O terceiro e último estado é chamado “científico” ou “positivo” nessa etapa começa o predomínio pela observação: não se procura, mas causa dos fenômenos da natureza física e humana, mas sua existência, seu efeito na relação com a ciência alcançada através do conhecimento positivo.

É com muitas dessas influências e ideias que Antero de Quental se usa para seu fortalecimento intelectual e reflete em sua obra todo esse amparo de ordem filosófica e um tanto positiva direta ou indiretamente. Dentro de suas influências desataca-se também a filosofia de Hegel, forte influenciadora das teorias de Marx e Engels. Pertencentes ao plano do idealismo. Ficam palpável essas influências em um poema seu muito conhecido, que não à toa leva o nome de “A Idéia”, o poema é composto de VIII partes, sendo todas sonetos. Escolhi aqui para a análise a IV parte:

A Ideia

Conquistas pois sozinho o teu futuro,

Já que os celestes guias te hão deixado

Sobre uma terra ignota abandonado,

Homem - proscrito rei- mendigo escuro!

Se não tens que esperar do Céu ( tão puro,

Mas tão cruel!) e o coração mogoado

Sentes já de ilusões desenganado

Das ilusões do antigo amor perjuro;

Ergue-te, então, na majestade estóica

Duma vontade solitária e altiva,

Num esforço supremo de alma heróica!

Faze um templo dos muros da cadeia,

Prendendo a imensidade eterna e viva

No círculo de luz da tua Idéia!

Percebe-se por essa parte do poema “A idéia”, uma presença da solidão do eu - lírico em relação aos amparos divinos, como se Deus o estivesse abandonado em sua trajetória da qual busca por um objetivo, sem essa presença que assume um papel de guia e orientador. O poeta se ver confrontado com ele mesmo a ir em busca sozinho já que as influências divinas e teológicas não mais diretamente ligadas com o fazer do homem, que agora é esclarecido e livre das amarras do irreal, da mitologia, e do encantamento que outrora lhe servia como base para sua idologia.

Na metafísica de Antero existe um esforço para explicar o mundo pelo viés cristão, com ela Antero pretende ter encontrado a razão do universo na Ideia, que por sua vez é um modelo platônico que faz um mesmo modelo geral de cada coisa ou noção abstrata, preexistente ao espírito humano, que nos permite conhecer a realidade. Os objetos do mundo interior ou qualquer sensação ou sentimento seriam apenas “fantásmatas”, imagens ou reproduções imperfeitas, de essências ultraterrenas, as “formas” universais e perfeitas, que se fazem presentes pela reminiscência, a lembrança do tempo em que, antes de habiterem o corpo, estavam no mundo das ideias.

Dentro dos pensamentos de Antero de Quental existem ainda outras vertentes que estiveram associadas ao seu contexto histórico e também ao período clássico da filosofia grega como por exemplo o “Panteísmo”, e o satanismo que é uma atitude adotada pelos diversos escritores que se revoltaram contra a divina ordenação da existência, e a inversão dos valores religiosos litúrgicos e éticos.

Não é à toa que Antero de Quental é considerado um dos maiores sonetistas da literatura portuguesa ao lado de Camões e Bocage, foi sem dúvida um homem com percepção e sintonia, capaz de captar as influências clássicas e de seu tempo. . Os poemas de Quental não seriam o que são se seu autor não fosse tão inteligente e que foi capaz de organizar seus conflitos de forma genial. Assim sendo “O Poeta Filósofo” fez de sua arte um altar para o adorno da filosofia e um espelho para a metafísica.

(Ensaio usado como trabalho acadêmico, (Literatura Portuguesa II - UFCG)

Referências:

D´ONOFRIO, Salvatore. Pequena enciclopédia da cultura ocidental: o saber indispensável, os mitos eternos. Rio de Janeiro: Elsevier, 2005.

MOISÉS, Massaud. A literatura portuguesa através dos textos. São Paulo. 7ª edição. Cultrix, 1976.

SARMENTO, Leila Laluar, TUFANO, Douglas. Português: literatura, gramática, proução de texto: Volume único, São Paulo. Moderna, 2004.

TERRA, Ernani, TERRA Ernani. Gramática & literatura, São Paulo: Scipione,2000.

Wellington Moreno
Enviado por Wellington Moreno em 12/06/2011
Reeditado em 12/06/2011
Código do texto: T3029926
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