Guerra Civil

"Eu vivo sem saber , até quando estou vivo.

Sem saber, o calibre do perigo!

Eu não sei, de onde vem o tiro."

E a canção segue perguntando:

quais lugares você nunca iria,

caminhos em que nunca passaria.

E numa das estrofes, resume muito bem a banalidade com que a vida e a segurança das pessoas são tratadas: "a vida se encerra, numa nota de obituários de um jornal"

Hebert Viana, foi magistral na letra desta música.

Muito embora alguns estudiosos e ou entendidos no assunto, discordem do título do meu texto, alegando, que a violência exacerbada em nosso país (elevadas taxas em mortandades e altos índices de homicídios) não se tratarem de Guerra Civil propriamente dita, devido ao fato de não ensejarem conflitos internos (político/partidário), os quais versem sobre disputa pela troca de governos, pendengas internas, geradas por insatisfações políticas de relevante clamor Público.

O que em minha opinião não faz o menor sentido, uma vez que, estamos a mercê de um Estado ausente, comandado por Governantes despreparados e incompetentes. Alguns até bem intencionados, porém atrelados à programas políticos ineficientes e ultrapassados.

Ora, se todos esses conflitos armados/fatais, não são resultados de insatisfação pública, gerada pela desigualdade socioeconômica na má distribuição de rendas, "muitos com pouco e pouquíssimos com muito". O que seria?

A situação agrava-se ainda mais ao juntarmos: a educação de péssima qualidade ao despreparo da segurança e o total abandono da saúde pública em nosso país. Se faz necessário rever conceitos, uma vez que toda uma sociedade (ricos e pobres) pagam a duras penas a conta de um Estado ausente.

Fala-se em "Guerra Civil Não Declarada", uma vez que, o Estado, ciente da criminalidade e das mazelas sociais, permanece inerte e omisso.

Lamentavelmente essa Guerra Civil, vem se arrastando e avolumando-se devido à insatisfação de grupos, os quais detém o poder de fogo, impondo-se através da força criminosa. Não entrarei no âmago dessa questão, para não perder o foco da discussão.

O fato é que, em nossa história, pouco se comenta sobre as Guerras Civis, elas teriam ocorrido em ocasiões isoladas e atípicas. Para melhor nos situarmos em meio ao contexto histórico nacional, menciono aqui alguns conflitos internos armados de maior relevancia social como:

-Guerra dos Emboabas (1707/1709) conflito entre garimpeiros brasileiros e portugueses pelo direito e posse na extração de pedras preciosas descobertas em Minas gerais. Logo em seguida tivemos a Guerra dos Mascates (1710/1711) conflitos entre comerciantes portugueses (mascates) e os fazendeiros donos de engenho.

-Guerra da Cisplatina, conflito entre Brasil e Argentina (1825/1829) o Brasil (Império) queria anexar a província de Cisplatina (hoje Uruguai) ao território brasileiro. (É claro que não preciso dizer que perdemos!)

-Guerra dos Farrapos (Revolta Farroupilha) a qual durou 10 anos (1835/1845) rebeldes liberais, liderados por Bento Gonçalves, queriam criar um "novo país", promovendo a separação do "Sul", fundando a "República de Piratini". o conflito foi contido por Duque de Caxias. Esse conflito foi longo e o que gerou muitas baixas (mortes) para ambos os lados.

- Guerra da Sabinada (1837/1838), leva a nome devido ao seu principal líder e precursor da revolta Dr. Francisco Sabino. Comerciantes, profissionais liberais e algumas autoridades políticas baianas, descontentes com o governo regencial que nomeava autoridades opressoras impedindo a autonomia das Províncias da Bahia.

-Guerra da Balaiada (1838/1841), revolta popular ocorrida no interior do Maranhão (estendendo-se até o Piauí). Quando sertanejos (pobres), escravos fugitivos(negros e mulatos), vaqueiros, prisioneiros desertores das forças armadas (revoltados pela obrigatoriedade do serviço militar). Fomentaram conflito armado, inicialmente por razões políticas e a crise do algodão. O estopim do conflito teria sido a prisão indevida de um ex-escravo, irmão de Raimundo Gomes Vieira, líder de um grupo de vaqueiros, descontentes com a tirania arbitraria militar. "Balaio" um dos integrantes do movimento armado (apoiado pela facção Bem-te-vi) iniciou a "revolta armada dos excluídos".

Entre todos esses conflitos armados, não devemos esquecer a Guerra dos Cabanos e também a Guerra dos Palmares em meados de 1600. Vale relembrar que este conflito, segundo historiadores durou um século. Na época os escravos negros, fugindo da opressão em busca da liberdade, refugiavam se em aldeias (quilombos) para lutar contra a tirania escravocrata.

-Batalha dos Guararapes, quando o forte exército Holandês (1648/1649) em duas grandes batalhas foram massacrados e expulsos por camponeses Luso-brasileiros, depois de tomaram alguns territórios produtores de cana de açúcar(Bahia,Pernambuco,Ceará). Historiadores comparam essa Guerra sangrenta, como a Guerra do Vietnã, o quão grande foi o contraste bélico.

