As verdades em si são simples, ainda que inter-relacionadas e infinitas. As formas de as nomearmos, de as entendermos e de as interpretarmos é que são variadas, complexas e sempre limitadas.
A Semiótica Cognitiva tem desenvolvido um papel muito importante na tentativa de unificar linhas de raciocínio e de abordagens das coisas, valorizando a ideia conexionista de que tudo tem a ver com tudo. É um esforço louvável, que corrobora a já existente Teoria de Tudo. [“Uma Teoria de Tudo, ou teoria do todo, ou ainda teoria unificada ou unificadora, expressão mais simples para Teoria da Grande Unificação, ou TGU (ou TOE por suas iniciais em inglês), é uma teoria científica hipotética que unificaria e procuraria explicar e conectar em uma só estrutura teórica, todos os fenômenos físicos (juntando a mecânica quântica e a relatividade geral) num único tratamento teórico e matemático.” – Wikipédia. Meu sonho é conhecer estudos que visem à unificação de vários “tudos”, não só na área das ciências físicas e matemáticas, mas também nas áreas das ciencias humanas e da espiritualide. Será a supertransdisciplinaridade.]
O eternamente básico é saber apenas que não existe nenhum assunto esgotável. Não só tudo está ligado a tudo, como também está em constante expansão sem fim. O que muda são os nomes e as novas descobertas de nós nas infinitas redes de significados.
 
“As pessoas não debatem conteúdos, apenas os rótulos.” – Mário de Andrade.
 
A rigor, a maior questão não é saber o que é algo, mas o que é que se convencionou a chamar de algo. Existem as coisas, em si, e existem os nomes que damos ao que conhecemos delas. O que importa mesmo é tentar saber a natureza da essencialidade do objeto sob análise, não sua denominação entre as várias ciências, ainda que sabendo que essa essencialidade em sua inteireza é imperceptível aos nossos sentidos intelectuais.
As verdades fenomenológicas são únicas. Seus nomes é que variam ao sabor dos ramos de saber, dos preconceitos, das ideologias ou das tendências políticas, científicas e religiosas dominantes, quer em escala local, quer em escala mundial, quer mesmo em escala espiritual.  A nossa miopia cognitiva é incurável, porque atrás de todo horizonte que conseguimos vislumbrar há um outro apenas como um vulto distante que vai se formando.
 
Aqui a miúdo do nosso dia a dia, tendem a levar alguma vantagem na multianálise dos fatos em geral, as pessoas polímatas ou multidotadas, que se valem, inclusive, dos estudos enciclopédicos, para lhes ampliar o que se chama também de “atacadismo consciencial” (que mais adequadamente deveria se chamar de “atacadismo sapiencial”).
Com o devido arranjamento do que pode oferecer cada um dos ramos de saber, é possível se aprender a contar as cartas do jogo das relações humanas, ao invés de viver blefando ou de apenas jogar aleatoriamente colando cartas.
Quanto mais se estuda profunda e livremente, e quanto mais se enfeixam e se aplicam os resultados desses estudos, tanto mais feliz pode-se tornar no complexo jogo das relações humanas, consigo mesmo, com os próprios saberes e finalmente com Deus. E, o que é melhor, adquire-se inteligência progressiva, pelo aquecimento dos neurônios e suas cada vez maiores ligações sinápticas, em que pese à gradativa redução de células neuronais com o avançar da idade. A rede de significados mais complexa e multinivelar ainda é a que se tece infinitamente dentro do nosso neocórtex.
 
É de grande valia o domínio amplo, ainda que básico, e a utilização dos múltiplos conhecimentos (científico, filosófico, filobíblico, filocrístico, psicológico, neurocientífico, sociológico, nutracêutico, sabedoria popular etc), interepistemologicamente, para um mesmo fim: o despertar da consciência maior, espiritual-superior ou divina. Esse é o grande fim, que traz um maior alento e laivos de alguma felicidade mais verdadeira aqui nesse labirinto de saberes terrenais, com o auxílio luxuoso do superconhecimento.
Mas, muitos conseguem esse despertar sem nenhuma agulha para tecer qualquer rede, às vezes sem qualquer conhecimento formal, com palavreado simples e reduzido. São os que já nasceram com suas redes de saberes já prontinhas, que jazem no arquivo morto do seu próprio inconsciente. Nem precisam pensar ou elucubrar muito para se pacificarem perante a vida com as verdades que precisam saber.
Não importa tanto o quanto sabemos, mas, sim, a qualidade do que sabemos, especialmente se for para nos consolar com as asperezas da vida, para nos fazer felizes, para nos fazer ver o mundo com bons olhos, para nos impelir ao amor, à caridade e aos sentimentos mais nobres que jazem dentro de nós mesmos e que muitas vezes o conhecimento, quando mal direcionado, tende a sufocar.
 
