Em princípio, superconhecimento é a forma de análise dos fatos sociais e humanos a partir das óticas científica, psicológica, histórica, linguística, política, jurídica, sociológica, religiosa, antropológica, filosófica e espiritual. Não se trata de dominar profunda e tecnicamente cada um desses ramos de saber ao mesmo tempo. Tem algo a ver com as propostas basilares multi-integradoras de várias correntes, por exemplo:
·        Pansofia - ou sabedoria do todo, teorizada pelo educador, filósofo e teólogo checo Jan Amos Comenius (1592-1670). É um conhecimento que integra observação científica, racionalidade filosófica e revelação religiosa na análise dos fatos humanos.
·        Pluralismo – Em Sociologia, é a doutrina de interpretação dos fatos políticos, sociais e culturais integrados por fatores múltiplos originados de grupos autônomos, mas interdependentes.
·        Holismo – Abordagem científico-filosófica que busca integrar os fenômenos humanos do todo para o individual e do indivíduo para o todo.
·        Neocalvinismo - movimento de retorno às bases do calvinismo primitivo, mas agregando os dogmas às principais tendências cristãs, principalmente no que se refere à predestinação da alma e à vida eterna.
·        Espiritismo – doutrina que abarca ciência, filosofia e ética crística para explicar o homem em seu contexto universal e subordinado às leis divinas e naturais. Foi fundada pelo pedagogo e escritor francês Allan Kardec (1804-1869).
·        Teoria de Tudo – Teoria que pretende unificar em uma só estrutura de raciocínio os postulados da mecânica quântica e da relatividade geral.
 
A pretensão é tentar, sempre que necessário ou possível, fazer enquadramentos interligados, harmônicos e intercomplementares entre os saberes, onde couber, ou melhor, onde coubermos, pelo menos tomando como ponto de ligação as bases de cada universo sapiencial.
[Eu acho que, para sairmos, ou para tentarmos sair, do nosso acanhado nada cognitivo, a teoria de tudo como forma de abordagem é um bom começo. Refiro-me aqui não à chamada “teoria de tudo” que pretende unificar as Físicas. Penso, mais amplamente, que o tudo, como forma de raciocínio interligado, deve abranger as ciências, as filosofias, as religiões, as doutrinas, as formações sociais de estudos esotéricos e exotéricos, as artes, as culturas, as sabedorias populares e tudo o mais que possa produzir explicações sobre os fenômenos humanos, espirituais, naturais e culturais. Em todas as formas e ramos de saber há contribuições para percepções de verdades profundas, eternas e universais. É questão de se ser, em princípio, um livre-pensador desarraigado de dogmas, preconceitos, postulados e teorias engessantes sobre qualquer assunto estimulante ao pensamento unificador.]
 
