A CIDADANIA COMO FATOR DE RESGATE SOCIAL (TESE DE PÓS-GRADUAÇÃO) PROJETO SCV

O conceito de cidadania é ambivalente, polêmico e dinâmico. Trata-se de um conceito estritamente associado à democracia, possui uma vinculação jurídica e uma ligação do ser social com o Estado democrático. Não há cidadão que não seja cidadão que faz de um Estado, sentencia Dalmo de Abreu Dalari. A democracia é um princípio filosófico universal que vem de muito longe e de muito fundo, dos arcanos heurísticos de Platão que fez ressoar em A República o tom nitidamente estetizante e inédito do Direito e da Ciência Política. Os direitos só ganham substância em relação às leis humanas, ou seja, adquirirem significação dentro de uma comunidade política. A lei e o direito são inexoravelmente inseparáveis da presença de uma autoridade pública que a garanta. Fora do domínio de uma sociedade democrática e na falta de ma autoridade do Direito Positivo, é inócuo falar de direitos do cidadão. Admitir cidadania como uma categoria científica construída no processo de relações sociais implica a compreensão dos direitos como produtos que brotam da ordem da liberdade, a história e da democracia. Vive-se numa realidade social e política transpassada por classes antagônicas, o capitalismo convive lado a lado com a cidadania. Ambas as classes podem propugná-la, pois ricos e pobres são membros da sociedade. Em tempos mais recentes a cidadania vem sendo construída por dentro da teia de relações e da luta dos excluídos sociais, tendo em vista a possibilidade de universalização de direitos. Essa predisposição crítica frente à ordem estabelecida se estabelece no reino da política e em meio a um processo contraditório das relações sociais e das forças políticas em presença. É esse o solo das discussões de Carlos Costa, que nutre uma paixão pelos ideais republicanos e pela emancipação social. Homem de engajamento profundo na lide da administração de serviços socais, sensível ao clamor dos excluídos e poeta de fino lavor artístico, há muito tempo Carlos Costa libertou das cadeias o ser auroral que dorme em nós, o homem político que habita na polis e na vizinhança do divino, como os heróis de Homero. Este livro é um convite à leitura atenta de um tema intrigante e atual que conduz o leitor ao palco da grande política, dando asas à imaginação coletiva magistralmente trabalhada pelo autor.

Inverno de 2005

Dra. Iraíldes Caldas Torres,

Professora no Curso de Serviço Social da Universidade Federal do Amazonas Coordenadora do Mestrado em Sociedade e Cultura na Amazônia

A cidadania possui uma heurística heterogenia. A tradição filosófica ocidental erigiu este conceito sob os pilares da vontade divina, da ordem do mundo, da razão e da natureza das coisas. O direito do cidadão enquanto direitos naturais eram transpostos para as comunidades políticas, sob a forma de direitos positivos, o que lhes assegurava a sua validade. Em sua acepção moderna, a cidadania é um conceito entre capital e trabalho. É construída pela classe operária na extensão dos conflitos sociais advindos da contradição entre o capital e o trabalho. Não é uma dádiva e nem um estado de repouso do espírito, é uma ação concreta que se estabelece em meio às contendas e sangrias desatadas no interior das sociedades democráticas. Postular uma igualdade humana básica é investi-la do direito de cidadania que, em ulterior sentido, significa garantir um conjunto de direitos civis, jurídicos, políticos e sociais. A cidadania é dinâmica, natural e fluida, ela se coloca no fio da navalha da correlação de forças entre as classes. Nesse processo histórico-social de for;as entre as classes alarga-se o âmbito da formação cultural, isto é, no campo da construção de formas de racionalidade, socialização de valores, informações e visões de mundo como uma condição para a formação de subjetividades coletivas. Convido o leitor a entrar nesta dança da cidadania trazida por Carlos Costa. Trata-se de uma leitura fascinante e necessária nos dias atuais para reposicionar o protagonismo histórico no nosso país.

SCORTECCI EDITORA , SP, 2005

INTRODUÇÃO

A Constituição de 1988 consagrou a cidadania como um dos fundamentos da República Federativa do Brasil Contudo, a amplitude do conceito permite discussões variadas: cidadania ativa, cidadania regulada ou “estadania”, cidadania urbana, cidadania rural dos trabalhadores etc.

“A CIDADANIA COMO FATOR DE RESGATE SOCIAL” é um livro que tenta responder uma questão aparentemente simples: como recuperar e reinserir na sociedade jovem em situação de risco social, fazendo uso de temas transversais da educação?

Durante sete anos, o assistente social Carlos Costa coordenou no interior do SEST/SENAT o desenvolvimento do Projeto “Serviço Civil Voluntário”, do Governo Federal e, durante três anos pesquisou e registrou com 700 jovens excluídos (negros, índios, homossexuais, apenados da Justiça, jovens prostituídos, jovens em baixa escolaridade e em risco social). Dos 700 jovens, 400 foram observados mais atentamente e lhes foram aplicados questionários a fim de mensurar através das respostas, como estavam se inserindo e como estavam mudando seus pensamentos sobre eles próprios e à coletividade.

Durante esse tempo, foram desenvolvidas e aplicadas várias atividades como as de saúde, esporte, teatro e lazer aos excluídos e, também, lhes eram fornecidos lanches a todos.

Autor é formado em Jornalismo e Serviço Social pela Universidade Federal do Amazonas, e se dedica há vários ao trabalho de recuperação de jovens em risco social, para quem também dava palestras motivacionais.

A Constituição Federal, em seu artigo 205, estabelece que a educação é a verdadeira base para a transformação social é um direito de todos e um dever do Estado, da família e da sociedade como um todo. E deve visar sempre o pleno desenvolvimento da pessoa humana, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho. Contudo, com o fim dos cursos técnicos profissionalizantes isso ficou quase impossível porque o jovem que termina o ensino fundamental, com pouca base, nem sempre passa no vestibular e volta-se para um mercado de trabalho que o rejeita em função da sua falta de qualificação para exercer qualquer tipo de trabalho. Ou seja, o Estado não faz o que deveria ser feito. O jovem não aprende como deveria aprender e é reprovado na fase em que ele mais precisa: aos 18 anos.

A pergunta que o autor se faz é: esse artigo da Constituição está sendo verdadeiramente cumprido? Como fazer cumprir o artigo da Constituição com jovens excluídos, verdadeiros “doutores” em conhecimentos que lhes tira o direito de saber sobre Educação, Moral e Cívica ou Organização Social e Política do Brasil, matérias já extintas pelo Governo Federal, mas não substituídas, apesar de a “transversalidade da educação” ser apregoada como responsável pelo “fechamento” dessa lacuna. Mas isso não ocorre.

O processo de construção da cidadania, embora muito antigo, não tem fim e não se completa nunca porque, como afirma o professor Marco Aurélio Nogueira “onde quer que seja, existirão sempre homens e mulheres, grupos e indivíduos singulares, minorias e estratos particulares submetidos a algum tipo de humilhação, degradação, injustiça e opressão.”

A educação responsável e comprometida com as questões sociais do Brasil, contudo, pode ser o caminho mais curto para o fim da injustiça e da opressão, e a porta aberta para a construção de uma verdadeira cidadania.