Só é útil o conhecimento que nos torna melhores.” - Sócrates
 
{Um risco comum à gente de inteligência cognitiva múltipla é a acomodação a um superficialismo generalizador sobre as várias formas de saber. Em muitos deles falta uma espécie de força-ação catalisadora de suas múltiplas potencialidades para pôr-lhes em marcha produtiva. Quando se gasta a maior parte do tempo rodiziando interesses intelectuais diversos, tende-se a não se aprofundar em nada, inclusive porque o tempo não é múltiplo, mas contínuo. Não se pode aprender ou se aprofundar em muitos saberes ao mesmo tempo, à exceção das mentes superdotadas e disciplinadas para a apreensão multicognitiva. [A rigor, é inapropriada a expressão “ao mesmo tempo”. O tempo é um só e ininterrupto.] Mais difícil ainda é fazer aplicações pragmáticas interproducentes dos relatórios e dos resultados de muitos conhecimentos díspares. Gerenciar e concatenar conhecimentos é um crochê dos mais difíceis. Requer tempo, paciência e disciplina, valores que os multi e superdotados normalmente não têm.
Isso só tende a não ser grande problema para aqueles raríssimos memoriões que são simultaneamente multidotados ou enciclopedistas e superdotados cognitivos. Mas, o sucesso de seus inventos, descobertas, criações, recriações ou construções somente costuma advir quando eles desenvolvem uma grande capacidade autogerencial e quando contrato conseguem ampliar cada vez mais suas plataformas cognitivas, de forma equilibrada e saudável, convertendo as aquisições de saber em resultados produtivos para si e para suas relações sociais, escolares e profissionais.
Tudo bem que o conhecimento tecnológico e informacional é condição sine qua non para um posicionamento decentemente sobrevivencial na atual conformação ou frame de expectativas do mercado de trabalho intelectual formal ou convencional. Precisamos de instrumentos cognofuncionais e comercialmente úteis, para garantir o feijão.
O que ainda faz um diferencial interessante no currículo para acesso às esteiras de produção mental ainda é a gama de capacitações calcadas no conhecimento, desde que esse conhecimento vise atender às exigências lucrativas da empresa.
Apresentar-se ou mostrar-se apenas como estudioso, pensador, erudito, superdotado ou multidotado cognitivo é até altamente arriscado na atual contemporaneidade eruditofóbica (que tem aversão ao conhecimento profundo e ao clássico). Corre-se o risco até de ser rotulado como louco, pernóstico, antiquado, antissocial. Há muitos anos não há mais vagas no mercado de trabalho formal para o pensamento puro, profundo ou abstrato ou para a produção intelectual dissociada de interesses banais, comerciais e que não sejam servis às atuais elites culturais, financeiras, políticas e religiosas.
{Há algumas décadas, a superdotação mental era assunto da Psiquiatria. Era vista como uma espécie de anomalia, de doença. Muitos superdotados, principalmente os pobres, hiperativos e rebeldes eram “tratados” psiquiatricamente, para uma tentativa de convivência “normal” com os “normais”. Ainda há quem os trate assim, principalmente porque que hoje em dia, a partir da chamada geração y (dos nascidos entre os anos 80 e 90), há uma incidência bem maior de mentes superinteligentes, irrequietas e rebeldes contra os sistemas fechados de saberes rotulados. Têm dado um trabalho danado para pais e professores que ainda querem impor padrões dos anos sessenta e setenta na educação formal.
Em verdade, os superdotados, multidotados, “diferentes” e destoantes dos lugares-comuns pensamentais de todas as épocas sempre foram vistos com ressalva e cautela por seus contemporâneos, porque costumam ameaçar interesses do status quo dominante. Um ideologema (elemento mínimo ou irredutível de alguma ideologia) popularmente clássico é o de que “pensar é perigoso” [Falamos aqui do pensamento independente, direto e inovador. É um contraponto à famosa frase de Riobaldo, personagem de “Grande Sertão Veredas”, de Guimarães Rosa: “Viver é muito perigoso”. Não podemos viver "a la vonté", sem pensar filosoficamente. Pode ser bem mais complicado não pensar do que pensar. Penso, em resumo, que o que é perigoso mesmo é só viver sem pensar ou só pensar sem viver. O importante é que o pensamento esteja muito mais a serviço da sabedoria do que do conhecimento.] É o que bem ironiza Machado de Assis, em seu conto “A Teoria do Medalhão”. [É de se ler também a crônica “Os Diferentes”, de Artur da Távola, para a arremate desta tessitura discursiva.]}
 