Vale notar, contudo, que o poder de síntese e o poder de simplificação devem nortear toda tentativa de multirraciocínios, quer para quem se expressa, quer para quem interpreta. É de se relevar também que dentro de cada ramo de saber (científico, filosófico, espiritual, religioso, cultural, popular etc) temos de adotar as correntes de pensamento que mais se coadunem com nossa própria forma atual de pensar a vida e o mundo, considerando que, inevitavelmente, cada pessoa tem suas ligações espontâneas naturais, natas ou adquiridas, para determinadas ideias.
Não é o caso simplesmente, por exemplo, de se ser um filósofo. É de se definir que tipo de filósofo se é ou se pretende ser. Há filosofias para todos os gostos e tendentes a toda espécie de ideologia, das mais materializantes às mais espiritualizantes.
Como ponto de partida, estudemos a Filosofia pura, que é aquela construída pelos sábios gregos, principalmente Sócrates e Platão. A partir do domínio de suas ideias, fica bem mais fácil e seguro se especializar em alguma corrente filosófica posterior ou contemporânea. Porém, que esses dois sábios estejam sempre sendo comparados e servindo de referência para as correntes mais ideologizadas, onde for compatível. Isso serve para todos os outros ramos de saber constituídos, inclusive as correntes religiosas e científicas.
E a Filosofia continua evoluindo sempre, porque novos fatos surgem a cada dia desafiando lógicas já bem sedimentadas e pacificamente aceitas por várias correntes filosóficas, forçando destruições e relogicizações de produtos de pensamento já solidificados. [O problema nem sempre está na lógica operacional em si, mas na montagem da “lógica de implementação”, especialmente quando se considera o que vai ou não para o parâmetro “exclusive” e sua relação com “true” ou “false”. Existem muitas premissas ocultas na natureza e que não são sequer aventadas, o que leva muitos programas de raciocínio explicativo dos fatos a falharem após pouco tempo de uso, principalmente nesta fase de grande transição múltipla por que passa o planeta.]
Raciocínios outrora extintos e inteiramente rejeitados por gerações sucedentes são agora restaurados e ressignificados, passando a gozar de novo status. Até bases unanimemente reconhecidas como eternas e universais são revistas ou inteiramente reinterpretadas, para adequação a novos fatos que vêm à tona da percepção social, cheios de enigmas, cheios de novas premissas.
Para cada natureza e jeito de ser existe uma religião, ciência ou filosofia que cai como a mão na luva certa.
Porém, é preciso nos plantarmos inicialmente sobre uma pedra angular ou fundamental de fé em Deus, no homem, na vida, na ética etc, ainda que consideradas as diferenças individuais de enfrentamento dessas grandezas, para a partir daí nos apegarmos a uma formação compatível.
Qual seria uma base ética universal? A meu ver, o Evangelho puro de Jesus, antes da sua dogmatização pelas correntes cristãs primitivas e derivadas. O discurso evangélico pode ser o único conhecimento que se basta por si só, porque é o conhecimento do progresso social pela via do amor, analisável sob as óticas religiosa, filosófica ou científica.
Há muitos livros que fazem análises profundas e essenciais acerca dos ensinamentos diretos de Jesus, quer de origem humana, quer de matriz espiritual, sem grandes influências ideológicas, hierológicas (religiosas) ou dogmáticas.
Não adianta multiconhecimento sem amor, sem atitude e sem ações vivenciais úteis e proveitosas. Consideremos que a multi-inteligência cognitiva sem finalidades pragmáticas tende até a dessensibilizar, o que não é raro se perceber por aí.
 
Entretanto, há os que sobrevivem muito bem não se apegando a qualquer corrente dogmática constituída, seja de pensamento, seja de fé, pelo menos em certas fases da vida. É o caso, por exemplo, dos partidários do Unitarismo
[1].
 
{“Sou uma iniciada sem seita.”– Clarisse Lispector, em seu livro “Água Viva” (1973)}
 
A pedra angular de uma sólida alvenaria filosófica é reconhecer que todo assunto é sempre a ponta do iceberg de um complexo de assuntos interconexos, pré-conexos ou pós-conexos.
[Porém, o que importa é que o assunto em que estamos momentaneamente debruçados nos realize circunstancialmente e nos ajude a montar quebras-cabeças parciais daquilo que tem a ver com nossas atuais percepções sobrevivenciais. Claro que de vez em quando processos meditativos ou fatos da vida nos oferecem ou nos impõem uma chave de conectividade para acesso a outros níveis mais profundos e amplos da realidade, como as que estamos a vivenciar nos tempos atuais.]
 
Em muitas situações, contudo, é o vazio de pensamento que pode viabilizar a solução mais rápida e eficiente para um problema, especialmente quando se relaxa, medita e entra em sintonia com a Sabedoria Universal. É quando se captam sinais intuitivos, inspiracionais, revelacionais, soniais e imagéticos. No mínimo, servem para se evitar perder muito tempo ou excelentes respostas que estejam a bater na calota do cocuruto, vindas por canais transracionais ou totalmente estranhos às linhas de raciocínio estabelecidos.
 
