SIMULACRO (falas da barata)

SIMULACRO – (falas da barata)

1a. fala:

Há milhões de anos observo, com meu multifacetado olhar, o desenvolvimento, o comportamento, a evolução da espécie humana.

Há seis milhões de anos, o homem tinha um cérebro pequeno, era dotado de instintos primários básicos, vivia nas copas das árvores, era vegetariano, não levava uma vida coletiva.

Há quatro milhões de anos, uma nova camada é acrescida ao cérebro do homem, graças a era glacial ele desce das árvores à procura de alimentos, torna-se carnívoro, suas relações passam a ser objetais, provou o prazer de matar, gostou.

Há dois milhões de anos, uma última camada é acrescida ao seu cérebro, o que possibilitou o desenvolvimento da razão e da vida em sociedade. Perde a liberdade e adquire o sentimento de posse, então tudo desandou de vez.

2a. fala:

Quão longo é o caminho que ficou para trás, o caminho percorrido. Vocês pensam que tem autonomia, mas não passam de autômatos. Vocês pensam que fazem escolhas, mas todas elas foram feitas para vocês que nem se deram conta disso.

O tempo, que não existe passou, o que lhes resta de caminhada é muito pouco, é pouco o espaço que os separa do fim. Vocês pensam que aproveitaram a vida, quando na verdade foi ela quem se aproveitou de vocês, que pensam que pensam quando na realidade vocês apenas acham, vocês vivem de achismos e nunca encontraram nada, deixaram para trás uma vida de procuras, de tentativas de encontros, de buscas por verdades e elas eram todas alheias a vocês.

Os insetos estão a zunir ao redor, este zumbido é o que agora os guia, zumbis da vida, mortos-vivo de merda, os vermes estão a lhes devorar ainda em vida e vocês não se dão conta, vocês não se dão conta de nada, vocês não são nada. A sentença já foi dada.

É pouco o espaço que lhes resta, é pouco o tempo que lhes resta.

Vocês não passam de uns trastes, de seres descartáveis, pensam que consomem quando na realidade são consumidos, isso é fato consumado.

Os insetos estão agora a rodear suas cabeças. De que valeu a razão que vocês pensam que acharam e que podiam dispensar, quando na verdade foi ela quem sempre os governou na simulação que vocês fizeram de suas vidas. Os vermes, os vírus e as bactérias estão a devorar-lhes os corpos ainda em vida, é pouco o tempo que lhes resta. Essa é a dura realidade, mentes dominadas. Nadas. Nadas. Nadas.

3a. fala:

Vejo tudo através de minha multifacetada visão.

Quando os anjos do apocalipse abrirem os sete selos da desgraça final, serei a única sobrevivente, meus caros humanos, pois faço do lixo por vocês produzido, o meu alimento; da merda que vocês cagam a minha morada. Serei a sobrevivente da hecatombe universal por vocês produzida.

Sobrevivo ao fogo, ao gelo e me fortaleço com o veneno das bombas que foram por vocês criadas e detonadas. Vocês pensam poder me esmagar sob os seus sapatos, mas milhões de ovos, não tântricos e sim o que vocês acham nojentos ovos, perpetuarão a minha espécie, enquanto vocês serão soterrados nos escombros das maravilhas que produziram.

Eu faço minha própria ecologia de vossas destruições; eu sobrevivo do lixo por vocês produzido, eu sobrevivo no lixo que vocês produziram; eu sou a fortaleza, e não existe cruz para me crucificar, não existe sociedade ou religião para me deter; Eu sobreviverei; Eu darei sonoras gargalhadas quando vocês se forem desta para pior. Ah! Ah! Ah! Ah! Ah! Ah! Ah!

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