“O saber não está na ciência alheia, que se absorve, mas, principalmente, nas ideias próprias, que se geram dos conhecimentos absorvidos, mediante a transmutação, por que se passam, no espírito que os assimila. Um sabedor não é armário de sabedoria armazenada, mas transformador reflexivo de aquisições digeridas.” – Rui Barbosa
 
Quem não aprende a selecionar prioridades cognitivas, inclusive o conhecimento da administração do tempo, pode atrasar ou dificultar a solução de problemas sérios específicos e mais complexos. E muitos destes problemas são casuísticas que fogem de qualquer script de conhecimentos meramente enciclopédicos, impondo um aparente paralogismo (raciocínio involuntariamente falso, em que a conclusão não decorre das premissas) ou um non sequitur (em Latim, segundo o Dic. Houaiss, “inferência ou conclusão que não é consequência lógica das premissas”, ou “assertiva sem nenhuma referência lógica ao que foi dito anteriormente”) a várias premissas e sequências de raciocínios lógicos. Demandam conhecimento mais profundo ou inteligência intuitiva, inspiracional, afetiva ou até mística, o que costuma pegar de cheio os dependentes do psicologismo, do racionalismo, do economicismo, do matematicismo e de outras manias de reflexão padronizada.
A tendência mais recente em nível de aquisição de múltiplos saberes é se especializar num ramo específico de conhecimento e ampliar ao máximo o arcabouço de conhecimentos correlatos ou paralelos de ramos próximos ou afins.
Na impossibilidade de se alcançar isso, que se ame e ame. A prática do amor encobre uma multidão de necessidades cognitivas, inclusive sobre si mesmo.
Hoje em dia ninguém pode dar-se o luxo de isolar sua especialização cognitiva dentro da área correlacionada. Isso independentemente de alguns ramos de saber, como Filosofia, Psicologia, Economia, Direito, Nutrição, Ética e Sociologia, que nos exigem noções sólidas e atualizadas, para melhor nos situarmos no múltiplo contexto das relações sociais contemporâneas (sempre reiterando, contudo, que, para se chegar à paz interior, as não-palavras costumam ser uma distância bem menor, quando se tem, ou se atinge, por vieses semióticos extralinguísticos, os níveis de verdade de que se precisa para viver e conviver).
Para mentes naturalmente irrequietas, hiperativas e multi-inteligentes, o convívio com os saberes múltiplos é psicoterapêutico, ou é um portal tranquilo, seguro e felicitador rumo ao pluralismo sociofuncional. Para esses “diferentes”, a felicidade consiste em enxergar as questões humanas, sociais e espirituais através de um caleidoscópio multilente. Muitos conseguem viver nesse estado de graça, mesmo quando eventualmente tachados de loucos, intelectualoides, esquisitos, instáveis e distanciados das oportunidades distribuídas aos “bonzinhos”, aos “certinhos” e aos não-problemáticos. A mediocrização ou unidirecionalização da consciência é que para tais mentes especiais se torna um portal para a obsessão ou para a loucura. A normalidade-padrão extremamente rotineira e previsível, absorvida como um remédio controlado para a mediocridade, para as mentes irrequietas é o pior de todos os perturbadores psíquicos.O que pode enlouquecer mentalmente não é o volume de conhecimento para quem “é do ramo”, mas, sim, a interferência de drogas que alteram perigosamente o sistema nervoso central, agridem quimicamente a glândula pineal, ou afetam o comportamento natural dos neurônios e do fluxo de serotonina no cérebro.
O sinal típico de boa saúde das pessoas pluriletradas é o humor constante, fino e irônico e a forma tranquila com que enfrentam as questões que lhe são submetidas. Não “encucam” com o que sabem. Brincam com sua própria capacidade cognitiva e não são esnobes nem orgulhosas. Riem e curtem a vida, como uns privilegiados naturais. Quando são instadas a demonstrar o que sabem, fazem-no com simplicidade, ainda que se trate de uma demonstração em si mesma complexa ou sobre um tema complexo em sua própria essência.
O risco frequente de muitos enciclopedistas mal resolvidos com sua multissapiência é o de se tornarem glossomaníacos (que sofrem de glossomania, verborragia, logorreia ou mania de falar muito e sem sentido ou sem serventia) ou pensadores compulsivos, do tipo que está sempre enquadrando tudo e todos em algum feixe de raciocínios e de julgamentos. Vivem conceituando, contando casos, inventando piadas, exprimindo opinião sobre tudo, comparando todas as experiências alheias com as suas próprias. É um problema, principalmente porque, a partir desse vício de construção e desconstrução de pensamentos triviais, costumam bloquear a livre expansão da consciência cósmica e da supraespiritualidade. Não conseguem lobrigar as verdades sutis da mente univérsica em seu derredor. Vitimam-se facilmente nos processos de obsessão espiritual e nas produções de frivolidades consciencio-desviantes. [Curiosamente, existem grupos de apoio para tais mentes improdutivamente irrequietas, chamados Pensadores Compulsivos Anônimos. Confira em www.cuidardoser.com.br/pca/.]
 