Tivemos ainda: -Guerra dos Mascates (1719/1710); Revolta de Vila Rica (1720), Guerra Guaranítica (1752/1756).

-Guerra do Paraguai, quando um ditador paraguaio, resolveu apossar-se de territórios brasileiros, argentinos e uruguaios, a titulo de "criar" uma passagem do Paraguai (por terras brasileiras)até o oceano Atlântico(ampliando a extensão do território Paraguaio). Está Guerra durou 6 anos (1864/1870) e foi liderada e vencida também pelo General Duque de Caxias.

-Guerra de Canudos, iniciou-se em 1896, quando o "Beato" Antonio Conselheiro insatisfeito com o descaso dos governantes e a miséria em que vivia seu povo, liderou um conflito armado contra as autoridades da República. Esta Guerra durou apenas 1 ano, quando os sertanejos baianos foram massacrados pelas tropas do exército, nem crianças nem velhos foram poupados.

Tivemos também outros conflitos, não menos importantes, como a Guerra do Contestado que ocorreu na região Sul do Brasil (1912/1916) deflagrado pela insatisfação de proprietários de terras do Paraná e Santa Catarina que tiveram suas terras invadidas (desapropriadas) pela estrada de ferro (SP/RS), construída por empresa norte americana, com apoio de políticos (coronéis) brasileiros. Este conflito armado também contou com a ajuda de um monge Jose Maria "messiânico" que liderava os camponeses injustiçados.

É claro que tivemos muitos outros conflitos armados de grande relevância em nosso país, que foram as Revoluções de 1924/1930/1932 e 1964. Porém se faz necessário ressaltar que todos os conflitos armados, são resultados do clamor e da insatisfação publica que, de alguma forma se vê ameaçada e disposta a fazer uso da violência na tentativa de resgatar valores/direitos, que foram violados.

Esse breve relato histórico, nada mais serve para demonstrar que, não importa o cunho ou as razões que motivam os conflitos armados (sociais/econômicos/políticos). A natureza humana sempre clamou por mudanças, e infelizmente, dada a gravidade do problema, frente ao grande abismo étnico desigualitário que hodiernamente se estabelece, fomentando e impondo uma espécie de "seleção natural" atroz.

No presente trabalho tenta-se estabelecer um paralelo de analise, onde presente e passado "misturam-se" não há como fugir do axioma, a "Guerra Civil" está aí para todo mundo ver!

Na busca por mais assuntos referentes a pungente violência, que assola nosso país, deparei-me com as seguintes informações:

Recentemente segundo estatísticas (Segurança Pública) no site de notícias R7, estampado em letras garrafais trazia: "A CADA 3 DIAS MORRE EM MEDIA 1 POLICIAL NO RJ"

O site trazia a seguinte matéria: "Rio de Janeiro, só nos quatro primeiros meses deste ano (janeiro/abril de 2010), 6 policiais Civis e 56 policiais Militares foram assassinados em confrontos criminosos, isso é resultado de um cotidiano violento o qual expõem profissionais a riscos...."

Logo em seguida me dirigi ao site da Globo, onde constei a seguinte Nota: "A CADA 4 DIAS MORRE EM MEDIA 1 POLICIAL EM SP." Foi quando me dei conta que tal Informação pertencia, a uma estatística, vinculada às notícias policiais do ano de 2007.

Em seguida, extrai do site "Correio Brasiliense" a seguinte Informação: de 1997 a 2007, ou seja, em 10 anos, o numero de mortes superou o total de Vítimas das Guerras da Chechênia, Guatemala e El Salvador. O Rio, apesar de apresentar índices satisfatórios de queda, de criminalidade, registrou 1.260 mortes em confrontos criminosos entre policiais. Só não Complexo do Alemão, em junho de 2007, foram mortas 19 pessoas em Apenas 10 horas de tiroteio.

Neste mesmo enfoque, colhi a seguinte divulgação, feita num site da Globo "Anatomia dos homicídios no Brasil" registrando os mesmos índices: de 1997 a 2007, o Brasil registrou 512.216 assassinatos. Só em 2007, foram 47.707 vítimas, nada menos do que 130,7 por dia. O estudo é baseado nos atestados de óbito do Sistema de Informações de Mortalidade (SIM), do Ministério da Saúde.

Etarrecido, dirigi-me a outro site, o qual trazia uma matéria da "Folha de S. Paulo" por "Raphael Gomide" RJ, 16/07/2007. O índice de assassinatos registrados na gestão Cabral é quatro vezes maior que a média internacional. Para especialistas, mortes demonstram uso excessivo de força policial.

Morre um policial do Rio de Janeiro, para cada grupo de 41 pessoas, mortas em confronto com as forças de segurança do Estado. A proporção é o quádruplo da média internacional, segundo estudo do professor da Universidade de Nova York, "Paul Chevigny" (indice adotado internacionalmente). Foram dez PMs e um civil mortos em confronto em 2007 até abril, contra 449 supostos criminosos. Esses são dados extraídos de um estudo criminológico realizado por um prof. norte americano.

