VII - Não há remédio social, escrito ou verbal que erradique a doença

Jaime Douglas da Silva, advogado, professor universitário foi orientador de Miguel das Neves Alves durante seu período acadêmico.

Dizia que, o Direito é o elo entre todas as ciências e, por meio dele, o Homem transcenderia a uma nova sociedade.

Se todos soubessem utilizar o código de leis, o Estado teria papel secundário, não ostensivo na vida dos cidadãos.

Possuía essa ideologia anárquica (na etimológica concepção da palavra), que fora lapidada em anos de estudos jurídicos, e possuía vários discípulos.

Escritor, poeta, abstêmio, quando conheceu Miguel ficou impressionado com a convicção das palavras deste num pequeno discurso no refeitório da faculdade.

Na ocasião, Miguel dizia que: “o clero intervem por demais na vida das pessoas, prega pecado e punição de uma forma fundamentalista e não vê salvação para os que crêem em algo diferente a esse contexto”.

Citava Spinoza e sua concepção de Deus no todo e para o todo, na forma de como o Senhor não faz da raça humana, meros objetos pensantes manipulados por Ele.

“Deus criou o todo e, a partir da criação, o próprio Deus passou a interagir com sua criação, não ficando limitado num universo à parte do que foi por ele criado”, dizia. Argumentava que: “o Senhor está em todo lugar onde há vida e criação, podemos vê-lo e senti-lo tal como nos é mostrado”.

Fez uma crítica ferrenha à imposição de dízimos cobrados de forma abusiva, argumentando que espiritualidade e capitalismo são antagônicos e heterogêneos por demais:

“O ser humano deve doar matéria pelo coração, não ficando obrigado a contribuir como se fosse pagador de impostos celestiais incondicionalmente”, argumentava.

“Mas lembrem-se: Aquele que semeia pouco, pouco ceifará, e que cada um contribua conforme o propósito do seu coração”, afirmava com afinco o jovem de olhar penetrante.

Esse olhar que atingia o cerne das pessoas, talvez fosse à única herança deixada pelo seu pai.

Essa amizade rendeu frutos a Miguel.

O sábio Jaime Douglas da Silva o instruiu com ensinamentos fundamentados nos grandes estudiosos das ciências jurídicas e nos grandes filósofos, como Bacon, Locke e Hegel.

Apresentou-lhe textos e livros de Umberto Eco e ele se apaixonou por História Medieval.

Aprendeu a dizer em suas retóricas que a Idade Média não foi uma era de trevas, recheadas de batalhas sangrentas, mas uma idade de grandes descobertas e realizações humanas.

“Foi como se a raça humana tivesse que passar por esse atrito evolutivo para chegarmos à tecnologia atual”, dizia.

Por forte influência de seu orientador, Miguel nesse período, quase transformou-se num racionalista ferrenho. Tornou-se grande conhecedor de Descartes, Spinoza e Locke; “os mais racionais de todos”, dizia ele.

Tomava por base a si próprio, já que não tinha a mínima condição de vencer por meio de outra coisa senão seu próprio esforço e dedicação integral ao auto-desenvolvimento cognitivo, pois filho de sertanejos e desprovido de toda sorte de conhecimento e privilégios sociais, veio a se apaixonar pelos livros como uma paixão inata, inerente ao ser, como se tudo já existisse em seu âmago sem que a experiência vivida se manifestasse, mesmo em sua cruel ignorância, amava os livros, tinha-os como companheiros e sem saber que por meio deles ascenderia, lia-os por paixão.

Não queria nada em troca, apenas lê-los e saciar assim sua antropofágica curiosidade.

Via os livros como fonte de conhecimento do indivíduo para o indivíduo como se aquela matéria de celulose fosse a ponte que intermedeia a inteligência e a captação dela entre os seres racionais.

Numa noite, pouco antes de se imergir em sono profundo, tomou uma decisão que determinaria todo o seu futuro profissional.

Consciente, apesar do sono, definiu que não seguiria carreira acadêmica, mas lecionaria para as crianças da Cidade dos Miguéis.

“Não quero ministrar aulas para adultos inflexíveis.

Não há romantismo pitoresco nisso. Quero sim, levar meu conhecimento e minha didática para as crianças da minha comunidade.

Quero fazê-las apreciarem os saberes humanos e, de alguma forma, evoluírem permanentemente com isso”. Dormiu.

Em âmbito sentimental, Miguel, não tinha o coração aberto a paixões.

Achava que ficar namorando era perda de tempo.

Nunca se interessou integralmente por alguma mulher.

Tinha seus desejos sexuais trancafiados em sua mente e era adepto do onanismo.

Nesse período, Miguel, movido por elevações nos índices de testosterona sintetizados pelo seu próprio corpo, começou a sentir um enorme desejo por fêmeas, algo incontrolável, era como se os hormônios que regiam sua matéria orgânica estivessem em constante ebulição.

Por vezes, em meio a uma leitura, se via pensando nas colegas de sala, nas modelos da televisão e, quando então descobriu a literatura obscena com Trópico de Câncer de Henry Miller tinha altos devaneios com as prostitutas descritas pelo autor, as desejava, queria tê-las em seus braços, na sua cama, assim como Henry Miller as tinha. Percebia que um novo ciclo se iniciaria em sua vida: o das relações sexuais.