Por sua vez, as pessoas monodotadas ou chamadas pejorativamente de “especialistas hemiplégicas”tendem a se fixardemais em uma só base de pensamento cognitivo, ao ponto até de ficarem superdotadas naquilo que sabem. Mas acabam se alienando contra outras formas mais abertas ou alternativas de ver e de complementar a necessária supervisão dos fatos da vida. Costumam prestar grandes serviços à sociedade, ainda que a partir apenas de sua especialização. Podem se dar por muito felizes, se estiverem atuando em consonância com sua vocação ou missão de vida.
 
Já as chamadas “pessoas comuns” costumam prosperar mais dentro das estruturas normais de ascensão social, econômica ou política, porque justamente se concentram naquilo que “dá dinheiro”, que “dá status” ou que “dá poder”. É a mediocridade produtiva ou funcional, porque trabalham em cima do esperado, do certo, do organizado, do que não dá dor de cabeça, não escandaliza, nem ameaça interesses ou poderes alheios. É como se se pertencesse a um clube fechado e intraprotetivo, cuja principal credencial de acesso e permanência é exercer papéis sociais bem comportados e tendentes à harmonia do conjunto.
Em qualquer hipótese, contudo, o trabalho feito com dedicação e esforço é o que mais conta. Às vezes o anônimo e aparentemente monótono trabalho de alguém considerado medíocre, ou até mesmo subdotado, tem uma importância estratégica e essencial na construção do Universo! E é peça-chave ao funcionamento da engrenagem da própria sociedade que o discrimina. Muitos medíocres imprimem grande funcionalidade, socialidade e pragmaticidade ao que sabem e ao que fazem para si e para os outros, e normalmente são mais felizes e prósperos do que superdotados esnobes, inúteis, antissociais ou preguiçosos.}
 
{O que importa não é o que você sabe, nem como você sabe, mas o que você faz, com o que sabe, para o verdadeiro crescimento pessoal e coletivo. – Toinho de Goia, cordelista e xilógrafo, aconselhando um sobrinho que acabara de ganhar uma medalha num torneio escolar de soletração, na cidade de Biritinga-Ba, no fim do ano letivo de 2001.}
 
