MEU VOTO ERA SECRETO

Meu voto era secreto

Depois eles disseram

_Que atraso, que besteira

Diga em quem você votou ou votará

Vamos ser amigos, agora somos xará.

Depois passaram a olhar o meu voto

Como se eu pedisse devoto

E foram me "instruindo".

Teve até voto pronto

Pra que eu colocasse na urna;

Deram-me roupa,sapato, comida,bebida,

Dentadura, bola de arame, enxada e foice

A minha preferencia, foi-se

Fiquei na preferencia deles

Mas, estavam todos usando esses hábitos de eleição.

Até inventaram que dinheiro ao vivo "elegia" melhor.

É claro que eu não via o pior.

E foram comprando-me a cada pleito

E eu cada vez mais sem direito.

É certo que eu entrava na casa deles

Mas não chegava a entrar nos planos

Depois da eleição.

Pensei que assim eu chegaria fácil à satisfação.

Errei... e ninguém é rei, errei.

E quando eu esperava cartilha, vinha cassetete;

Na minha roça, pintaram o sete.

Recorri ao delegado

Vixe Maria! Quase fui fechado

Falei com eles que me deram uma orientação

Tão bem feita que saí desorientado

Meio descalquiado e sem paz

Com a minha mulher e nem meus filhos.

Mas o caso é que eu não aguentava

Esperar a melhora que eles prometiam e não haviam cumprido.

Homem, comigo, tem que ter palavra.

Fiz uns negócios bestas.

Rolos sem muita vantagens

Vendi tudo e fiz uma viagem

Vi gente sofrer que nem eu

E voltei assustado, sem dinheiro que chegasse pra família.

Aí eles me chamaram de novo

Disse que era coisa boa pro povo.

Fui e fiz fé. Sabe como é, né?

Outra eleição , nova enrolação e

Eu aqui desse jeito que você vê.

Agora, tão me dizendo que tem até TV

(Eu conheci isso lá na Brasília)

Mas, o que eu quero mesmo é

Minha viola, meu terreninho, minha família...

Sou vaidoso não.

Quero é meu voto secreto, de novo e sem compromisso

Nada de cabo eleitoral

Isso só dá consumo de Melhoral.

Quero a minha vidinha mansa

Meu chão pra cair morto

Sem compromisso com essa cambada de torto.

Vou tocar uma nova roça

E com fé em Deus e a Virgem Nossa

Vou ser dono do meu nariz.

A vida é como um osso

Mas, eu tenho fé, seu moço.

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Tá vendo aquela fazenda acolá?

Pois é, seu moço, foi minha

Eles disseram que eu não tinha documento certo

E que o melhor era eu vender

Vendí prum doutor que apareceu aqui

Por ninharia. Meu dinheiro já murchou.

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Em Salvador-BA, num 19-12-1979; ainda em tempos de ditadura.

Alorof
Enviado por Alorof em 22/04/2011
Reeditado em 28/04/2011
Código do texto: T2924644
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