A grande problemática do ter
O simples fato de querermos possuir algo que nos é tangível e comensurável não trás em si nenhum problema, pois como seres pensantes num mundo, até certo ponto, gerido pela mídia, nosso pensar certas horas se foca nos apelos dessa nova igreja, que nos catequiza nos mandamentos do possuir, sendo assim, é mais que normal esta necessidade existir, e sendo assim, cabe ser saciada, o problema surge quando esta necessidade atinge patamares mais elevados, tornando-se assim, parte integrante do nosso pensar, que deixa de ser um ser livre para tornar-se algo que se une com uma criatura estranha a esse, visto que o pensar, primeiramente não tem vínculo com a necessidade de possuir aquilo que supre suas necessidades primárias.
A vontade da posse aos poucos, como um fungo, cresce tomando conta de todo o corpo onde se instalou, mas sendo pior que mero fungo, ele passa a estabelecer um elo mais íntimo com seus hospeiro, tornando-se uno para com ele, alimentando-se daquilo que ele produz, e sempre exigindo mais; felizmente esse ser, aparentemente vil, pode ter um outro uso, pois se sempre vigiado e podado pode vir a ser usado como um estimulante para o sistema imunológico, deixando-o sempre alerta contra ameaças externas, mas este elo por ser tão estreito pode se converter em algo menos nobre para aquele que o deixou fazer morada em si.
Na nossa sociedade ocidental-capitalista-consumista que nos induz a criar mais e mais necessidades desnecessárias é sempre útil não se deixar levar por aquilo que não nos é útil e que nada nos trará, além de um buraco no orçamento mensal, para no fim gerar uma desvirtuação do que é realmente necessário, e o que viria a ser realmente necessário, poderiam me perguntar, pois bem, é tudo aquilo que nos é essencial, é só imaginar que tudo que temos está num navio e ele está afundando e temos poucos minutos para pegarmos tudo que nos será importante para sobreviver, provavelmente as cinco primeiras coisas escolhidas principais, as demais, que mesmo podendo ser descartadas em primeiro plano, também são úteis, como um pouco de conforto, que pode ser um item secundário, por mais radical que possa ser, este exemplo serve para ilustrar o quanto de trivialidades que temos nos rodeia. Claro que um pouco de mimo é bem vindo, afinal de contas existem certos itens que nos proporcionam um bem estar.
Consumir e ter é importante, desde que se saiba o por que e o para que se precisa do objeto desejado, por vezes adquirido, para no fim não levar para casa algo que no fim virá a ser um erva daninha, e como tal, criará raízes profundas e que crescem velozmente. É praticamente impossível resistir ao que vemos e ao que somos induzidos a desejar, ainda mais quando nos deixamos ser levados a ter tal desejo, seja para no fim gerar um certo status, que hoje é tão descartável quanto qualquer lenço de papel, seja para nutrir e efemeramente saciar um desejo auto-renovável, ou por outro motivo qualquer que não terá qualquer motivo para existir, a não ser o de saciar o âmago e o orgulho de mostrar que se tem a capacidade de fomentar um fogão a lenha que sempre mede mais carvão, e que possui o objeto de transitório desejo.
A grande problemática do ter é nos colocar numa eterna espiral onde quanto mais queremos e buscamos ter, mais nos tornamos pobres, não, somente, financeiramente, mas por deixarmos de lado aquilo que de mais belo temos, as nossas relações com os outros e com nós mesmos, e o conhecimento que adquiriremos destas relações, que como não podem ser comprados (exceto em sua versão simulada e por sua vez falsificada), não "nos" desperta interesse.
No fim nos tornamos um ser de muitas posses mas de pouco conhecimento, e aí entra a indagação, de que adianta ter tudo se não tenho o conhecimento, e por sua vez a sabedoria, de dar uma finalidade útil a tudo que tenho? A nos atrelarmos a isto nos esquecemos de uma coisa, tudo que temos um dia será tirado de nós, seja pela deterioração do bem (no sentido mais amplo da palavra), seja por nosso aniquilamento existencial desta existência com a morte, ou desencarne, como preferirem chamar, deixando tudo aquilo que um dia possuímos para as gerações vindouras, quando o mais importante é deixar um legado, pois este é eterno, na medida em que é gerado e renovado.