Enfim, insistindo, não podemos nos empolgar demais achando que só o multiconhecimento, o entendimento e a manipulação dos vários produtos raciocinais já catalogados bastam para interagirmos bem no jogo relacional. Não. Às vezes é de um analfabeto formal ou de uma criança que podemos captar o que é essencial para resolvermos algum dilema que nos aflige. E tais apreensões advêm justamente quando estamos com o cocuruto esfriado.
A sabedoria ou, mais apropriadamente, a inteligência anímica ou supraespiritual tem muito mais a ver com percepções intuitivas, mais veiculadas pela glândula pineal, do que com linguagens cognoscitivas oriundas do córtex pré-frontal.
A inteligência natural ou espiritual costuma agraciar sobremaneira aqueles que têm a mente mais leve de conhecimentos humanos estéreis e intercontraditórios e que têm o coração mais puro e os valores mais autênticos. Estes costumam não só embutir pensamentos e sentimentos, mas também explodi-los mais autenticamente, em forma de emoções, de inocentes expressões de humanidade, na brincadeira, no choro, na gargalhada, valendo-se do seu mundo intuitivo-sintético. Muitos não têm palavras de “doutor” e não sabem dar nome técnico ou científico aos bois para se expressar. [Existe uma ciência que serve muito mais para bloquear do que para liberar acesso do universo lexical popular para o universo lexical científico: é a taxonomia ou taxinomia (ciência da classificação das coisas por palavras, normalmente agrupadas de acordo com o ideário geral de cada ramo de saber, principalmente o científico).]
 
Entretanto, muitos de tais sábios ataxonomistas não vivem a palavrear à toa e sem nexo, e muitos dos aparentes nonsenses antiacadêmicos estão mais nas percepções desatentas dos letrudos.
 
Muitos vivem a decifrar a vida através dos escritos. Outros conseguem melhor decifrar os escritos através da vida.
Com o acesso aos livros, algumas pessoas começam a juntar as peças que precisam para montar o quebra-cabeça da vida. Outros, pelo contrário, passam a entender melhor o jogo da vida, quando se utilizam da cultura livresca para desembaralhar as suas peças.
Muitas pessoas simples de saber têm bem afiada a sua conhecença natural, que lhes faz entender, para si e em si, as realidades de vida mais essenciais. Costumam apoiar-se em ditados, clichês, histórias, diálogos, “conselhos da vovó” e outros elementos da demopsicologia (“conhecimento das lendas, crenças e manifestações artísticas de um povo; cultura popular, folclore”, segundo o Dic. Houaiss), da sociopsicologia e da neuropsicologia (Vertente da Psicologia que estuda o comportamento da inteligência ou da mente cerebral). São portadores de uma aguçada inteligência intrapessoal nata ou adquirida, mesmo que apedêutica, que normalmente prescinde de grande QI verbal reprodutivo. Em suas linhas rústicas de raciocínio estão sempre citando indiretamente grandes pensadores, filósofos e cientistas da Humanidade, sem terem a mínima noção disso. Sabem agir com bom senso e prudência, a partir dos seus códigos comunicacionais meta e até extralinguísticos e com suas “tiradas” pejorativamente rotuladas de “incultas”. Isso principalmente quando praticam mais e se dão bem com as relações humanas, sociais e espirituais. Acabam na média sendo mais felizes e prósperos em várias frentes, porque vivenciam tudo aquilo que os teóricos, intelectuais e vaniloquentes vivem apenas a abstrair e nomenclaturar em seus gabinetes e ambientes acadêmicos. [É a velha questão entre teorizar o que fazer na prática vivencial, mas não fazer (são os teoristas), e praticar efetivamente o que se sabe, mesmo sem saber que sabe, mesmo sem saber por quê.]
 
O apedeutismo epidêmico tupiniquim tem colocado os jovens estudantes brasileiros entre os piores do mundo em contas e leituras. [Na prova de 2007 do Pisa (Programa Internacional de Avaliação de Alunos), o Brasil levou uma verdadeira pisa: ficou em 53º lugar em matemática, 52º em ciências e 48º em leitura, um dos últimos na classificação destas áreas.] Porém, a rigor não existe incultura, a não ser como verbete do dicionário. A velha tensão existente entre as chamadas cultura erudita e cultura formal de um lado e cultura popular e cultura oral de outro é articulada muito mais por correntes academicistas preconceituosas do que pelos que convivem diretamente com essas duas formas de manifestação social (a do mundo escolar, acadêmico, científico, livresco, monástico etc) e a do mundo asfáltico (mercado, feiras, praias, zonas rurais, ruas, vielas etc).
Afora isso, entretanto, a uma base larga de conhecimentos desequilibrantes e não confluentes e de um cultismo estéril e impraticável é preferível uma base estreita e modesta de informações sapienciais sólidas e utilmente sobrevivencialistas e felicitadoras. [Era o que se costumava almejar e conseguir formalmente no auge do ensino brasileiro (anos cinquenta), quando havia o chamado “bom primário”. Pena que logo em seguida passou a reinar o ignorantismo (doutrina que vê na instrução e na cultura instrumentos perniciosos e perigosos) ou a “idade das trevas” da educação brasileira, com o regime militar, principalmente quanto às grades curriculares das escolas públicas civis.]
 