CAPÍTULO I

INTRODUÇÃO

1. A CIDADAIA AO LONGO DA HISTÓRIA

1.1. GRÉGIA, O BERÇO DA CIDADANIA

1.2. A CIDADANIA NO DIREITO ROMANO

1.3. INGLATERRA: 1215/1699

1.4. FRANÇA: 1789

1.5. BRASIL: 1988

2. CAPITULO II

2.1. A CIDADANIA E A TRANSVERSALIDADE NA EDUCAÇÃO

2.2. A CIDADANIA E OS PARÂMETROS CURRICULARES NACIONAIS

2.3. A CIDADANIA EDUCACIONAL

2.4. A CIDADANIA E A EDUCAÇÃO EM MANAUS

3. CAPÍTULO III

3.1 O SERVIÇO CIVIL VOLUNTÁRIO

3.2. O RITO DE PASSAGEM

3.3. O SEST/SENAT: ENTIDADES EXECUTORAS

4. CAPÍTULO IV

4.1. A CIDADANIA, NA VISÃO DOS JOVENS DO SCV

4.2. DEPOIMENTOS DOS JOVENS

CONCLUSÃO

BIBLIOGRAFIA

INTRODUÇÃO

Destinados a jovem a partir de 18 anos, dispensado do Serviço Militar, o Serviço Civil Obrigatório, implantado deforma experimental no Rio de Janeiro (1988/89), pela Comissão Nacional do Serviço Civil (CONASC) do Ministério da Justiça, tinha por prioridade “a preparação do(a) jovem para o trabalho e para a cidadania, entendida como participação social solidária em uma unidade democrática”.

O Governo Federal considera o SCV uma atividade cívica de caráter estratégico para o Brasil e coloca os jovens envolvidos em suas ações como agentes de cidadania, pois a formação teórica e prática é voltada para o exercício da cidadania, entendida como direito e como responsabilidade.

O Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE indica existirem 3,2 milhões na faixa etária dos 18 anos no Brasil, e cerca de metade deles é do sexo masculino. Desses, somente 10% são selecionados para o Serviço Militar, a cada ano. Diante disso, o Governo Federal considera que exista um universo de três milhões de jovens, de ambos os sexos, alvo do SCV.

O público alvo do SCV é definido pelo Governo Federal: são rapazes e moças até 18 anos completos ou a completar no ano de execução do Projeto. No caso dos homens, os excedentes do Exército que não trabalhem, não estudem, tenham uma escolaridade inferior à 8ª série do Ensino Fundamental e vivam em situação de pobreza crítica.

Segundo a obra “Desafios da Educação – Brasil 500 anos”, da pesquisadora Regina Sader, o Brasil conta hoje com mais de 17 milhões de analfabetos, ou seja, mais de 18% da população de 14 anos. Estima-se que hoje esse número já chegue hoje a 23 milhões, o que representa 14% da população que se acredita ser de 180 milhões de brasileiros.

Estatísticas do IBGE e do Fundo das Nações Unidas para o Desenvolvimento da Infância – UNICEF indicavam que a evasão escolar e a de repetência escolar no ano de 1979 haviam crescido para cerca de 20% no Ensino Fundamental, caindo para 14% no ano de 1985. Essa estatística, embora apresentando decréscimo em 10% em seis anos, ainda é um dado a preocupante.

No ano de 1982, o Ministério da Educação divulgou um relatório revelando outros dados também preocupantes:

1. Dos alunos matriculados na primeira série do Ensino Fundamental, apenas 20% concluíram o curso sem repeti-lo, ou seja, 79,8% tiveram que repetir de série;

2. Em 1989, entre as famílias com renda de menos de um salário mínimo e meio, 72,7% matricularam seus filhos na Escola onde se conclui que a renda familiar é um fator decisivo na manutenção de crianças em sala de aula. Esse número sobe para 97% entre famílias com renda superior a dois salários mínimos;

3. O Brasil possui menos de 200 mil Escolas ministrando o Ensino Fundamental para a população em idade escolar de até 14 anos estimada em mais de 51 milhões. Dessas escolas, 45% estão localizadas no Nordeste;

4. O Ensino Médio é ministrado em pouco mais de 12 mil instituições, das quais 45% se concentram no Sudeste;

5. O Ensino Superior é ministrado em 873 entidades, das quais 75% são particulares, e concentram 60% de todos os alunos que buscam o Terceiro Grau. E a região Sudeste é a que apresenta o maior número de alunos matriculados, com 55,7% do total.

A cidade de Manaus, capital do Amazonas, segundo os números do Censo Educacional realizado nos anos de 2000/2001 pelo INEP – Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas, 160.848 alunos estavam matriculados no Ensino Fundamental de 1ª 4ª séries no primeiro ano da pesquisa, contra 168.272 alunos no ano seguinte. Das 160.848, 62.470 foram feitas na Rede Estadual de Ensino, 80.251 na Rede Municipal e 18.126 na rede privada. No ano seguinte, 64.361 matrículas foram feitas na rede estadual, 85.776 na rede municipal e 18.135 na rede privada.

No Ensino Fundamental de 5ª a 8ª Séries, esse número foi de 156.834 no primeiro ano da pesquisa contra 173,926 no ano seguinte, representando um aumento de 0,09% no número de matrículas. Em 2000 foram feitas 99.399 matrículas na Rede Estadual, 610 na Rede Federal, 41.581 na Rede Municipal e 15.244 na Rede Privada. No ano seguinte, a Rede Estadual absorveu 112.166 matrículas, 640 na Rede Federal, 46.075 na Rede Municipal e 15.045 na Rede Privada.

A Constituição de 1988 determina que 18% do total de impostos arrecadados pela União sejam aplicados em Educação, cabendo aos Estados e Municípios a aplicação de 25% de tudo o que arrecadam. O que a Constituição determina, porém, não é cumprido pela maioria dos governantes.

Diante desses fatos, como se pode pensar em cidadania, substantivo feminino que dizer “qualidade de cidadão?” Como compreender o “cidadão”, substantivo masculino que quer dizer “habitante da cidade, aquele que está no gozo de seus direitos civis e políticos de um Estado?” Como é possível interpretar “aquele que está no gozo dos direitos civis e políticos do Estado?”

O estadista inglês do século XVI, Thomas More, em Utopia, em grego lugar nenhum e o filósofo grego Platão, em A República, imaginaram um lugar onde todos seriam protegidos, teriam alimentação, vestuário, alojamento, tratamento médico, educação e onde ninguém trabalharia mais do que seis horas diárias, ou seja, teriam o pleno gozo dos direitos civis e políticos e a qualidade de cidadão. Os poetas Samuel Goleridge, D.H. Lawrence e Robert Southey também sonharam com uma sociedade ideal, uma vida perfeita, um lugar perfeito para viver. A realidade, contudo, nos mostra que esse sonho nos coloca diante de um homem na qualidade de cidadão, mas que ainda não se realizou em sua plenitude.

Resgatando a história, o professor de Direito Privado da Fundação Getúlio Vargas, Paulo Mendonça, citando Spengler afirma que na Idade Média já se dizia que o ar da cidade torna livre os homens e os gregos já relacionavam a liberdade de um povo ao fato de possuírem ou não uma ágora. A liberdade, aqui entendida como um exercício pleno dos direitos norteará este trabalho em todas as suas etapas porque se entende que sem a prerrogativa da liberdade é impossível se falar em cidadania e em resgate social.

Delimitou-se o século XVIII como o início do processo de análise da questão da cidadania porque foi a partir dele que se reformulou o entendimento das relações entre o Estado e os seus súditos, que passaram a chamar-se de cidadãos.

Naquele século, entendeu-se o Governo como algo decorrente da concordância dos governados. Esse marco histórico é delimitado pelas Revoluções Inglesa, Francesa e Americana.

A Revolução Inglesa limitou-se a arrolar alguns direitos próprios dos indivíduos; a Francesa apresentou uma inconfundível universalidade em suas declarações de direitos e a Americana colocou em sua única Constituição escrita em 1789, uma lista específica de garantias.

Dentro desses três marcos históricos, buscaremos compreender melhor a cidadania e a possibilidade de seu exercício ser utilizado na busca do resgate social, através do desenvolvimento do projeto Serviço Civil Voluntário.