Encontrei um site de jornalismo policial: "Pauta do Dia" o qual trás mês a mês o "balancete" dos policiais mortos em serviço ou não (de folga ou aposentados). Obtive a seguinte informação: "Do início deste ano até o mês de maio (2010), temos 71 policiais baleados no Estado do Rio de Janeiro. Sendo que deste pungente saldo, teremos: 39 policiais mortos e 32 feridos/baleados, o que chama a atenção é que muitos desses policiais, nem estavam em serviço e outros já eram aposentados/reformados."

Esses terríveis dados assustadores se referem apenas ao estado do Rio de Janeiro. Se isso não é uma Guerra Civil, sinceramente eu não sei o que seria uma!

Acabei por encontrar em outros sites, a seguinte colocação, quanto ao índice de homicídios: "O Brasil é 5º colocado no ranking dos países latinos, que possui maior taxa de homicídios na América Latina, e 6º no índice mundial. O dado consta do estudo, "Mapa da Violência" mencionando os jovens na América Latina, vítimas em mortes violentas.

Como já fora dito, embora se queira dar outra conotação técnica para Guerra Civil, argumentando que a violência em nosso país está controlada, a criminalidade reprimida, e que, nossa soberania interna encontra-se preservada, juntamente com os direitos fundamentais de cada cidadão.

Elencam-se em nossa Carta Magna, mas precisamente no artigo 5º e incisos, uma infinidade de direitos e garantias fundamentais de cada pessoa,

Mas o que se pode fazer numa situação como está?

Existem alguns mecanismos dispostos em nossa Constituição Federal, os quais dispõem medidas protetivas, quiçá paliativas, no sentido de controlar ou ao menos amenizar os altos índices de violência urbana, atualmente ocorridos.

Tais dispositivos legais, concederiam aos governantes, valerem-se de meios excepcionais de ação/supressão, para restauração da segurança, ordem e contenção da violência exacerbada que, impera nas principais capitais do nosso país nos dias de hoje.

Segundo nossa Constituição Federal, teríamos 3 medidas extremas, elencados nos artigos 34, 136 e 137 da CF, as quais permitiriam que o Estado fizesse uso da "força" na repressão à criminalidade.

1º A Intervenção Federal: a qual permite que um Ente Federal (União) intervenha nos Estados, e consequentemente que Estados, intervenham nos municípios (destes). É claro que esta medida é complexa, e envolve hipóteses excepcionalmente taxativas previstas no art.34 CF. O próprio Presidente da República pode agir de ofício (Intervenção espontânea) para preservar a integridade nacional, repelir invasão estrangeira, pôr termo a grave comprometimento da ordem pública.

2º Em seguida teremos o Estado de Defesa e o de Sítio, ambos são parecidos e tratam excepcionalmente da perturbação ou grave ameaça à ordem pública (isso que vem acontecendo).

Em breve e resumida explicação, o Estado de Defesa, seria uma imposição mais branda do Poder Público (Presidente/Chefe do Executivo) mediante aprovação do Conselho de Defesa, a fim de restaurar a ordem ou a paz social (calamidades/instabilidades).

No Estado de Sítio o caso seria mais "radical", o Presidente, mediante aprovação do Conselho Nacional, suspenderia as garantias e os direitos fundamentais (suspensão da liberdade de reuniões, censura a todos veículos de comunicações). Em ambos os causos o Presidente poderá fazer uso das Forças Armadas, independentemente dos motivos.

Vale uma ressalva, a presença do exército em algumas favelas do Rio de Janeiro, não se enquadra em nenhum dos casos mencionados, essa, só foi uma medida política desesperada na tentativa de conter a criminalidade desenfreada!

O Estado de Sítio ocorreu no Brasil na "Revolução de Trinta" quando o Presidente Getúlio Vargas, dissolveu o Congresso Nacional em 1937, suprimindo todos os direitos, vigorando o "Estado Novo". O que se tem conhecimento é que foi uma época de terror. Posteriormente com seu "suicídio" os militares assumiram "de vez" o poder efetivando-se a ditadura militar.

Em 1968 instituiu-se o "A.I.5" sepultando o que restava dos direitos fundamentais de cada cidadão, permanecendo o país sob o regime militar de 1964 a 1985. o 1º Chefe do Executivo a assumir o país, após a ditadura, foi o Vice Presidente José Sarney, com a morte de Tancredo Neves. Em 1998 tivemos a promulgação da nossa Constituição Federal.

Em minha humilde concepção, penso que os atuais governantes não fazem uso de nenhum destes dispositivos, justamente pelo fato de não incidirem no mesmo erro do passado. Oportuno dizer, que no caso da supressão dos direitos mencionados, suspenderá o "Estado Democrático de Direito" obstando e inviabilizando todos os princípios fundamentais pertinentes aos direitos humanos. Ironicamente por outro lado perdem-se "algumas vidas" para que se salvem "muitas" outras.

A Guerra Civil está instalada, desde muito tempo e não há como permanecer insensível a este axioma!