A questão maior não está adstrita ao conhecimento formal. A sabedoria decorre de vários fatores extraescolares, principalmente da saúde e da prática virtuosa dos sentimentos, dos pensamentos, das palavras e das ações, confluintes para justificar e mais bem fixar um sentido satisfatório para a vida.
[É certo que, para alguns viventes, o sentido da vida é viver a dialogar infinitamente sobre o próprio sentido da vida. Isso até pode ser felicitador, desde que os diálogos se travem na beira da estrada, ora de frente para os caminhantes, ora de frente uns para os outros, ora admirando a natureza. E que os dialogadores nunca deixem de compartilhar entre si e com os demais passantes as boas impressões da sensorialidade vital. E que se inclua nesse compartilhamento uma boa jarra de suco de frutas.]
 
Muitos “sabem-tudo” ou letrudos tendem a depreciar as formas de comunicação apedêuticas e marcadamente agramaticais, muitas vezes mais honestas e saudáveis e mais abertiças a interações com o Universo. Boas relações se perdem por causa desse preconceito linguístico. [Linguisticamente, não existe agramaticalidade. Enquanto houver apreensão mínima de elementos da gramática formal que bastem para a identificação do signo de uma frase qualquer, é possível haver comunicação. No mínimo, podemos entender que há gramática parcial, nunca agramaticalidade.]
 
{Bolos gnósticos (de conhecimento) não convertidos em fissões energéticas e centrífugas na relação interpessoal tendem a virar blocos de gelo poluído ou bolos emocionais infartantes, obesígenos, obsedantes, cancerígenos ou até suicidas. – Voafra, advertindo um velho cientista que insistia para que ela entendesse seu discurso sobre a natureza molecular da antimatéria, na saída de um congresso de saúde mental para a terceira idade, na cidade de Cansanção (sertão baiano), num sábado do verão de 1993.}
 
A sabença sem finalidade prática e sem interligações resolutivas pode se transformar em logomania (obsessão pelas letras; apego doentio e exagerado aos estudos, com afastamento total de outras formas de aquisição de saber e de trocas conviviais e interações sociais). É a droga intelectual. Nunca devemos desemoldurar aquela frase de Albert Einstein: “pouco conhecimento pode ser um problema; muito conhecimento, também”. Mesmo porque a vida vive (ops!) nos pregando peças e troçando de tudo o que sabemos, ao trazer, de vez em quando, fatos novos que derrubam teses sustentadas por várias correntes sólidas de pensamentos, nos impondo revisões de conceitos e novas pesquisas, novas reflexões desconstrucionistas, inclusive sobre leis e interpretações tradicionais tidas como imutáveis e perfeitas.
 
{"Quando Você acha que sabe todas as respostas, vem a vida e muda todas as perguntas" - Bob Marley}
 
Outro erro de muitos sabichões pensabundos e filosofastros é desdenhar uma linha de raciocínio geralmente mais eficaz e resolutiva de muitos conflitos humanos, a saber: o sentimento, cuja sede é o coração, não o cérebro neocortical (o da massa cinzenta).
Quem não abre também a moleira do coração (que funciona como se fosse o cérebro emocional) para melhor sentir a realidade cotidiana e para fazer alguma coisa para melhorar seu derredor, pode até enlouquecer. Ademais, o sentimento também é uma forma de comunicação, ainda que extralinguística, muitas vezes eloquente e multissemântica. Sua repressão é caminho certo para a demência, para a descaridade, para a intelijumência e para a desumanização.
Pensamento e sentimento, quando em harmoniosa parceiragem proveitosa, formam uma dupla imbatível para as melhoras multidirecionais. O que mais vale não é o papel intelecto-social, mas, sim, o papel universal de cada um.
 
“Alma nobre traz consigo
Em permanente aliança
O raciocínio maduro
Num coração de criança”
(autor desconhecido)

Josenilton kaj Madragoa
Enviado por Josenilton kaj Madragoa em 04/12/2010
Reeditado em 04/12/2010
Código do texto: T2652572
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