Dos dialógos
E eu falei tão inocentemente despretensiosa sobre qualquer continuação da conversa:
- Há corações cheios de poças d'água salgada.
Ele estranhou, franziu a testa de imediato, mostrando a ruguinha ainda tão sutil oriunda das indagações sobre os estranhamentos presenciados:
- Mas como? A que se refere?
E eu:
- Bom, só quem chora é o coração, a razão poderia espremer-se toda e não sairia uma só lágrima. E então, ficam lá, os buracos dos golpes que más amores o dão, e o volume das lágrimas que ocupam esses espaços. É assim, um golpe, um choro, uma poça d'água, se é que me entende...
E ele compreendeu, tão bem quanto eu própria, à minha metafóra e disse:
- Mas creio eu, que há amores que aquecem o suficiente para secar essas inundações pequenas e regradas que as lágrimas fizeram no peito, e são estranhamente hábeis em reconstruir superfícies de terras mal acentuadas pelos golpes.
- Também creio que sim.
- Se me permites, agora, uma metáfora?
- Pois não.
- É tão melhor que desmorone todo um castelo de areia, se em troca apostares nem que seja num tijolo de construção.
- Eu entendi, deveras é mais proveitosa uma pontinha de realidade do que uma imensidade de ilusão.
- Isso mesmo.
E por aí foram desenroladas, as metáforas para uma vida inteira...