Durante a faculdade, perdeu a virgindade logo no segundo semestre.

Sabia que fazia parte de sua evolução conhecer a fundo os prazeres carnais, mas não se identificava culturalmente com as moças a quem teve acesso carnal intenso.

Não tinha pressa para encontrar alguém que o completasse, que pudessem, juntos, produzir pensamentos, que conseguissem atingir patamares inimagináveis juntos.

Miguel era consciente e nunca deixava que sua sexualidade falasse mais alto, apesar de todo desejo que sentia e que se fazia cada vez mais presente em sua vida.

Só quando se alcoolizava é que perdia totalmente o controle, e sempre acabava por encontrar alguma mulher que lhe desse prazer, que lhe realizasse as fantasias sexuais e que lhe proporcionasse momentos de deleite intenso.

Numa festa de final de semestre, alcoolizado, encontrou Tâmara, uma colega de sala, formosa, que possuía um cheiro adocicado como pêssego maduro, cabelos cor de mel, olhos intensamente negros e não se deteve.

Cheio de desejo, a convidou para tomarem vinho e dialogarem. Horas depois estavam copulando, no quarto de Tâmara, produzindo movimentos lascíveis para atingir o mais profundo orgasmo.

Foi uma noite bela, com um frescor que penetrava pela janela semi-aberta e irradiava um cheiro peculiar de final de primavera.

O céu estava pouco claro, totalmente recheado de estrelas e a lua se fazia presente em sua fase crescente.

Naquela noite, Miguel não tomou o ônibus de volta para casa, e foi apenas uma das noites na qual sua mãe dormiu totalmente só.

Mesmo que estivesse amanhecendo Miguel sempre voltava para seu lar e por mínimas vezes, naquele ano, por causa da distância da faculdade ficara em Serras do Imperador.

Ao amanhecer, república de Tâmara, Miguel, constatou algo de errado com seu pênis, ereto de vontade de urinar.

Brotavam como cogumelos aos primeiros raios solares, formas parecidas com verrugas.

Logo no primeiro dia após o contato sexual com Tâmara já se podia contar cinco desses tumores benignos ou malignos, ainda não tinha conhecimento certo sobre aquela venérea patologia.

Ambos, ainda deitados, visualizaram aquele membro doentio o que ocasionou um mal estar duplo.

Tâmara então, disse a Miguel que não se precavia com preservativos porque tinha extrema alergia ao látex ou talvez ao espermicida, não sabia ao certo.

O que realmente sabia era que, após um contato sexual com utilização de preservativos, sentia um ardor intenso em sua vagina e isso se estendia por vários dias, o que gerava extremo desconforto e coceira voraz; por isso o solícito Miguel não fez uso de tal produto protetor não só de concepção fetal, mas também, de doenças sexualmente transmissíveis.

Contraíra agora, uma, nosso juvenil aprendiz de relações sexuais.

No segundo dia havia umas oito tuberosidades. Desesperado, se sentido sujo e nojento, com asco de si mesmo, foi até o ambulatório da faculdade somente dois dias após a constatação daquelas verrugas que não paravam de proliferar em seu pênis murcho.

O médico, um senhor de uns sessenta e poucos anos, conhecia muito bem aquele tipo de verruga. Foi logo dizendo:

“É condiloma! Precisa cauterizar!”.

“Significa que teremos que queimá-lo, doutor?”

“Exatamente! Marcarei a cauterização para daqui a três dias no hospital comunitário, pois aqui não tenho os instrumentos necessários. Necessitamos também, esperar um pouco mais para observarmos se ficam apenas essas oito aí”, ressaltou o médico sorridente.

Naquela região do estado, adquirir condiloma era como pegar gripe em dias frios. Estava cansado de diagnosticar esse mal. Herança das prostitutas que por ali se proliferaram

Três dias depois lá estava Miguel para procedimento cirúrgico logo pela manhã. Após duas aplicações de xilocaína no local, por meio de agulha e seringa, seu pênis estava completamente anestesiado e pronto para ser queimado em nove pontos diferentes, já que mais uma tuberosidade havia brotado na noite anterior.

Um cheiro estranho, como de um curtume em dia útil, manifestou-se pela sala. Estava feito!

“Continue observando por alguns dias para ver se não aparecem mais”. Disse o médico com um bisturi em brasa na mão direita.

“E fique uns quarenta dias sem penetrar ninguém para que ocorra uma boa cicatrização”, ressaltou.

Esse fato gerou repugnância por parte de Miguel a atos sexuais aleatórios.

Nunca podia imaginar que, aquela bela moça, com nome de fruta exótica fosse suja e que, aquele momento de êxtase fosse acarretar nessa situação inusitada.

Sua idiossincrasia em relação ao sexo se manteve inerte até o final do curso de História, de modo que se apegou ainda mais ao onanismo.

Marciano James
Enviado por Marciano James em 14/07/2009
Reeditado em 11/04/2012
Código do texto: T1698764
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