1. CIDADANIA AO LONGO DA HISTÓRIA

1.1. GRÉCIA, O BERÇO DA CIDADANIA

A humanidade deve aos gregos o moderno conceito de democracia. A própria palavra “democracia”, que nasceu nas polis ou cidades-estados como Atenas ou Corinto, significa poder popular. A democracia praticada na Grécia era, porém, muito diferente da atual acepção da palavra. Como as cidades-estados eram muito pequenas para que todos os cidadãos tivessem um papel ativo nas assembléias, onde se decidia a política a adotar, poucos participavam dela. Sobre esse fato, assim comenta Mossé, em Cidade Atenas. A História da Democracia.

“Naturalmente, se pensarmos no plano dos princípio ao dos fatos, constataremos algumas distorções. Na verdade, o povo era soberano, mas esta soberania exercia-se dentro de certos limites. É indubitável que foi por essa época que se elaboraram as rigorosas normas relativas a ordem do dia e à prioridade das sessões da Assembléia; a maneira de se propor projetos de lei, e o procedimento para a sua discussão e aprovação”.

O filósofo ateniense Platão, em A República, advogou a monarquia constitucionalmente limitada como a melhor forma de governo para as cidades-estados.. Dizia o filósofo que a oligarquia, a democracia, a demagogia e a tirania, seguir-se-iam uma à outra e a única forma de quebrar o ciclo seria entregar o governo a reis filósofos.

A democracia grega, conhecida como o Governo do Povo, era limitada a cerca de 90% da população, formada por escravos, estrangeiros, mulheres e crianças que não tinham direitos políticos. Apesar disso, o princípio da democracia grega dizia que todos os cidadãos tinham os mesmos direitos perante as Leis. O período histórico conhecido como “séculos obscuros”, é pouco conhecido. Os registros mais aceitos desse período são os poemas épicos Ilíada e Odisséia de Homero.

A partir de cerca de 800 até 500 a.C., as Leis reformistas de Sólon (600 a.C.), em Atenas, expandiram a democracia dando aos cidadãos pobres, alguns direitos sobre o Governo da cidade. Os gregos prestavam obediência às suas próprias cidades, mas possuíam um sentimento de unidade nacional frente à ameaças externas, como o caso da invasão persa.

Clístenes (510 a.C.) assumiu o poder em Atenas para aprofundar as reformas sociais e introduzir o regime democrático na cidade. No século V a.C., Atenas atingiu seu apogeu político com Péricles, que aperfeiçoou a democracia, conferindo à Assembléia dos Cidadãos (Ecláesia) poderes para deliberar sobre os problemas políticos.

Historicamente, os governantes Sólon e Péricles são citados como os responsáveis pela conquista da democracia na Grécia. Contudo, Mossé (op.cit), afirma que “os atenienses somente adquiriram essa premência depois de uma lenta evolução, entremeada de violentas agitações”.

Péricles (495 A 429 a.C.), estadista ateniense e chefe do partido democrático que domina a vida política de 450 a.C. até sua morte, também um excelente orador, assim se manifesta, em discurso para o povo, sobre essa questão:

“Sabemos conciliar o gosto pelo belo com a simplicidade, e o gesto pelos estudos com a energia. Usamos a riqueza para a ação e não para uma vã ostentação de palavras. Entre nós, não é vergonhoso reconhecer a pobreza; é-o, bem mais, não tentar evitá-la. Os mesmos homens podem dedicar-se aos seus negócios particulares e aos do Estado; simples artesãos podem ter bastante compreensões de política. Não consideramos o homem ocioso, senão somente aquele que é inútil. É por conta própria que decidimos nossos negócios e fazemos os cálculos exatos. Para nós, não é a palavra que nociva à ação, mas o não se informar pela palavra antes de se lançar à ação”.

O Governo de Péricles deu a Atenas uma época de relativo equilíbrio social, o que gerou um sensível aumento da população da Ática, tanto por causas naturais como devido à relativa facilidade com que nos anos que se seguiram às reformas de Clístenes, estrangeiros puderam integrar-se ao corpo dos cidadãos. Mossé (idem) diz que para por fim a essa situação, Péricles, em 541 a.C. fez aprovar famoso decreto reservando a qualidade de cidadão ateniense aos nascidos de pai cidadão e de mãe, ela própria filha de cidadão (Op.Cit. p.50). Esse decreto tinha por objetivo limitar o número dos beneficiários das vantagens ligadas à qualidade de cidadão.

A democracia, herança dos atenienses à humanidade, que possibilitava a participação do povo na política, foi sendo aprimorada ao longo da história, ganhando outras formas. Foi à compreensão da palavra cidadania, que se dá participação plena e ativa do cidadão nos destinos de sua contribuição política à humanidade. Assim, conclui Claude Mossé:

(...) os atenienses, sobretudo durante os dois séculos em que exerceram a hegemonia do mundo Egeu, construíram uma civilização que hoje podemos considerar como uma civilização do homem (...) Os atenienses foram, primeiramente cidadãos, e é isso que faz a grandeza de Atenas. Pouco importa que esses cidadãos tenham constituído apenas uma pequena parcela – talvez um décimo da população da Ática (...) Fazer parte dela (a cidade) significava que estava disposto a garantir sua defesa, mas também que se pretendia participar dos frutos (...) A conduta apolítica era inconcebível porque significava a renúncia àquilo que era a própria essência do ateniense: o pertencer ao corpo político, à cidade(...), a civilização que há 2.500 anos nasceu na orla do mar Egeu soube, em menos de dois séculos, elaborar um pensamento crítico e político cujas ressonâncias têm seu lugar na história dos homens que farão o mundo de amanhã(op.cit.161,162).

O professor da Faculdade de Direito e Ciências Econômicas de Paris, Georgesn Bordeau, autor do tratado de ciência política mais importante publicado depois da segunda guerra mundial, em seu livro “Le Democracia”, é conclusivo quando afirma:

“La democacia es hoy uma filosofia, um modo de vivir, uma religión e, casi assoriamente, uma forma de cobierno”(Op.Cit. p. 19).

1.2. A CIDADANIA NO DIREITO ROMANO

Narram vários livros de história de Direito Romano, especialmente em MAGALHAES (1997) e MENDONÇA (1997) que a cidadania, enquanto conceito histórico foi um processo construído durante anos e anos e está inteiramente ligado ao papel que o Direito exerceu e continua exercendo dentro da sociedade. Os primeiros registros de cidadania foram feitos em Roma, quando os direitos públicos e privados só pertenciam aos cidadãos romanos, os quintas. Os estrangeiros, ou peregrini, não tinham a capacidade jurídica mais podiam adquirir propriedades e fazer testamentos pelos direitos deles. Os peregrini dediticci, ou inimigos vencidos, estavam privados do uso de seu direito de origem porque os romanos não lhes reconheciam a independência política. Eles se sujeitavam pura e exclusivamente às regras do ius gentium romano.

Esses estrangeiros, os latinos, vizinhos de Roma, tinham uma posição especial e gozavam dos mesmos direitos dos romanos. Eles tinham o direito de votar nos comícios (ius sufragii) quando se encontravam m Roma e podiam comerciar e contrair matrimônio: ius commercii e ius conubii. Com a extensão da cidadania romana a toda a Itália, em 89 a.C., essa categoria de latinos deixou de existir. Como uma segunda categoria de latinos aparece, a dos latini coloniarii, que eram os das colônias fundadas por Roma e às quais fora dado o ius Latti, estes gozavam da capacidade de ter direitos privados (ius commercii e ius canubii), mas os públicos (ius suffragii e ius honorum). Essa categoria também desapareceu com a extensão da cidadania a todos os habitantes livres do império, por Caracalla, em 212 d.C. (constutio Antoniniana). Uma terceira categoria dos latinos passou a existir desde a lei Junia Norbana (19 d.C) e sobreviveu às demais.

