Sabedoria e erudição
Necessito saber?
É a pergunta que se fazia o Iluminista Voltaire, como menciona nas suas anotações no "O filósofo ignorante" :
" Vendo, pois, que um número prodigioso de homens não tinha a menor idéia das dificuldades que me inquietam, e nem desconfiava daquilo que se diz nas escolas sobre o ser em geral, sobre a matéria, sobre o espírito, etc...; vendo também que frequentemente muitos caçoavam do que eu queria saber, suspeitei que não seria absolutamente necessário que o soubéssemos. Pensei que a natureza deu a cada ser a porção que lhe convém; acreditei que as coisas que não podemos alcançar não são nossa partilha. No entanto, malgrado esse desespero, não abandono o desejo de ser instruído, e minha curiosidade enganada é sempre insaciável."
Quanta coisa se poderia tirar somente desse pequeno trecho.
Mas, dada minha ignorância e limitação erudita, fico no limiar do uso de pensamentos e citações que me dão o direito de volatizar pensamentos e projetá-los nas quimeras de meu cotidiano.
Primeira coisa eu me ocorre é que todos deveriam sempre ser insaciáveis na busca do saber. Em muitos dos meus escritos aqui, poderá ser encontrado a citação de Castro Alves, na sua poesia O livro e a América, onde ele já incitava as pessoas a ampliarem do seu pequeno quinhão do saber, através da educação. Assim, também Voltaire se mostra inconformado e sempre busca refazer seus entendimentos até mesmo enganando-se por vezes com sua curiosidade de desvendar mistérios da natureza e da sociedade.
Assim, também eu, busco me aperfeiçoar, mas sem perder a humildade e lamentar que tempo não me tenha sido dado para moldar mais meu conhecimento.
Estava eu há pouco lendo algo sobre Sócrates, desviei minha atenção para busca de alguma coisa na Mitologia Greco-romana, e aí construí um pensamento que postei no Facebook correlacionando a atração pela beleza e pelo fascínio que causam as Ninfas benfazejas das águas das fontes e dos rios, aos males que me açoitam e a ânsia por cura até mesmo por essas divindades: "Das Náiades busco a cura embora ainda não tenha encontrado a fonte certa da qual possa beber ou me banhar".
Depois tentando me lembrar de uma tabela de dizeres atribuída aos Persas, como regras áureas de vida, encontrada nas ruínas da cidade de Persépolis (construída por Dario e incendiada por Alexandre 331 anos antes de Cristo nascer e dar início à Era Cristã de nosso calendário), depois buscando algo sobre nepotismo e déspotas cheguei aos Iluministas, dos quais tomei a citação de Voltaire para minhas divagações.
Como vêem, também não consegui ainda ter minhas conjecturas próprias, embora teça alguns ensaios. Sei que longe estou do brilhantismo de tantos que já surgiram na história da humanidade, o que me faz pensar até ele tinha razão: estaria eu no limite de minhas possibilidades, ou mesmo lutando com os parcos conhecimentos que me foram possíveis, ou seja, com o que me fora aquinhoado pela natureza?
Mas também Voltaire se mostrava prostrado diante das fraquezas humanas, quando cita ainda no “Filósofo ignorante” – Questão II - “Nossas Fraquezas” :
“Sou um animal fraco; ao nascer, não tenho força, nem conhecimento, nem instinto; não posso sequer arrastar-me até o seio de minha mãe, como fazem todos os quadrúpedes; só adquiro algumas idéias, como adquiro um pouco de força, quando meus órgãos começam a desenvolver-se. Essa força aumenta em mim até o momento em que, não podendo crescer mais, começa a diminuir dia a dia. Esse poder de conceber idéias também aumenta até seu limite e, em seguida, evapora-se insensível e gradualmente.
Que mecânica é esta, que aumenta a cada momento a força de meus membros até o limite prescrito?
Ignoro-a. E aqueles que passaram suas vidas a buscar essa causa não sabem mais do que eu.
Que outro poder é este, que faz as imagens penetrarem em meu cérebro, que as conserva em minha memória?
Os que pagaram para sabê-lo procuraram inutilmente. No que se refere aos primeiros princípios, somos tão ignorantes como quando estávamos no berço”.
Assim, meus caros leitores, sem me ater muito às inquietudes de Voltaire, volto-me às minhas próprias, que também me incomodam sobremaneira. Estaria eu chegando no limite da absorção do conhecimento ou, a minha reconhecida ignorância por não ter conseguido me dedicar a eles na vida é que me levam celeremente a explorar o que me resta de possibilidade de buscá-los?
Um fato é certo, ainda tenho forças e inteligência, mesmo que limitada, malfadado o tempo, de buscar a luz do conhecimento, enquanto não se dobram os meus limites no ápice da curva da minha capacidade intelectual.
Longe de mim a falsa erudição, artifício dos verdadeiros ignorantes, já que lhes é tirado o dom da humildade e do simples entendimento desses limites que a natureza se lhes impõem, de forma gradual, insensível e decisiva.
São Paulo, 06/03/2011