Machado de Assis, Capitu e a Flip.

Machado de Assis, Capitu e a Flip.

Na edição anterior, apresentei um breve comentário sobre literatura comparativa e prometi trazer nova crítica severa sobre as origens de grandes obras e de célebres autores. Pois bem, na literatura mundial há grandes farsas que se passam por criações originais, mas não falaremos por agora sobre estas unanimidades. Havia decidido não tocar em lixo para não contaminar de alguma forma nossos caros leitores. Todavia tive que repensar algumas das minhas opiniões concernentes à literatura brasileira. É fato que não temos cá grandes autores vivos, e, em outros tempos eu, movido por uma brutal ignorância, poderia afirmar que não temos nenhum autor vivo que mereça as honras literárias que devemos, por exemplo, a Machado de Assis. Sobre Dom Casmurro: Mesmo este não sendo o melhor livro do bruxo de Cosme é, sem dúvida, Capitu a sua melhor personagem. O enredo não é nada original e são bem visíveis o contexto histórico, costumes e vícios do século abordado; daí vem uma observação justa: que Machado de Assis seja mesmo um extraordinário cronista.

Dom Casmurro, ao contrário de memórias póstumas, que é indiscutivelmente sua grande obra, não revela muita sabedoria filosófica, pois me parece que o autor havia se desiludido com sua filosofia de “aos vencedores as batatas”. Prova disso é que Bentinho se casa e tem lá seus dias de felicidade matrimonial. Só no final encontramos um velho rabugento que trata friamente o próprio filho e que anuncia a morte da sua amada como se fora a morte de um cão sarnento.

O enredo é enxertado da canalhice católica. Como aquela história de padre, um sacerdócio atrofiado, que parece ser um grande fantasma presente em outras obras machadianas. Mas deixemos o defunto descansar em paz. Vale narrar a beleza da personagem mais adorável à minha análise. Os braços de Capitu ao desfilar nos bailes, os olhos de ressaca, a dissimulação ao apagar do muro os segredos dos dois meninos ainda inocentes e a astúcia para conquistar sua futura sogra, são psicologias de uma beleza incomparável. Machado maximiza o lirismo ao criar a verdadeira musa que todo poeta deseja. Experimentamos um sentimento nostálgico e incurável ao estudar sua obra. Hoje, infelizmente, o autor que desponta como seu sucessor (apenas) em popularidade declara em palestra alusiva à literatura que detesta escrever.

Na FLIP 2009 desfilaram com muita pompa alguns pseudo-imortais que são de fazer chorar aos críticos sérios que sequer apareceram por lá para aplaudir ou vaiar aquele circo dos horrores. Escritores insípidos como Chico Buarque e Richard Dawkins, foram, a meu ver, o maior dos equívocos. Um ateu declarado ‐ mais aguerrido na defesa de sua crença do que Lutero por suas "indulgências", atraiu, mesmo assim, uma massa de adoradores. Gente que ainda acredita que ser ateu seja sinônimo de inteligência ou de senso crítico incomum.

Sobre a Flip vale ressaltar que não cumpre mais o papel original que pretendia: elevar através da literatura o nível cultural dos seus congressistas. Hoje o que se vê é uma multidão de viciados que vai a Paraty com intuito único de se divertir, como se aquilo fosse, além de um circo bizarro, onde figuras estranhas fazem de tudo para chamar a atenção da mídia, um verdadeiro carnaval fora de época. Podemos afirmar sem medo de cometer injustiça para com os adeptos da cultura que 30% eram da tribo literária e, que apesar de não estarem muito felizes com os autores convidados, puderam tirar proveito de algumas palestras.

Eis aí um artista como aprecio: modesto em suas necessidades. Só quer efetivamente duas coisas: seu pão e sua arte, - panem et Circen.

Nietzsche

Evan do Carmo
Enviado por Evan do Carmo em 09/07/2009
Reeditado em 11/07/2009
Código do texto: T1691256