AMOR ENVERGONHADO ( esboço para um possível ensaio)

Ontem escrevi e publiquei no Recanto um texto com o título EU TE AMO. Nele falo de um amor incondicional, tão incondicional que diz, em um dos seus parágrafos:

" Eu te amo. Ainda que tu senhor feudal e eu tua escrava; ainda que eu rainha e tu meu súdito mais subalterno; ainda que tu general de extrema-direita e eu guerrilheira acuada por teus soldados; ainda que eu torturadora e tu a cerrares no peito, até a morte, o nome dos companheiros; ainda que tudo assim fosse, eu te amo, eu te amo, eu te amo, eu te amo."

O que aparece nestas quatro situações é um amor pautado pela relação de poder e de submissão. Embora reconhecendo que, no amor, uma relação de plena liberdade é difícil, senão impossível, pelo menos deve ser sempre sonho a perseguir o sonho do amor entre seres livres, sem peias seja de que lado e de que natureza for que, se se almeja um mundo livre de couraças nem mordaças, é lúcido que se almeje o mesmo nas relações de amor.

Com esta escrita pretendo dizer que, se nada teria o poder de matar o meu amor, nem mesmo se fosse necessário submetê-lo a alguma das quatro situações que cito no parágrafo acima reproduzido, parágrafo que está no meu texto EU TE AMO, publicado ontem, como dizia, nada teria o poder de destrui-lo, a tal amor, mas, certamente eu teria que conviver com um amor envergonhado. Não, eu me engano: só não haveria vergonha alguma na relação entre a rainha e seu súdito, desde que a rainha abdicasse de qualquer uso do poder na relação com seu amado; também haveria a possibilidade de não haver vergonha na relação entre o senhor feudal e sua escrava, se ele a libertasse, a sua escrava, antes de lhe declarar o seu amor, antes de estabelecer com ela relação de amor.

Zuleika dos Reis, na manhã de 27 de outubro de 2010.