Ensaio sobre a Loucura. primeiro capítulo

m homem mal vestido, de barbas grandes e roupas sujas, pula do alto de um prédio comercial. Lá em baixo há um alvoroço, pessoas correndo para verificar se o homem ainda respira. Ao constatar a morte do desconhecido, os observadores comentam entre si, Que loucura! Este homem deve ser um destes loucos que andam por aí sem norte. Ninguém, em seu estado normal comete suicídio. É loucura, só pode ser. Alguém ser capaz de tirar a sua própria vida. O mundo está mesmo louco. São as pessoas que estão loucas, sem objetivos...

Logo ali, do outro lado da rua, a menos de duzentos metros, enquanto uma multidão de transeuntes se ajunta para ver o corpo que caíra de uma altura de trinta andares, um carro sobe a calçada e atropela uma família, que esperava o ônibus para voltar para casa. Esta família vinha de um passeio no parque, lugar para onde ía uma vez por mês, por ser gratuita a entrada, podia com o pouco dinheiro que levava, lanchar no Mc Donalds, comer sanduiche com Coca-Cola. Os filhos esperevam ansiosos o fim do mês, para irem ao centro da cidade, também passear no zoológico.

Um corpo, está lá estirado no chão, ninguém reconhece a vítima, o suicida é um homem relativamente jovem, que se depedaça ao cair no asfalto, no centro da cidade, palco de muitas tragédias como esta, coisa natural. Já era costume de suicidas subirem no prédio, pularem do último andar, talvez por isso logo chegava os bombeiros. Paramédicos não vinhão, pois não atendem a este tipo de chamada, eles não socorrem suicidas, e os bombeiros também nunca chegam a tempo de impedir as fatalidades, ninguém nunca se pergunta sobre este fato. Será o fato de que mesmo nas organizações humanas, há, sobremodo, reflexos do caos? Todavia socorrer mortos seria um disparete, mesmo em um Ensaio Sobre a Loucura. A desgraça alheia atrai muitos espectadores, quando nos deparamos com um cenãrio de tragédias, calaminadades, sejam elas provovadas ou naturais, onde a alma humana se desnuda como um cão sem dono, não nos custa muito tirar do nosso precioso tempo a atenção das nossas próprias dores, para lamentar as dores dos outros. Do meio da multidão curiosa, surge uma mulher idosa, que se aproxima e se ajoelha junto ao corpo do dsconhecido, lamentando como quem perdera seu próprio filho, Meu Deus! um homem tão jovem! o que terá acontecido para abrir mão de sua vida. A vida é tão boa, minha gente, é uma dádiva de Deus. Que loucura é esta que tomou conta do mundo? Oh! meu Deus. Oh! meu Deus. Outro observador, ainda mais contristado, chega mais perto, e antes que levem o corpo, pede aos bombeiros para fazer uma oração pelo defunto. Diz, É preciso recomendar a alma deste homem infeliz, para que ele encontre um bom caminho. Oh! Senhor, tende piedade de nós, este homem que agora enviamos ati, foi vítima da nossa maldade consciente, fomos nós quem o matamos, com a nossa maneira egoísta de viver... talvez tenha decidido se matar, por falta de amor e de compreensão. Oh! Senhor, quantas vezes batemos a nossa porta em sua cara, quantas vezes passamos por ele sem o cumprimentar? Agora meus irmãos, oremos por esta alma, para que ela encontre o descanso eterno junto a Deus, o Pai, que aceita todos os seus filhos de volta, sejam eles pobres ou ricos... Amem! Era um pastor, carregava consigo uma bíblia na mão, mas a abriu, falou tudo de improviso ou tinha ja decorado seus discursos, parecia que fora convocado para aquela ocasião. Este homem, porém não aparentava loucura explícita, fez esta oração em voz alta, dizendo para Deus, que tivesse piedade daquele cristão, não o conhecia, mas sabia que Deus era capaz de conduzí-lo ao paraíso, como fizera o Cristo ao bom ladrão. Bom ladrão? É possível classificar de bom, um ladrão só porque amarelou na hora da morte, e pediu a outro agonizante que se lembrasse dele, quando chegasse no seu reino? Depois da prece em voz alta, o pastor começou um remungar sem fim, outra oração, agora em voz quase sussurada, infinitamente longa, pois o pastor não conseguia terminar seu monólogo, o que ele acreditava ser um diálogo com Deus. Os loucos diferem apenas em periculosidade, cada um expressa um forma de loucura distinta, médicos que receitam o não uso do tabaco, mas que são usuários inveterados de fumo e de acool. Juízes que pregam a justiça mas aceitam suborno, delegados que torturam para colher provas de crimes sem solução, políticos que desviam a grana da merenda escolar, filhos que escondem o que são, são todos loucos. E quem descorda é louco, apenas por descordar.