Escravos alforriados pelos modos pretorianos ou mesmo contra as disposições restritivas das leis de Augusto, adquiriram a posição de latinos e não de cidadãos romanos. Sua capacidade jurídica de gozo era mais restrita do que dos pertencentes às outras categorias de latinos. Só tinham, os latini Juniani, e os ius commercii inter vivos, o direito de serem sujeitos de relações patrimoniais entre vivos. Não podiam eles, pois, casar pelo ius civile, nem fazer testamento ou herdar. Diz-se que “viviam como livres, mas morreriam como escravos”(Salvianus, adv.avar 3.7). Por falecimento dos latinus Junianus, seu patrimônio era devolvido ao patrono, iure peculi, isto é, não a título de sucessão, mas como devolução próprio dono.

A cidadania romana era adquirida por nascimento de justas núpcias ou mesmo fora delas, se a mãe fosse cidadã no momento do parto. Os filho nascidos do matrimônio, se um dos cônjuges fosse estrangeiro, seguiam-se às condições de estrangeiro, de acordo com a Lei Minicia (Gai. 1.78). Adquiria-se a cidadania romana também pelos comícios por determinação dos magistrados e, mais tarde, pelos imperadores. A concessão podia ser feita a estrangeiro, quer em caráter individual, quer como medida de ordem geral como ocorreu com a extensão à toda a Itália em 89.a.C., e todos a todos os habitantes livres do império, em 212 d.C.

O cidadão romano, desde que preenchesse também o requisito de independência do poder familiar, tinha a plena capacidade jurídica do gozo. Assim, ele podia ter totalidade dos direitos públicos e privados e as obrigações respectivas. Porém, perdia-se a cidadania pela liberdade, pelo exílio, pela deportação ou pela renúncia.

O direito romano definia o homem como livre ou escravo.

Os escravos não tinham direitos e nem possuíam relações familiares. A escravidão era um instituto reconhecido por todos os povos da Antiguidade e sua origem vem da guerra: os inimigos capturados passavam a ser escravos dos vencedores. Eram considerados escravos, também, todos os estrangeiros que pertencessem a um país que fosse reconhecido por Roma, ainda que não estivesse em estado de guerra. O mesmo se dava com o romano que caísse nas mãos do inimigo. Mas o cidadão romano que se tornava prisioneiro de guerra do inimigo, ao voltar à pátria, recuperava automaticamente a liberdade e todos os direitos de cidadania que tinha antes de ser capturado. Isso se chamava de iuspostiliminii.

O escravo – afirmam vários autores - , não podia ser sujeito de direitos, por lhe faltar a capacidade jurídica do gozo. Não podia, também, ter direitos privados ou público. Sua união conjugal (conturbernium) não era “casamento” no sentido jurídico romano. Afirmam os estudiosos do assunto, que assim não haveria entre o escravo, a mulher e os filhos uma relação de parentesco, para fins de sucessão e outros. O escravo não podia ter patrimônio e tudo que viesse a adquirir pertenceria ao seu dono. Este detinha sobre o escravo, tão amplos poderes como sobre todos os demais de sua propriedade, podendo até aliená-los ou matá-los.

Mesmo assim, a condição humana do escravo – comentam os estudiosos do assunto – se destinguia de outras coisas do patrimônio do dono. O direito romano sempre reconheceu a personalidade humana do escravo (persona servilis). Ele também participava, desde a origem, do culto religioso da família. Seu túmulo era lugar sagrado à semelhança dos livres. Matar um escravo era crime, a que, já na República, correspondia a pena pública de homicídio, pela Lex Cornelia de sicariis. No período imperial, o dono foi proibido de seviciar o escravo. Estes podiam impetrar a proteção junto aos magistrados. Do ponto de vista patrimonial – afirmam os estudiosos do assunto -, verificou-se também uma evolução ao escravo. Já na República - concluem, o escravo podia possuir um pequeno pecúlio, cedido pelo seu dono, que ele geriria livremente.

Legalmente o pecúlio continuava a pertencer ao dono, mas era movimentada pelo escravo livremente como se fosse dele.

Afirmam, ainda, os estudiosos da matéria: os escravos libertos se chamavam libertos (libertinas ou libertas), mesmo assim seus direitos públicos continuavam limitados. No campo do Direito Privado, ainda encontrava-se sob o patronato do ex-dono. O patronato implicava uma relação de interdependência entre o ex-dono, patrono, e o ex-escravo, alforriado, liberto e até uma espécie de sujeição deste àquele. Do patronato – garantem esses mesmos autores da matéria -, decorriam direitos e obrigações recíprocas, mas sempre equivalentes entre as duas partes. Essa relação de patronato subsistiria enquanto o liberto vivesse não se transmitindo, porém, aos seus herdeiros. Por parte do patrono – garantem os estudiosos Bordeau, Gama, Magalhães, Mossé e outros – a relação passava aos filhos, no caso de o escravo morrer antes do liberto.

Quanto ao conteúdo do patronato, incluía a ele o dever recíproco de prestar alimentos no caso de necessidade. O liberto passava a ter o nome do patrono e devia a ele respeito e reverência contínua (obsequium). Por isso, era-lhe proibido intentar ações criminais ou infamantes contra o patrono. E a propositura de qualquer outra ação contra ele, exigia a autorização prévia do magistrado.

Finalmente, além de o escravo liberto ainda continuar devendo certos favores ou seu patrono (operae), o patrono tinha o direito de uma sucessão legítima sobre os bens do liberto, visto que o liberto não tinha legalmente nem ascendentes e nem parentes colaterais. O pretor garantia ao patrono a metade da herança do liberto se morresse sem deixar filhos ou herdeiros.

Com o favor imperial chamado natalium resitiuo, cessava totalmente os direitos do patrono e a que o liberto adquiriu, retroativamente, a posição de ingênuo, pessoa nascida livre, que nunca fora escrava. O ius aurei anuli, era outro favor também conferido pelo imperador romano pelo qual se eliminavam as restrições político-sociais impostas aos libertos, como as de não poderem ser magistrados, não poderem ser nomeados senadores, não poderem servir as legiões do exército. Do ponto de vista dos direitos privados – observam alguns autores, o ius aurei anuli eliminava, também, o impedimento matrimonial entre o liberto e uma pessoa de classe senatorial, mas não extinguia os direitos do patronato. Com ele, o liberto passava a ser um quase ingênuo, afirmam os estudiosos do assunto.

Ficavam livres por lei, a título de punição do dono (idictum Claudii), os escravos velhos e doentes. A título de recompensa, o escravo que delatasse o assassino de seu amo recebia uma Senatusconsultum Silanium.

1.3. INGLATERRA: 1215/1699

A Magna Carta da Inglaterra de 1215, assinada pelo rei João, sob a ameaça de uma guerra civil, também conhecida como a “Grande Carta da Liberdade Inglesa”, é considerada a primeira declaração de direitos fundamentais da figura humana registrada na história. Devido a omissões e alterações, foi reestruturada em 1216 e 1217 e finalmente em 11 de fevereiro de 1225 recebeu formas definitivas das mãos do Rei Henrique III, após ter sido reconhecido como Rei pelo Papa Latrão IV.

A Carta Magna garantia liberdade e diretos à Igreja, dizia que o homem livre não poderia ser punido com uma grande pena por um pequeno delito, não poderia ser detido, encarcerado, desapossado de seus bens, colocado fora da lei ou molestado, senão em virtude de um julgamento legal, por seus pares. Constava na carta que “não venderemos, nem recusaremos, nem diferenciamos o direito e a justiça etc. Os barões elegeram 25 dos seus membros ‘para guardião da Carta’, segundo descreveu o desembargador Antônio José M. Feu Rosa, do Tribunal de Justiça do Espírito Santo in artigo publicado na revista jurídica Consulex.

