Anotações sobre o Pós-Modernismo e suas relações.
Qualquer anotação acerca do pós-modernismo nos obriga a uma ponderação nas origens do modernismo. Iniciado por Ruben Dário, poeta nicaragüense que escrevia num periódico guatemalteco, em mil oitocentos e noventa, inspirado em várias escolas francesas – romântica, parnasiana, simbolista – para fazer uma “declaração de independência” face à Espanha, que desencadeou naquela década um movimento de emancipação das próprias letras espanholas em relação ao passado.
Este movimento entre estas referências só acontecerão na Europa cinqüenta anos adiante quando tais conceitos já farão parte do cânone espanhol.
Nisso os retardatários ditaram os termos do desenvolvimento metropolitano – assim como no século dezenove “liberalismo” foi uma invenção do levante espanhol contra a ocupação francesa na época de Napoleão, uma exótica expressão de Cádiz que só muito depois se tornaria corrente nos salões de Paris e Londres; simplificando: as metrópoles passam a sofrer a influencia de valores cunhados em suas atuações marginais (coloniais), quando a originalidade e a confrontação passam a condição de nova referencia para a expressão vigente.
A importância do pós-modernismo como corrente literária é contraditória, tornando necessário atentar as transformações estéticas que influenciaram todas as artes e formas de expressão realizadas naquele período.
Uma interpretação objetiva do cenário na arquitetura americana no período, nas artes plásticas na Europa num primeiro momento, na literatura em diversos pontos onde o modernismo estava maduro para colher seus desdobramentos e em outras artes em uma escala menos perceptível, dá conta da circunstancia comum que influenciou profundamente todas as esferas de expressão autônomas.
A influencia direta do capitalismo e seus ecos determinaram leituras e interpretações das perspectivas que se consolidavam como avanço do capitalismo contemporâneo; para Lyotard a "condição pós-moderna" caracteriza-se pelo fim das metanarrativas. Os grandes esquemas explicativos teriam caído em descrédito e não haveria mais "garantias", posto que mesmo a "ciência" já não poderia ser considerada como a fonte da verdade.
Tal interpretação deve-se as transformações que a segunda metade do século vinte assistiu; um processo sem precedentes de mudanças na história do pensamento e da técnica. Ao lado da aceleração avassaladora nas tecnologias de comunicação, de artes, de materiais e de genética, ocorreram mudanças paradigmáticas no modo de se pensar a sociedade e suas instituições.
Na literatura a ruptura com as poéticas românticas parnasianas e simbolistas conduziram para uma expressão reativa aos aspectos normativos, havia uma discussão bastante rica sobre a idealização da expressão artística. Para o norte-americano Fredric Jameson, a Pós-Modernidade é a "lógica cultural do capitalismo tardio", a Modernidade surgida nesse período é criticada em seus pilares fundamentais, como a crença na Verdade, alcançável pela Razão, e na linearidade histórica rumo ao progresso.
A revisão destes valores modifica a dinâmica da expressão gerando novos elementos de apreciação em confronto com os dogmas presentes na base do modernismo vigente até então. Nota-se neste movimento um claro percurso dialético e tal observação apontará caminhos para os teóricos que afirmarão e negarão o pós-modernismo daí para adiante.
As reflexões oriundas deste movimento irão estabelecer a crise das representações; considerando as bases estéticas e filosóficas dentro das expressões diretamente concebidas pelos valores de razão e verdade ficando limitadas pelos questionamentos que a nova ordem propunha.
O registro do real (figurativismo) era o principal eixo da pintura até mil oitocentos e setenta, assim como de resto de toda a arte, até o pós-guerra. Dali em diante, valoriza-se a entropia; “tudo vale”, e todos os discursos são válidos. O resultado é que não há mais padrões limitados para representar a realidade, resultando numa crise ética e estética.
O mundo capitalista gerava um homem inserido numa outra dimensão de razão, de senso estético, de funcionalidade (senso prático) e diante destas novas proposições os referenciais foram irremediavelmente deslocados. As representações de culturas predominantes começam a registrar influencias de outras culturas e tais referências dão curso a um movimento maior de intertextualidades em um cenário global, onde as diferenças serão confrontadas pelas influencias múltiplas que estas novas relações irão representar.
Este movimento é perceptível desde o modernismo, porém o seu contorno ficará mais bem definido a partir das evidentes influencias entre todos os espectros de representação desta época.
Historicamente as sociedades começam a se aglutinar em em torno de atividades e afinidades comuns, gerando relações e identidades recíprocas cada vez mais amplas, abrangentes e profundas. Deste modo uma relação que se inicia por interesses econômicos terá desdobramentos culturais e históricos e lentamente conduzirá a uma consolidação de uma expressão por uma expressão mútua capaz de unir duas representações distintas e consolidar uma nova via de expressão entre dois padrões culturais autônomos.
As diversidades começam a se freqüentar e realizar influencia múltiplo, há controvérsias sobre valor e pertinência; uma onda de transformação das linguagens gráficas e interpretação dos símbolos começam a dar uma estrutura acadêmica à investigação do fenômeno.