Os paramédicos, do outro lado da rua, socorrem as vítimas do acidente, as levam para uma emergência de hospital público. Como havia crianças envolvidas, mesmo parecendo já mortos, foram levados para uma tentativa de ressucitação, fora em vão, chegaram todos mortos ao hospital. Médicos e enfermeiros lamentavam a perda de uma família inteira, quatro vítimas ao todo. Entre os presentes, havia um médico velho, muito experiente, que tentava consolar seus colegas, dizia, Tudo isso é uma espécie de loucura, estamos todos loucos, em um só dia tantas desgrças. Duas tragédias, sem explicação! Coisa de um mundo absurdo. O Médico tenha cohecimento literário falava do absurdo de Camus, Não devemos nos surpreender, se ainda hoje não cair um avião sobre este hospital, Cruz credo. Diz uma médica católica, que ficava apavorada com os pensamentos do velho médico. Falo sério, outro dia ouvi, de um amigo que viaja muito de avião, que muitos pilotos voam embrigados. Seus colegas ficavam mais apavorados quando ele começava a falar da loucura humana. Era outro louco, que fingia compreender a loucura dos outros.

O jovem que subira com o carro na calçada, estava bêbado, voltava de um churrasco, onde havia bebido e consumido drogas, fora pego pelos policiais que faziam ronda na região, o lugar era bem guardado pelo estado, logo o jovem estava diante do delegado de plantão, para explicar o que acontecera. Então meu rapaz, como é que você foi cometer um crime desse, matar uma família inteira? Quem é seu pai? Não deve ter família, para andar por aí em alta velocidade mantando inocentes. Se tiver pai eu quero falar com ele. Da-lhe os parabéns. Diz o delegado, revoltado com a injustiça, com a fatalidade, com a qual devia tratar. Atordoado, porém sem nenhum ferimento, o jovem pede para ligar para o pai, pedido que logo é atendido pelo delegado, que parecia ser um bom cumpridor da lei. Embora o delegado insista em perguntar, por que andava em alta velocidade, em uma área que não permitia mas que 60 Km por hora, o jovem se recusa a responder, diz que não tem nada a declarar sobre o fato, e que só falaria depois que o pai chegasse com seu advogado.

No hospital, depois de confirmada a morte da família, os corpos são levados para o EML, para detectar a causa morte, há uma espécie de loucura no ar, por que era preciso cortar os corpos dos pobres infelizes, expôr as crianças e os seus pais a mais esta humilhação? Seus corpos já haviam sido destroçados pelo carro, e pela parada de ônibus, onde haviam sido imprensados?

Os corpos da família e do suicida, que pulara do prédio, se juntam à mesa geleda dos corta-defuntos, na morte todos são iguais, não há nenhuma diferença de tratamento. Mas com os vivos a coisa é bem diferente. Na cadeia, o pai rico chega com o advogado, para defender o jovem delinquente e, agora, assassino. Meu filho, o que foi que acontceu? Diz o pai abraçando o filho, demonstrando carinho e preocupação paternal. Nada pai, eu bebi um pouco com meus amigos, e na volta aconteceu um acidente, mas não foi culpa minha, o carro quebrou algum peça, eu perdi o controle, merda, não tive culpa pai, acredite em mim. Diz o jovem com bastante força moral. Fora tão convincente que até o delegado que já o havia condenado, intimamente, muda o semblante, passa a ter pena do pai, e, se colocando no seu luga, pergunta. Então, é o senhor o pai deste jovem? Sim, claro, ele é meu filho, meu único filho... nunca soube que bebia, como é que foi acontecer esta fatalidade? Delegado como é que se administra uma infelicidade desse porte? Ele matou quatro pessoas, não forma uma nem duas, não há outro caminho, seu filho é maior e vai responder pelo crime que cometeu. Mas delegado, ele não pode ficar preso, providencie sua fiança, e a partir de agora eu vou defendê-lo perante a justiça, meu cliente é primário e tem residencia fixa, portanto o senhor sabe muito bem que não pode mantê-lo preso. Diz o advogado, demonstrando bastante conhecimento do caso. Fazendo jus aos honorários que devia receber do homem rico. Além do mais, crime de trânsito não é considerado, em nosso pais um crime comum passíevel de prisão, o senhor sabe mais do que eu, está acostumado a soltar todos os dias, pessoas que, por infelicidade ou por imprudência atropela e matam pessoas, isto é coisa comum. Reforça o advogado seu argumento, de que o jovem por ser de família rica, e reu primário não poderá ficar preso.

Terminado o procedimento legal, o pai saca de um talão de cheques e paga a fiãnça, quase uma fortuna, para os padrões dos que morreram. O jovem é liberado, com as recomendações de praxe, não devia sair do pais, devia comparecer para responder ao processo em liberdade. Mesmo depois de matar quatro pessoas, o pai leva o filho para casa, para o seio da famíla, para o aconchego do lar, onde lhe esperava sua mãe aflita, por notícias suas.