Em seguida, ainda na Inglaterra, vieram o Habeas Copus Act, em 1679, e a Bill of Rights, de 1688. Pela Carta Magna, todo cidadão inglês passou a ter direito de ser confrontado com as testemunhas de acusação, de arrolar testemunhas em sua defesa e de ser assistido por um advogado para sua defesa.

Os princípios liberais esboçados no século XVII presentes na Revolução Inglesa de 1688, aboliu os abusos do poder real e definiu com clareza as relações entre o monarca e os representantes do povo; reformularam o entendimento das relações entre o Estado e os seus súditos, que passaram a chamarem-se cidadãos, desde que se entendeu o governo como algo decorrente da concordância dos governados. Os cidadãos passaram a ser todos os habitantes da cidade que estavam em gozo de seus direitos civis e políticos.

Segundo afirma o desembargador Feu Rosa, há sempre um processo de evolucionista em defesa da liberdade, propriedade privada, segurança, direito de resistência contra os abusos do Estado e liberdade de consciência e de religião. “A partir da origem inglesa, os direitos humanos receberam concepção mais ampla e finalmente se consolidaram nos Estados Unidos, quando a Constituição Federal de 17 de setembro de 1787, com suas primeiras emendas, abriu o caminho, logo seguida pelas Constituições de Virgínia e Pensilvânia e várias outras”, conclui o autor.

Os cidadãos passaram a se fazer presentes nos assuntos do Estado e com a Guerra Civil norte-americana de Independência, que inovou a estrutura do Estado, criando o federalismo e o presidencialismo, e na França, onde as discussões eram em torno do racionalismo político para definir os fundamentos da obediência, da legitimidade do poder e da reformulação da sociedade, segundo um esquema não feudal, conforme afirmam Saldanha e Gama em suas obras.

Saldanha informa que a origem das cidades, nas diversas civilizações, se deu com o rompimento com o estágio rural, possibilitando o surgimento do termo cidadania, ou “qualidade de cidadão”. Para Saldanha, com o surgimento da cidade é possível ver “(...)o advento de uma mentalidade urbana como condicionadora de novas estruturas, em economia e em direito, em religião, em ética e em estética” (idem, p. 72).

A Revolução Inglesa limitou-se a arrolar alguns direitos próprios dos indivíduos e do parlamento. A Constituição americana (1787), por sua vez, listou as garantias. Com a Revolução Francesa (1789), que proclamou os direitos individuais e as liberdades públicas, a cidadania ganhou uma maior dimensão e um caráter de universalidade.

Historicamente, pode-se afirmar que o entendimento objetivo do termo cidadania firma-se no século XVII. Contudo, registros feitos pelo professor Marcelo Saldanha da Gama in Educação na Grécia Antiga, mostra que já no século VIII a.C., na Grécia Antiga, há registros de direitos de cidadania entre determinadas classes. Em Esparta, Gama informa que os Dórios gozavam de direitos de cidadania, em Atenas, o povo participava diretamente do Governo por meio de grandes assembléias.

Ele acrescenta:

“O povo ateninse adorou uma nova constituição no sentido democrático que assegurava a todos os homens livres o direito de participação na vida pública, ao contrário do que acontecia com a lei antiga que só concedia o direito de cidadania a alguns indivíduos privilegiados”(Ibidem, p. 17),

As revoluções liberais do século XVII, portanto, recolocaram as relações entre o indivíduo e o Estado de forma mais objetiva. Reformando o estatuto das funções estatais, essas revoluções permitiram a construção do Direito Constitucional moderno e o surgimento, mais tarde, do Estatuto Social e Democrático, que se firmou nas constituições do México (1917( e da Alemanha (1919), que ampliaram os direitos fundamentais do homem e acrescentaram ao núcleo desses direitos no Estado liberal novos direitos sociais, econômicos e culturais. A Constituição (1988) do Brasil contempla esses como “os direitos sociais”.

Magalhães afirma que a questão dos “direitos sociais” não pode ser entendida como “mera ampliação de direitos e garantias”, porque o

“O Estado nesse sentido, interviria na economia quando necessário, para fazer correções e assistiria aos necessitados nos momentos de crise econômica (...) Na verdade, os direitos sociais são verdadeiras garantias socioeconômicas dos direitos individuais e políticos (...) As garantias socioeconômicas são meios de que o indivíduo deve dispor em uma sociedade (...) para poder ser livre” (Idem. pág. 101).

Liberdade, ser livre plenamente, é o pressuposto maior para que o homem possa exercer sua cidadania. Sem o estatuto da liberdade, sem a garantia dos direitos individuais, sem uma liberdade política e sem democracia, torna-se impossível falar em cidadania, citoyennete, palavra de origem francesa que define a palavra cidadania, porque, segundo Bobbio, citando Ordonis, deveria ser a função primordial do Estado o direito de

“promover condições para a igualdade e liberdade (...) removendo obstáculos que impedissem a plenitude do exercício desses direitos e facilitasse a participação dos cidadãos na vida política, econômica e cultural de um país”(Idem, p. 102

1.4. FRANÇA: 1788

DECLARAÇÃO UNIVERSAL DOS DIREITOS DO HOMEM E DO CIDADÃO

A Revolução Francesa (1788), resultado de um conjunto de conflitos e de convergências marcada por uma série de lutas distintas, unificadas por alguns elementos comuns, aprofundou as discussões sobre a questão do cidadão e proclamou a Declaração Universal dos Direitos do Homem e do Cidadão que considerava como direitos fundamentais mais importantes à propriedade privada, a segurança e o direito à resistência contra os abusos do Estado.

O preâmbulo da Declaração, assim se coloca:

“Os representantes do povo francês, constituídos em Assembléia Nacional, considerando que a ignorância, o esquecimento ou o desprezo dos direitos do homem são as únicas causas da infelicidade do povo e da corrupção dos Governos, resolvem expor, em uma Declaração solene, os direitos naturais, inalienáveis e sagrados do homem; a fim de que esta declaração, constantemente presente em todos os membros do corpo social, lhes lembre incessantemente seus direitos e seus deveres; a fim de que os atos do poder legislativo e do poder executivo, possam ser a todo momento comparados com o objetivo de qualquer instituição política, sejam mais respeitados; a fim de que as reclamações cidadãos, fundadas doravante sobre princípios simples e incontestáveis, resultem sempre na manutenção da Constituição e na felicidade de todos. Em conseqüência, a Assembléia Nacional reconhece e declara, em presença e sob os auspícios do Ser Supremo, os seguintes direitos do homem e do cidadão”.

Os acontecimentos revolucionários registrados na França, uma das grandes potências mundiais naquela época, ao lado da Império Austro-Húngaro, Inglaterra e Rússia, repercutiram em todo o mundo e os princípios anunciados, com somente 17 artigos, foram logo incorporados às Constituições de quase todos os países e povos.

A limitação dos poderes do Estado, igualdade ante a lei, liberdade pessoal, inviolabilidade do domicílio, direito ao juiz legal, proibição de Tribunal de exceção, inviolabilidade da propriedade privada, liberdade de religião, sigilo da correspondência, livre manifestação de opiniões, liberdade de reunião e muitas outras manifestações de direitos marcaram profundamente a vida do cidadão, desde 1789.

A relação entre o Estado e seus governados deixou de ser abusiva e passou a ser de cidadania, com direitos e deveres claros.

As Constituições da Alemanha (1748) e do México (1917) e, sobretudo, Constituição de Weimer (11.08. 1919), que criou o Estado Federal, seguindo os mesmos princípios franceses, criaram o “Estatuto Social e Democrático de Direito”, ampliando os direitos fundamentais e acrescentando ao núcleo desses direitos no Estado liberal novos direitos sociais, econômicos e culturais.

