O PARADOXO DO PENSAMENTO ( Celismando Sodré Farias-Mandinho)
O PARADOXO DO PENSAMENTO
( Celismando Sodré Farias - Mandinho)
O pensamento sempre exerceu uma espécie de fascínio e medo no ser humano, durante a trajetória deste na terra justamente pelo seu caráter paradoxal: ao mesmo tempo que através dele o homem criou, inventou coisas maravilhosas, também arquitetou planos nefastos e destrutivos causando mortes e destruição pela face do planeta. Quantas vezes nos surpreendemos tendo idéias inéditas ou pensando coisas que não queríamos causando até repugnância.
Durante a história do Homo Sapiens (que pensa), sempre estivemos no limiar entre o aprofundamento filosófico até as últimas conseqüências e o receio da loucura, como se houvesse uma tênue linha divisória entre o ir além e o recuar que causa tamanho espanto no ser pensante. Alguns foram longe demais e perderam a sanidade, o senso comum, costuma afirmar sem qualquer embasamento científico que “quem pensa demais fica maluco”. Como imaginar um cérebro tão privilegiado como o de Nietzsche, vagando por um hospício e pagando o preço por não ter tido medo de abrir as portas do pensamento, adentrando para além da linha divisória, ousando refletir sobre coisas que jamais outro imaginou rompendo com certos limites morais do seu tempo, ou Leonardo da Vinci que teve idéias que estavam muito para além do seu tempo, além de suas invenções que causavam estranhezas nos seus contemporâneos.
Sempre que o homem procurou questionar as causas essenciais do mundo, a cristalização cultural das idéias, conceitos e regras, como o sagrado e Deus, as normas sociais, as relações de poder, o além da vida e o infinito do universo, aparecia aquela voz interior como a alertar: “cuidado! ... cuidado!... você esta indo longe demais!”. O livre e inquieto pensador era sempre dominado, reprimido pelo pensador amedrontado. Claro que os poucos corajosos, rompiam as barreiras e iam para além das porteiras das regras sociais e dos seus próprios medos, e muitos morreram por isso.
Na famosa alegoria o “Mito da Caverna” de Platão, o prisioneiro que liberta da caverna (que para ele era seu mestre, o filósofo Sócrates), onde enxergava apenas as sombras da realidade, vivendo no mundo da ilusão, quando começa a averiguar e sai das sombras, primeiro fica ofuscado diante da luz jamais contemplada em todo o seu esplendor, vislumbrando toda a verdade começa a perceber o mundo real e volta para libertar seus companheiros do estado de torpor e cegueira em que esses sempre viveram e não consegue, sendo ironizado de todas as formas e até morto por aqueles que vivem naquele mundo das sombras, pensando ser a única realidade existente. Desde esta época de glória da filosofia, ir além da mediocridade, da mesmice do pensamento, representava um grande perigo onde a morte era a condenação.
Os entraves para o pensamento livre são resquícios de uma educação fundamentada na punição e no castigo divino, no medo de que fossem desvendadas verdades e certas imposições dos poderosos com seus privilégios. Era uma espécie de repressão social e religiosa que, ao longo do tempo, foi usada pelos sacerdotes, pelas classes dominantes, pelos pais e pessoas mais velhas, para evitar a contestação, a subversão e a exigências de explicações que poderiam desmoronar a autoridade e toda a estrutura da sociedade, com seus sistemas e convenções criadas para justificar tais dominações.
O Mito de Prometeu, que roubou o fogo sagrado dos Deuses e entregou aos seres humanos, possibilitando a estes o conhecimento, despertando nestes o afã pelo saber, sendo punido com uns dos castigos mais cruéis e implacáveis da história da literatura universal imposto por Zeus, o principal deus do Olímpio. Prometeu cometeu o sacrilégio de querer que os homens pensassem por eles mesmos e foi acorrentado no topo de um penhasco para ter seu fígado devorado toda noite por uma águia; como era imortal, seu órgão sempre renascia para ser devorado novamente. Tal mito, parece ser uma alegoria perfeita para esta necessidade de pensar, conhecer e transformar do homem e seu próprio medo da punição. O que nos quer alertar esta alegoria da mitologia grega? Seria o perigo do conhecimento, do controle humano sobre a natureza? seria a predominância de forças que estão acima dos seres humanos?
O pensamento esta intrinsecamente ligada a filosofia, daí a necessidade que o ser sente de transpor os limites, experimentar, ir além do conhecido. É a característica mais marcante do ser humano. Ele saiu de sua aldeia para conhecer outras paisagens, como uma necessidade, um impulso que vinha de dentro. Ele foi além dos horizontes próximos e conheceu outras tribos, outros povos; atravessou as montanhas, as florestas e os mares revoltos e tenebrosos para conhecer novos continentes; olhou para lua e quis ir lá e foi; olha para o sistema solar, para outros planetas, para outras estralas e aquela vontade sempre acesa no seu íntimo o inquieta querendo conhecer o infinito, transpor barreiras.
O desconhecido sempre causou medo, mas este medo nunca foi empecilho para a curiosidade do homem, a vontade de ver o que esta por trás das cortinas do tempo e do espaço. Porém, mais importante do que o conhecimento é saber o que fazer com o conhecimento, é nisso que consiste a sabedoria, descobrir, transformar, experimentar, inventar e fazer uso do raciocínio e da incrível liberdade que os indivíduos sempre tiveram e ainda tem para pensar e interferir no mundo e no universo de uma forma serena, lógica, coerente e harmônica, sempre preservando a vida, a natureza, a felicidade e a possibilidade de que outros venham para fazer uso deste fantástico e milagroso planeta e desta incrível e maravilhosa possibilidade que é o pensamento.