A Justiça é Cega

A justiça é cega

Ensaio com base na Obra O Equívoco – Contos Bandidos

João Uchoa Cavalcanti Netto – Juiz de Direito

Em nossa pátria mãe gentil tudo é futebol, praia e telenovelas! E a Justiça vive seu capítulo mais longo em toda a história do Brasil. Neste país de manda-chuvas, coronéis, onde a escravidão se perpertuou tanto que, envergonhados e sob pressão, só assim abriram mão (contrariados) e deram a liberdade aos cidadãos que realmente construíram esta nação. Daí começa a nossa jornada de rebuscadas respostas para explicar os verdadeiros problemas em nossa legislação: a legislação. Nos labirintos em que permeia a palavra Justiça está o que poderíamos considerar a aplicação de uma Lei. Fazendo um desdobramento destas duas palavras e aplicando-as ao modelo do Estado brasileiro no âmbito do funcionalismo e eficácia das normas jurídicas, órgãos públicos, cidadania etc., constatamos perplexos que somente o Corpo de Bombeiros cumpre o seu papel dentro dos padrões de funcionabilidade e competência neste país. Ou seja, o Poder Judiciário, apesar das reformas institucionais com emendas e remendas, sucumbi ante a dubiedade que se estabelece na tentativa simples de se fazer cumprir a Lei. Voltemos a mais uma palavra: Ética - como assim? No atual momento na sociedade brasileira e no mundo, vivemos o caos. O ser humano perdeu a bússola e está no caminho contrário ao que o levaria a preocupação efetiva de valores como a Moral, o Respeito e a Família.

Assim, com “conceitos” novos emergindo, por falta de Conceitos, esbarramos nos três únicos grandes problemas da Justiça: a moralidade, a ética e a aplicação da lei. È tão simples se fosse simplesmente assim. Atravessamos uma fase em que se faz necessária uma reflexão acerca de tudo que está acontecendo e buscar soluções na tentativa de evitar que os atalhos dentro do Código penal favoreçam aqueles que permanecem impunes quando deveriam estar respondendo por seus crimes dentro das penitenciárias. O mais grave é que esta é somente uma das faces do problema que tem uma dimensão muito maior e que está relacionado com o preconceito, a corrupção, a desigualdade social e a incompetência. O descaso com a justiça começa na periferia e nas delegacias de polícia. Precisamos refletir sobre o caminho da ineficiência no qual a Justiça enveredou, pois o poder econômico e político são o diferencial que estabelece critérios para se fazer cumprir a lei. Então o ponto é: a rigor a lei é cumprida até esbarrar nestes fatores que determinam quem está no banco dos réus ou o quê estará em julgamento. É preciso rever o que está nas entrelinhas no mexe e remexe no texto da Lei e tentar responder as seguintes perguntas: por que tantos túneis para atravessar os trâmites da Justiça? É no momento em que se passa por eles, quando na obscuridade dos fatos, que papéis de perdem, provas se perdem, testemunhas se perdem e onde a corrupção acontece; qual a responsabilidade da mídia? Quando na exploração da violência, por que não estabelece uma postura mais crítica invés de se preocupar com a vendagem de jornais ou audiência na televisão? Já está mais que provado a influência a imprensa sobre o desencadeamento dos acontecimentos neste país; a imprensa já elegeu um presidente da república. A de ser uma grande arma contra a burocracia e um meio onde a população pode se manifestar. Porém, tudo cai no esquecimento a partir de um fato novo.

Senhoras e senhores, o espetáculo vai começar! Apresentando: a Justiça, e no elenco principal o Policial, Juizes, Advogados, Promotores e os Réus. Réus? Como assim? Não lhe concederam Alvará de Soltura? Um programa inteirinho na TV; várias páginas nos jornais e o direito de esperar o julgamento em liberdade? Liberdade? Como assim? Ele não estuprou, matou? Ele não “afanou” o dinheiro da Previdência Social?

Estamos à mercê da própria sorte porque não podemos encontrar garantias de que estamos sob o amparo da Lei. È isso, simplesmente assim. As brechas no Código Penal brasileiro ainda estão lá; a impunidade é uma questão já acomodada dentro da nossa sociedade, já virou programa de televisão e é tema e piadas, não é mais problema não. Aqui o rosto de um terrorista vira máscara no carnaval; o assassinato é coisa de pobre e o tráfico deixa “pros grandes”; o advogado já tem mesinha dentro das delegacias; juizes e promotores reviram-se na cama à noite. Uns porque querem estabelecer a ordem e a disciplina no exercício de sua missão e outros porque fecham os olhos e estendem a mão sucumbindo à corrupção. Enfim, é por isso que não podem dormir nem os guerreiros nem os charlatões. Cuidemos, pois do futuro desta nação ao léu. Em todas as camadas na Justiça, da Moral e da Ética. Como disse Platão: “A menos que os filósofos sejam reis ou que os que hodiernamente se nomeiam reis e soberanos sejam verdadeira e seriamente filósofos, de sorte que a autoridade política e a filosofia acopladas se encontrem no mesmo indivíduo, enquanto que se excluam do governo quantos atualmente aspiram a uma das duas vocações sem a outra, fora disto(..) não há medicina para os males que afligem e devastam os Estado e o próprio gênero humano, nem jamais surgirá na Terra e virá à luz o sol o Estado perfeito, cujo plano projetamos”.

Que as conjecturas dêem lugar a novas idéias que efetivamente venham apontar um novo caminho para a moralidade; que a Justiça não permaneça cega na cepção da palavra, mas para aplicar a justiça; que os homens encarregados de fazer cumprir a Lei sejam inspirados pelo poder Divino para o bem do cidadão brasileiro. Amém.

Gabriella Slovick
Enviado por Gabriella Slovick em 31/07/2006
Código do texto: T206090