1.5. BRASIL

1988 – A CONSTITUIÇÃO CIDADÃ

Depois de quase três décadas de regime militar, com Atos Institucionais e outras ações contra os direitos individuais do cidadão, em 1988 o Brasil ganhou uma nova Constituição, chamada de a Constituição Cidadã presidente da Câmara dos Deputados, Ulysses Guimarães, por incorporar em seu bojo direitos socioeconômicos para o povo.

O professor de Teoria Geral do Direito Constitucional, José Luiz Quadros Magalhães, em sua obra “Teoria Geral do Direito Constitucional (1997), diz que a Constituição do Brasil estabeleceu um novo conceito de indivíduo, que ultrapassa o conceito liberal, segundo ele,

“...é um indivíduo portador de todos os direitos que possam permitir a sua completa integração à sociedade em que vive. É o indivíduo que não tem apenas o direito à sobrevivência à vida biológica, mas o direito à vida com dignidade, com trabalho e justa remuneração (...) Não há liberdade política sem democracia econômica e social (...)Um pressupõe outro necessariamente”(Op.Cit. p. 101).

O professor Jaime Ordoñes, em seu livro “Direchos Fundamentales y Consticion (1988) ressalta que o trabalho do Estado não se limita à tarefa de tutelar direitos fundamentais para estes sejam efetivados. Citando Norberto Bobbio, ressalta a necessidade de que ocorra a função primordial do direito,

“onde, através de medidas positivas, se buscaria promover condições para que a liberdade e a igualdade fossem efetivas, removendo obstáculos que impedissem a plenitude do exercício desses direitos e facilitasse a participação dos cidadãos na vida política econômica e cultural de um país (Op.Cit. p. 98).

No Brasil pós-Constituição Cidadã, a democracia participativa é uma realidade, permitindo o exercício diário da cidadania, enquanto idéia de participação dos indivíduos na construção do seu futuro. Considerando a indivisibilidade dos direitos humanos, a democracia social dá ao cidadão o direito de construir o seu próprio modelo de democracia social e econômica. O direito à cidadania é uma realidade constitucional, mas precisa ser exercitado através da livre formação de consciência política, filosófica e religiosa, ou seja, como diz Magalhães (op.cit. 107), através

“...de uma democracia política participativa, na qual o indivíduo tenha voz, fala e comunicação. Isso implica que, para ter voz o indivíduo precisa de canais constitucionais para ser ouvido (...) Para ter fala, o indivíduo deverá ter discurso (...) que pressupõe, por sua vez, a educação. O direito à educação passa a ser direito democrático, sem o qual a democracia se inviabiliza. Finalmente, a comunicação, que é fundamental no processo democrático”(pag. 107).

De acordo com o pensamento de Magalhães, muitos direitos não são conferidos ao indivíduo como ser humano que vive no Estado, mas ao cidadão, àquele que participa da vida do Estado. Fica claro, portanto, que a questão da cidadania não é apenas a conquista desses direitos dentro do Estado, mas seu exercício pleno em busca desses direitos já garantidos. Como exemplo, o direito de petição e os direitos políticos, bem como o direito de voto, não cabem todos, indistintamente, mas apenas e tão-somente aos cidadãos.

2. A CIDADANIA E A TRANSVERALIDADE NA EDUCAÇÃO

2.1. A CIDADANIA E OS PARÂMETROS CURRICULARES NACIONAIS

De acordo com os Parâmetros Curriculares Nacionais, faz-se necessário “compreender a cidadania como participação social e política, assim como exercício de direitos e deveres políticos, civis e sociais adotando, no dia-a-dia, atitudes de solidariedade, cooperação e repúdio às injustiças, respeitando o outro e exigindo para si mesmo respeito”. O primeiro objetivo dos parâmetros curriculares nacionais representa a essência dos ensinamentos do Projeto Serviço Civil Voluntário – SCV, que busca na educação e participação comunitária um referencial de cidadania para os jovens em risco social.

O Ministério da Educação e do Desporto afirma que o papel fundamental da educação no desenvolvimento das pessoas e das sociedades amplia-e ainda mais no despertar do novo milênio e aponta para a necessidade de construir uma escola voltada para a formação de cidadãos.

Os Temas Transversais – Ética, Maio Ambiente, Pluralidade Cultural, Saúde, Orientação Sexual, Trabalho e Consumo – estão presentes na proposta de desenvolvimento das ações do Projeto SCV. A forma de desenvolvê-los, elegendo as questões locais e objetivas como prioridades e evidenciando a realidade da comunidade envolvida nas ações, é fator preponderante para o sucesso das atividades, permitindo que “os alunos possam desenvolver a capacidade de se posicionar ante as questões que interferem na vida coletiva, superar a indiferença e intervir de forma responsável”, como bem define a finalidade dos Temas Transversais.

Discutir questões sociais na perspectiva da cidadania exige que o educador esteja integrado à realidade da comunidade em que atua e, ao mesmo tempo, seja um crítico dessa mesma realidade, permitindo aos alunos a construção de uma sociedade plena, reconhecendo seus direitos e seus deveres e se vendo como um sujeito ativo do processo de mudanças. A formação histórica do professor no Brasil, contudo, se distancia muito da realidade social, fazendo com que

“(...) de acordo com as tendências predominantes em cada época, essa formação voltou-se para a concepção de neutralidade do conhecimento e do trabalho educativo”

como afirma os princípios dos Parâmetros Curriculares da Educação.

O Ministério da Educação e do Desporto admite a falha no processo de formação o professor voltado para o ensino da cidadania. Mas entende que é

“possível afirmar que o debate sobre as questões sociais e a eleição conjunta e refletida dos princípios e valores, assim como da formulação e implementação do projeto educativo já iniciem um processo de mudança”(p.32).

Embora se sabendo que a Escola não é o único lugar de reprodução de relações de trabalho alienadas e alienantes, também se sabe que é preciso investir mais na formação e qualificação do professor, a fim de dar a ele um conhecimento mais profundo sobre as questões sociais, como define Marilda Iamamoto, em seu livro “Questões Sociais no Brasil (1982), garantindo que as questões sociais datam desde 1929, com o processo de industrialização iniciado no Governo Getúlio Vargas.

2.2. CIDADANIA EDUCACIONAL

DIREITO DE TODOS E UM DEVER DO ESTADO

A Constituição da República Federativa do Brasil (1988) destaca objetivamente os direitos civis e políticos dos cidadãos, dentro da estrutura e fundamentos do Estado e explicita claramente que os poderes Executivo, Legislativo e Judiciário existem para garantir os direitos sociais e individuais. De acordo com o art. 1º da Constituição, a soberania, a cidadania, a dignidade da pessoa humana, os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa e o pluralismo são os fundamentos do Estado Democrático de Direito.

Um dos direitos garantidos pela Constituição é o da educação, princípio fundamental do exercício pleno da cidadania. De acordo com seu artigo 205º “a educação, direito de todos e dever do Estado e da família, será promovida e incentivada com a colaboração da sociedade, visando o pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho”.

O Artigo 208º da CF complementa, ainda que “é dever do Estado a Educação e será efetivada mediante a garantia de I – Ensino Fundamental obrigatório e gratuito para todos os que a ele não tiverem acesso na idade própria; II – progressiva universalização do Ensino Médio gratuito; III – atendimento educacional especializado aos portadores de deficiência, preferencialmente na rede regular de ensino; IV – atendimento em creche e pré-escola às crianças de zero a seis anos de idade; V – acesso ais níveis mais elevados do ensino, da pesquisa e da criação artística, segundo a capacidade de cada um; VI- oferta de ensino noturno regular, adequando às condições do educando; VII – atendimento ao educando, no Ensino Fundamental, através de programas suplementares de material didático-escolar, transporte, alimentação e assistência à saúde.