Disse o poeta português Fernando Pessoa (1888-1935)
[2]:
“Nenhum problema tem solução. Nenhum de nós desata o nó górdio; todos nós ou desistimos ou o cortamos. Resolvemos bruscamente, com o sentimento, os problemas da inteligência, e fazemo-lo ou por cansaço de pensar, ou por timidez de tirar conclusões, ou pela necessidade absurda de encontrar um apoio, ou pelo impulso gregário de regressar aos outros e à vida.
Como nunca podemos conhecer todos os elementos de uma questão, nunca a podemos resolver.
Para atingir a verdade faltam-nos dados que bastem, e processos intelectuais que esgotem a interpretação desses dados.”
Ele tem lá sua razão. O Universo nunca facilitou muito a descoberta de uma solução definitiva para todo e qualquer problema humano. Talvez, a solução definitiva mais viável para uma pessoa resolver qualquer um de seus problemas aqui no orbe terrestre seria seguir, com cem por cento de fidelidade, a essência dos ensinamentos divinos do maior avatar
[3] que já pisou na face da Terra, que foi Jesus o Cristo. Quem conseguiria?
Entretanto, quando paramos para arrumar a casa mental e relaxamos, oramos, sorrimos, brincamos e solicitamos ajuda, normalmente conseguimos a solução, senão do problema, pelo menos de nós perante o problema.
Quanto mais nos desvencilharmos das incógnitas absolutas, tanto mais perto vamos ficando de fechar a grande equação da nossa vida terrena, que é igualar ou enxertar os valores da árvore da vida com os valores da árvore do conhecimento.
O que mais precisamos saber mesmo, sempre na linha de frente das prioridades cognitivas e afetivas, é como comer cada vez mais de outra espécie de fruta, que pode nos fortalecer bastante para aguentarmos a jornada. É a fruta não tanto da ciência, mas da consciência divina, que se centrifuga a partir de nós (afinal, “o reino de Deus está dentro de vós”) e se origina de cima (“pai nosso que estais no céu”) para nosso centro. Quer dizer, a interação das criaturas inteligentes com Deus, a partir do despertar da consciência divina em si, é sempre uma via de mão dupla, que vai se encurtando cada vez mais, até o nível em que Jesus disse: “eu e o pai somos um”. [É uma interessante coincidência que “eu” esteja dentro de Deus.] A consciência divina passa ao largo das abordagens puramente religiosas ou eclesiológicas. Consciência, do grego syneidesis, é antes de tudo a ciência de si mesmo (daí em latim querer dizer cum scientia), afastadas as mediações míticas para seu despertar, ainda que podendo se valer destas em determinadas fases do processo.
Quando bem processada e digerida, a fruta da consciência divina nos aproxima cada vez mais da árvore da vida, bem guarnecida no Jardim do Éden por aquele querubim espadachim (Gênesis, 3-24). Creio que essa árvore alegórica e pouco comentada na Bíblia é, em verdade, a espiritualidade essencial e pura a que todos deveremos retornar. Cada um retornará a seu tempo, quando se purificar por completo das mazelas do fruto proibido (arrancado por Eva daquela outra árvore, a do conhecimento), que causou a maior indigestão da história da humanidade(!). E que a fruta da consciência divina seja tão natural quanto à da ciência, jamais como a “laranja mecânica”, reportada no famoso filme de mesmo nome, de Stanley Kubrick.


[1] Corrente que prega a unidade absoluta de Deus, mas que defende a liberdade de cada ser humano de buscar a sua própria Verdade, independentemente de religiões.
[2] Em “O livro do Desassossego”.
[3] “Deus encarnado”, segundo as crenças hinduístas.
Josenilton kaj Madragoa
Enviado por Josenilton kaj Madragoa em 17/01/2011
Reeditado em 23/01/2011
Código do texto: T2735526
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