Livre Arbítrio e o Poder de Escolha: PREFERÊNCIA OU INIBIÇÃO



A expressão "livre arbítrio" é quase paradoxal porque, se de um lado nos atemos à "liberdade", de outro nos referimos à arbitragem, que supõe juízo, julgamento e, portanto, "justiça". A justiça, propriamente, está submetida às vontades de um todo composto pelas vontades individuais, ao mesmo tempo que ela (a justiça) submete a vontade (liberdade) individual. Nesse sentido, as liberdades também estão contidas, já que trata-se da sinergia das possibilidades de ser livre dentro de determinadas condições, implícitas a esse todo. É quase como se participássemos de um jogo coletivo, porque num jogo há regras explícitas e implícitas, através das quais podemos utilizar nossa inteligência para criar estratégias que podem levar ao sucesso, mas, infelizmente, também ao fracasso.
Muito se apelou para o "natural" através dos tempos para invocar a Natureza como modelo de liberdade, no que a ciência demonstra cada vez mais que todos os acontecimentos estão contidos em probabilidades, submetidas estas aos condicionantes envolvidos, nem sempre previsíveis.
Como exemplo podemos indagar se existe mesmo a liberdade total na Natureza, ou na realidade essa "liberdade natural" [livre - liberdade] não está submetida às "leis naturais" [arbítrio - juízo]: A chuva que vem e vai, numa lição, interfere ou não interfere no solo, ora ressecando-o, ora inundando-o? E o que dizer das folhas das árvores que ao sabor do vento e das estações se desenvolvem, se fixam aos ramos e são varridas para os chãos? Há muitos refrões cantados que vão ficando destoantes conforme nos dispomos a aprender com o Universo. Voltaire disse que "somos livres para fazer quando temos o poder de fazer", na conclusão das figuras do "querer" e do "fazer", já que o querer fica condicionado ao poder. Até porque Abbagnano [Possibilitá e libertá] expôs lucidamente que "a liberdade não é uma escolha, mas uma 'possibilidade de escolha'", como "os procedimentos que podem ser eficazmente empregados por qualquer um, nas circunstâncias apropriadas: uma possibilidade de escolha sempre ao alcance de qualquer um nas condições oportunas", assim "um tipo de governo não é livre simplesmente por ter sido escolhido pelos cidadãos, mas se, em certos limites, permitir que os cidadãos
exerçam contínua possibilidade de escolha, no sentido da possibilidade de mantê-lo, modificá-lo ou eliminá-lo", concluindo que "as chamadas 'instituições estratégicas da liberdade', como a liberdade de pensamento, de consciência, de imprensa, de reunião, etc, têm o objetivo de garantir aos cidadãos a possibilidade de escolha no domínio científico, religioso, político, social, etc. Portanto, os problemas da liberdade no mundo moderno não podem ser resolvidos por fórmulas simples e totalitárias (como seriam as sugeridas pelos conceitos anárquicos ou necessaristas), mas pelo estudo dos limites e das condições que, num campo e numa situação determinada, podem tornar efetiva e eficaz a possibilidade de escolha do homem" e, dessa maneira, a arbitragem livre é provável numa questão de medida, de condições e limites, infinita em sonhos e comportada pela convivência, conforme as limitações do potencial que vale para qualquer organismo, onde cada poder é manifestação de todas as partes que o compõe. Na vida social, então, assim como há os ditames sociais e da ciência, da fé e da vontade  coletiva em cada individualidade, a vontade coletiva se torna um meio de realizar a vontade individual. É no conjunto "Liberdade e Justiça" que existem as possibilidades e probabilidades do desejo. Realidade da alma e do espírito, sobrevive no pensamento. Mesmo considerando o "mito de Er" (aquele da liberdade e justiça através dos tempos, nas reencarnações), de Platão, cabe a nós perguntarmo-nos diariamente "Quais as diferenças entre a liberdade tida e a usufruída?"