A construção de uma sociedade livre, justa e solidária, garantindo o desenvolvimento nacional, erradicando a pobreza e a marginalização, reduzindo as desigualdades sociais e regionais, promovendo o bem-estar de todos, sem preconceitos de ordem, raça, sexo, idade ou qualquer outra forma de discriminação, também são objetivos da República Federativa do Brasil, segundo o artigo 3º da Constituição.

Claramente colocados no texto constitucional, os fundamentos que norteiam os princípios da cidadania são direitos desconhecidos por uma grande parcela da população, principalmente para os que não possuem qualquer tipo de acesso aos meios de comunicação informativos. O próprio Ministério da Educação, no texto introdutório aos Parâmetros Curriculares Nacionais – Temas Transversais, admite essa verdade ao afirmar que

“(...) longe de serem expressão de realidade vigentes, correspondem muito mais a metas (...) Sabe-se da distância entre as formulações legais e sua aplicação; e a prática dos direitos por parte dos cidadãos. O fundamento da sociedade democrática é a constituição e o reconhecimento de sujeitos de direito”(Op.Cit. p. 19).

As mais diversas sociedades, ao longo de suas histórias, têm se procurado dar uma definição própria para a questão de quem tem direito e tem deveres. Essa construção, social e histórica sempre recebeu respostas contraditórias, dependendo do momento histórico da relação entre a sociedade e o Estado, que pode ser marcado por lutas, rupturas, descontinuidades, avanços e recuos. As lutas sociais, em todas as fazes a história, têm sido as responsáveis pela ampliação dos direitos civis, políticos, sociais e culturais.

Historicamente, direitos humanos e liberdades fundamentais – consequentemente, cidadania, foram considerados como direitos individuais próprios de cada um, e não direitos da coletividade. Juristas e outros estudiosos têm se posicionado, contudo, de forma contrária a esse entendimento. Eles entendem que estes são direitos coletivos, próprios dos cidadãos. Dentro desse entendimento, está enquadrada a educação que, ao promover debates transversais, abordando os principais problemas da sociedade, fará com que a cidadania seja compreendida pelos alunos, a partir de um

“(...) produto de histórias sociais protagonizadas pelos grupos sociais, sendo nesse processo, constituída por diferentes tipos de direitos e instituições. O debate sobre questão da cidadania é hoje diretamente relacionado com discussão sobre o significado e o conteúdo da democracia, sobre as perspectivas e possibilidades de construção de uma sociedade democrática”

conforme consta em texto do Ministério da Educação, na apresentação dos temas transversais dos Parâmetros Curriculares da Educação Nacional. E texto completa ainda que só se deva falar de cidadania com democracia.

A contraditória sociedade brasileira, construída por diferentes grupos sociais e raças, plural e polissêmica, resultado de um processo histórico, possui diferentes pontos de vista e projetos políticos, permitindo compreender porque seus limites também são contraditórios. O Ministério da Educação, ao admitir essa realidade social, elegeu a cidadania como eixo da educação escolar, colocando-se contra valores e práticas sociais que desrespeitem aqueles princípios, comprometendo-se com as perspectivas e decisões que os favoreçam, e admitindo que a educação para a cidadania requeira que questões sociais sejam apresentadas, discutidas, compreendidas e transformadas em ações práticas em busca da superação.

2.3. CIDADANIA E A EDUCAÇÃO, EM MANAUS

O Estado do Amazonas, segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE – para definição da População Economicamente Ativa – PEA, do ano 2000, conta atualmente com uma população de 2.389.279 habitantes, e com uma taxa de crescimento urbano em torno de 2,78%. A cidade de Manaus, que concentra a maior população, possui aproximadamente 1.7 milhões de habitantes. A Secretaria de Estado da Educação e Qualidade de Ensino, do Governo do Estado, possui cerca de 16 escolas que oferecem o Ensino Fundamental. Entre matrículas nas Redes Estadual e Municipal de Ensino, em 2001, estão sendo atendidos 384.198 alunos nas oito séries do Ensino Fundamental, de acordo com dados do Departamento de Estatística da Secretaria de Educação.

O censo de 1999 do INEP – Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas, a cidade de Manaus apurou que naquele ano existiam 160.848 alunos matriculados no Ensino Fundamental de 1ª a 4ª séries. Desse total, 62.470 matrículas foram feitas na Rede Estadual de Ensino; 80.251 na Rede Municipal e 18.126 na rede privada. No ano seguinte, o número de matrículas em todas as redes subiu para um total de 168.272 alunos.

No Ensino Fundamental de 5ª a 8ª séries, esse número foi de 156.834 no ano de 1999 contra 173.916 no ano seguinte, representando um aumento de 0,09%, de um ano para o outro. Em 2000 foram feitas 99.399 matrículas na Rede Estadual, 610 na Rede Federal, 41.581 na Rede Municipal e 15.244 na Rede Privada. No ano seguinte, a Rede Estadual absorveu 112.166 matrículas, 640 foram feitas na Rede Federal, 46.075 na Rede Municipal e 15.045 na Rede Privada.

A pesquisadora (Op.Cit), Regina Sader, informa que o Brasil conta hoje com 17 milhões de analfabetos, ou seja, mais de 18% da população acima de 14 anos. Estima-se esse número já chegue a 23 milhões, o que representa 14% da população de 180 milhões de habitantes no Brasil.

No Estado do Amazonas, a Secretaria de Educação não possui dados atualizados sobre o analfabetismo e trabalha com dados coletados há mais de 10 anos.

Estatísticas do IBGE e do UNICEF indicavam que a evasão escolar e a repetência no Brasil, no ano de 1979 havia sido crescido para cerca de 24% no Ensino Fundamental, caindo para 14% nos anos seguintes. Essa estatística, embora apresentando um decréscimo de 10% em seis anos, ainda é um dado preocupante.

Os números da educação no Brasil, revelados em 1982 pelo Ministério da Educação, apresentam dados preocupantes. Dos alunos matriculados na primeira série do primeiro grau, apenas 20,2% concluíram o curso sem repeti-lo ao menos uma das séries, ou seja, 79,8% tiveram que repetir uma das séries.

Em 1989, entre as famílias com renda de menos de um salário mínimo e meio, 72,7% matricularam seus filhos na Escola. Este dado permite concluir que a renda familiar é um fator decisivo na manutenção de crianças em sala de aula porque entre as famílias com renda superior a dois salários mínimos, 97% matricularam seus filhos.

Os dados do Ministério da Educação informam, ainda, que no Brasil existem menos de 200 mil escolas, ministrando o Ensino Fundamental para uma população em idade escolar de até 14 anos, estimada em 51 milhões. Dessas escolas, 45% estão localizadas no Nordeste. De acordo ainda com a mesma fonte, o Ensino Médio é ministrado em pouco mais de 12 mil instituições, das quais 45% se concentram no Sudeste.

Um total de 873 entidades de Ensino Superior, das quais 75% são particulares, existem no Brasil. As entidades particulares concentram 60% de todos os alunos que buscam o Terceiro Grau. A Região Sudeste é a que apresenta o maior número de matriculados, com 55,7% do total de alunos.

3. O SERVIÇO CIVIL VOLUNTÁRIO, EM BUSCA DA CIDADANIA.

3.1 – UM RITO DE PASSAGEM

Reeducar, ressocializar e reintroduzir os menos nos seios de suas famílias e, principalmente, da sociedade, através da qualificação profissional, prestação de serviços comunitários e o retorno deles ao ensino regular, são as metas principais do SCV, criado no Governo Federal no âmbito do Programa Nacional de Direitos Humanos, em 1996, para atender a um universo de mulheres e homens de 18 anos, dispensados do serviço militar.