Bauman refuta o termo e descreve por outra via as reações a esta nova ordenação de valores, Lipovetsky aprofunda o conceito dando maior peso a continuidade da ação da modernidade sobre a matriz estética e finalmente Habermas relaciona o conceito de Pós-Modernidade a tendências políticas e culturais neoconservadoras, determinadas a combater os ideais iluministas.
Fredric Jameson em Espaço e Imagem: teorias do pós-moderno e outros ensaios; avança sobre a comunicação e os fatores relacionados; discute o arbítrio da imagem e a prevalência da relação áudio-visual sensorial sobre a abstração necessária na literatura e a dinâmica das representações nos diversos segmentos de expressão e comunicação.
O que estes teóricos começam a registrar são os valores mais evidentes nesta relação de espaço tempo com arte, história e comunicação, como corrente literária há uma limitação que está evidente na concepção de Lipovetsky, onde o modernismo ganhou tal profundidade que adquiriu autonomia na sua apreciação. Porém, tal interpretação não atinge plenamente as demais variáveis que o pós-modernismo igualmente influenciou.
Perry Anderson em seu ensaio “As origens da Pós-modernidade” sustenta que o pós-modernismo deriva de uma burguesia declassé, do desenvolvimento tecnológico da mídia e da derrocada histórica e global da esquerda. Dando seqüência a sua rigorosa interpretação do pós-modernismo como lógica cultural do capitalismo multinacional, conclui com um conjunto de reflexões históricas sobre o desaparecimento gradual do modernismo, a ascensão do espetacular, os debates sobre o “fim da arte” e o destino da política no mundo pós-moderno.
Neste ensaio o autor traça as relações ocorridas entre os principais intelectuais e as inovações que foram alterando o mundo e o comportamento da sociedade e seus indivíduos. Diante do valor dos signos e tudo o que a comunicação material permite, ao autor, através da utilização de paralelos, consegue determinar o nível da transição do modernismo, com sua ruptura com o classicismo e o romantismo na construção de uma nova poética que propunha uma relação de maior autonomia com a expressão.
A Pós-Modernidade operou efeitos sobre o indivíduo de tal ordem que devemos atentar para algumas questões:
Uma característica do indivíduo pós-moderno é que ele atua na micrologia individual. Se o sujeito parece fragmentado é porque o pós-modernismo vai levar às últimas conseqüências as pequenas liberdades individuais.
Sendo eclético, o pós-modernismo faz do cidadão senhor de suas escolhas, com um infinito leque de possibilidades que lhe permite optar, desde que essa opção não seja o não-consumo.
Será o pós-modernismo decadência ou renascimento?
A presença do hiper-realismo na comunicação, sendo notável principalmente pela espetacularização da notícia, gera problemas, pois o que parece ser possível em novelas, por exemplo, não passam de sonho na vida real. Daí, alguns elementos passam a serem confundidos como ficção e realidade. O hiper-realismo é a mentira da verdade, podendo ultrapassar tanto o controle do emissor quanto do receptor. Este encontra na emissão hiper-realista uma espécie de potencialização de sentimentos, impressões e percepções.
Hoje os meios de comunicação desenvolvem técnicas de apresentação da notícia como espetáculo, manipulando o seu conteúdo. Outro problema gerado pelo hiper-realismo da mídia está presente na roupa, nos gestos, atos e comportamentos diariamente recebidos por ela. Nessa atitude, insere-se a cultura do hiper-real e a sensação de viver no intenso clima por ela caracterizado.
Vivendo num mundo de signos, prefere-se a imagem ao objeto, o simulacro ao real, o hiper-realismo, que expressa à perplexidade contemporânea (Baudrillard).
Desde a nossa identidade individual, incompleta e insegura, à nossa identidade cultural coletiva e dinâmica; transitamos pelas representações estéticas, eróticas e personificação dos nossos desejos, a cada ruptura deste modelo uma seqüência de reações de negação, questionamento e afirmação passa a dirigir a expressão coletiva que se destaca observada da manifestação individual.
Este conjunto de reflexões materializadas nos resultados atingidos dará ao conjunto a uniformidade que proverá os estudiosos de material e registro para descrever o itinerário das relações do homem com sua expressão diante do seu tempo.
Poética do Pós-Modernismo - História - Teoria - Ficção - Linda Hutcheon, Rio de Janeiro, Imago Editora, 1991
SANTOS, Jair Ferreira dos. O Que É Pós-Modernismo, Coleção Primeiros Passos, Brasília: Brasiliense. (1986)
BAUMAN, Zygmunt. Ética pós-moderna. São Paulo: Paulus, 1997.
Jameson, Fredric. Pós-Modernismo - A Lógica Cultural do Capitalismo Tardio, São Paulo: Ática, 2002.
Jameson, Fredric. Espaço e Imagem: teorias do pós-moderno e outros ensaios, Rio de Janeiro, Ed. UFRJ, 2003.
Lyotard, Jean-François. A condição pós-moderna. Rio de Janeiro: José Olympio, 2008.
Anderson, Perry. As origens da Pós-Modernidade, Jorge Zahar Editor: Rio de Janeiro, 1999.