Uma falsa história romântica
À primeira vista, podemos pensar que Jane Austen, famosa escritora inglesa, era uma especialista em histórias românticas, visto que seus romances têm como tema central a busca da felicidade e o casamento, terminando sempre com um final feliz. Porém, é preciso, principalmente se lermos um dos seus mais conhecidos romances, Razão e Sensibilidade, ir além das aparências e ver a crítica social presente na trama.
A história tem como protagonistas Elinor e Marianne Dashwood, duas jovens que acabaram de perder o pai e se veem desassistidas pois, o filho do primeiro casamento dele, seu meio-irmão, embora houvesse prometido ao falecido que as ampararia, é totalmente influenciado pela esposa, o que o faz negligenciar sua promessa. Então, as duas heroínas, com sua mãe e a outra irmã, Margaret, mudam-se para o campo, onde têm que viver em condições modestas. As duas irmãs, ainda que tenham um relacionamento muito íntimo, são muito diferentes em temperamento: Elinor é sensata e Marianne é emotiva, guiando-se em demasia pelas emoções e por suas ideias do que seria um homem perfeito, que nem sempre correspondem à realidade.
Elinor ama Edward Ferrars, irmão da esposa de seu meio-irmão, jovem sério e de bom-caráter. Porém, esse amor será atrapalhado pelas convenções sociais, nas quais o interesse fala mais alto do que as emoções verdadeiras e fatores como dinheiro e poder ditam as regras, o que leva os personagens a ver que, frequentemente, interesses atrapalham as nossas vidas. Marianne desperta o interesse do coronel Brandon, homem nobre e de princípios, mas o despreza por ser mais velho e não corresponder ao seu tipo de homem ideal. Acaba conhecendo e se apaixonando loucamente por John Willhoughby, que, aparentemente, é o homem perfeito.
No entanto, Marianne logo descobrirá que nem tudo é como se espera e que, muitas vezes, o caminho da felicidade é longo e tortuoso. Elinor, que é mais ponderada, tentará aconselhá-la e mostrar que precisamos usar o bom-senso em tudo, mesmo no complicado jogo das relações amorosas. Elinor é uma heroína interessante. Sensível e solidária, ela não se leva pelo impulso, vê além das aparências e esquece de si mesma, principalmente para ajudar Marianne, que sofre em demasia com suas decepções amorosas.
Jane Austen, neste romance, parece que quis mostrar que, para se ser feliz, é preciso saber combinar o romantismo e o bom-senso, nunca permitindo que nossas emoções nos impeçam de ver as coisas como elas realmente são, ou nos iludiremos e terminaremos por nos decepcionar. No final, as heroínas passarão por uma longa jornada interior. Marianne amadurecerá e Elinor será recompensada pela sua sensatez e equilíbrio.
Vemos, também, através do fino senso de humor da autora, uma sutil crítica a uma sociedade que limitava a vida das mulheres, que poucas escolhas tinham e, se não conseguissem um bom casamento, acabariam por levar vidas limitadas. Jane Austen, ainda que tenha viajado pouco, soube retratar, com rara sabedoria, emoções e comportamentos universais. Por isso, suas histórias se tornaram atemporais. Suas heroínas eram mulheres bem humanas, que as circunstâncias obrigaram a amadurecer e que tiveram que ver o que lhes convinha. O verdadeiro amor podia não ser o mais romântico mas era, certamente, o que estava presente e nunca nos abandonava.