O Programa SCV tem por eixo a elevação da escolaridade ao nível do Ensino Fundamental, que é um direito constitucional, o desenvolvimento de valores de cidadania com participação e solidariedade, permitindo oportunidades concretas de trabalho e geração de renda.

Esses três eixos sociais encontram-se presentes também nos Parâmetros Curriculares da Educação Nacional, que se orientam pela dignidade da pessoa humana, igualdade de direitos, participação e co-responsabilidade pela vida social. A discussão de temas sociais nas escolas permite a tomada de decisões pela própria comunidade e o professor se apresenta como um agente de cidadania.

Concebido como um rito de passagem para a maioridade, o SCV é desenvolvido como um espaço singular para respeito à diversidade, a promoção da igualdade e o cultivo da cidadania, segundo informa o Ministério do Trabalho:

“O Programa deve praticar ações afirmativas ou discriminação positiva em matéria de gênero, raça, cor, necessidades especiais e outros fatores que geram exclusão social e do mercado de trabalho. Isso quer dizer que, quando mais vulnerável o/a jovem, mais sujeito/a à discriminação, maior a preferência de acesso ao SCV. Ou seja, o SCV deve facilitar e promover a inclusão de jovens que não passariam pelos filtros da seleção usual de qualificação profissional, públicas ou privadas (Op.Cit. p. 104/105 – Plano Nacional de Qualificação do Trabalhador – Brasília – abril/2001).

Os participantes do SCV são jovens selecionados em comunidades que apresentam alto risco social, indicado pela baixa renda per capita, baixo índice de escolaridade e elevados índices de violência. Os rapazes, excedentes do serviço militar, e as moças na faixa etária de até 28 anos completos ou a completar no ano da execução do SCV, com escolaridade inferior à 8ª série do Ensino Fundamental, estar fora do mercado de trabalho e da escola e viver em situação de pobreza crítica.

As vagas são divididas para que também beneficiem pessoas portadoras de necessidades especiais.

O desenvolvimento do SCV é estruturado através de cursos, treinamentos, seminários, oficinas, estágios e atividades práticas em torno de três eixos: elevação da escolaridade, qualificação profissional, direitos humanos/serviços comunitários. O Guia Planfor 2001, publicado pelo Ministério do Trabalho e Emprego, dentro do qual está inserido o SCV, diz:

“ a) ELEVAÇÃO DE ESCOLARIDADE:

• Deve ser entendida como formação, inclusive à distância, e orientação para prestação de exames supletivos do Ensino Fundamental, visando à obtenção do certificado conhecido pelo MEC (Ministério da Educação e Cultura);

• Tempo de dedicação a esses componentes, no SCV, deve ser utilizado para orientar e encaminhar o/a jovem a programas de ensino supletivo, preferencialmente modulares e / ou à distância, oferecidos pelo Estado, Município ou entidade como Sesi e Telecurso 2000, monitorar e apoiar e/a jovem no estudo de apostilas para prestar exames na época adequada;

• Não deve ser confundida nem substituídas pelas “habilidades básicas” dos programas de qualificação – embora possam reforçar e complementar os programas supletivos;

• Há grande flexibilidade nos esquemas de exames/certificação do Ensino Fundamental. Por isso, sua duração vai depender do nível atingido pela população alvo, podendo, inclusive, ultrapassar a realização do Programa;

• Indispensável buscar parcerias para sua realização, com os órgãos municipais, estaduais e o setor privado.

• B) DIREITOS HUMANOS/ SERVIÇOS COMUNITÁRIOS;

• os conteúdos de direitos humanos, cidadania e serviços comunitários devem ser planejadas com fluxo na realidade público-alvo local, adaptando os conteúdos definidos pelo Conselho Nacional de Assistência Social – CONASC;

• Os serviços serão prestados pelos jovens uma forma de aprendizado das diferentes habilidades, em preparação concreta para o exercício da cidadania e mundo do trabalho, inclusive na forma de estágios;

• Exigem concretização de parcerias com órgãos governamentais e não governamentais, incluindo empresas privadas;

• o tipo de serviço prestado deve ser definido segundo necessidades de cada comunidade, com a participação dos próprios jovens, sob a supervisão dos executores, de acordo com as diretrizes do CONASC;

• é expressamente vedada a utilização dos jovens como mão-de-obra “grátis” para serviços públicos ou privado.

• C) QUALIFICAÇÃO PROFISSIONAL:

• Significa preparação para oportunidades de trabalho e geração de renda existentes na comunidade, por meio do desenvolvimento de habilidades básicas, específicas e de gestão;

• os programas devem ser orientados pela demanda do mercado, ou seja, oportunidades efetivas de trabalho e geração de renda e nunca pela mera disponibilidade de curso nas entidades executoras;

• orientação e encaminhamento ao mercado de trabalho – na forma de estágios, associações, cooperativas, micro empreendedores e outras que se apresentem – devam ser vistas como etapa final e necessária de qualificação, de acordo com as diretrizes do PLANFOR;

• Na medida do possível, deve garantir aos / às jovens a comprovação de competências, conhecimentos e habilidades adquiridos, mediante certificados, atestados ou diplomas, que possam ser utilizados no mercado de trabalho e/ou como créditos no ensino técnico (op.cit. 105/106).

O guia PLANFOR?2001e acrescenta, ainda, que para viabilizar as atividades e conteúdos, o programa SCV deve ter duração total de pelos menos 600 horas, distribuídas ao longo de seis meses de sua duração garantindo, assim, 100 horas/aula de qualificação profissional, 200 horas para direitos humanos/cidadania e serviços comunitários e 300 horas para ações voltadas à elevação de escolaridade. Esse tempo exigido para a elevação da escolaridade e certificação do Ensino Fundamental depende das séries atingidas pelos alunos e da modalidade de ensino supletivo, ensino regular, ensino a distância etc.

Devido ao fato de ser um programa direcionado à jovens sob risco social, o SCV se apresenta de forma flexível e democrática em sua execução, permitindo eu as ações sejam desenvolvidas segundo os interesses e necessidades da comunidade e dos participantes.

Contudo, ele não pode fugir dos eixos principais de ações presenciais de qualificação profissional, formação em direitos humanos e cidadania, elevação de escolaridade e prestação de serviços, oportunidade em que os jovens desenvolvem atividades estabelecidas a partir de suas próprias vivências, sob a supervisão da entidade executora, em campanhas e atendimentos de interesse público, na comunidade, município ou Estado, conforme orienta o Guia Planfor, que lista uma série de ações que podem ser desenvolvidas, objetivando a participação dos jovens na prestação de serviços comunitários.

Durante a execução do SCV, o Ministério do Trabalho e Emprego determina um processo de monitoramento e de avaliação externa. O monitoramento se dá através de supervisão operacional contratada pelo próprio Ministério, com visitas técnicas às executoras e aos locais dos cursos. A avaliação externa aborda o SCV como estudo de caso, contemplando a eficiência e efetividade social.

Na avaliação da eficácia, são medidos os níveis ou grau de aproximação entre os projetos implantados e as diretrizes de focalização do público alvo, duração e conteúdos dos programas, entidades executoras, financiamento e custos, metas e outros aspectos, estabelecidos no termo de referência do SCV. Ao avaliar a eficiência, são medidos os resultados do SCV para os jovens, suas famílias e comunidades. A efetividade social é identificada pelo alcance do SCV como política pública voltada para a construção democrática de uma política para a juventude, orientada pela igualdade de oportunidades, fortalecimento da cidadania e direitos humanos.

carlos da costa
Enviado por carlos da costa em 25/10/2010
Reeditado em 25/10/2010
Código do texto: T2578048