XXVIII - Por favor, chame o delegado

Como o fato policial merecia destaque e relevância, o delegado foi chamado à delegacia para ouvir o que tinham a dizer os pequenos jovens.

“Poderia ser algo decisivo nas investigações, senão não iriam comparecer de livre e espontânea vontade para relatar algum fato presenciado na noite do crime, anteriormente ou postumamente ao assassinato”.

“Adoro essa profissão”, conspirava o delegado enquanto trocava de roupas para se apresentar ao chamado.

“Com certeza tinham visto algo importante na noite do crime”, pensava o delegado enquanto se encaminhava para seu local de trabalho.

Vagarosamente e com um jeito de preguiça, Carlos Miguel de Souza, adentrou-se à delegacia portando um recém acendido cigarro em sua fétida boca.

Olhou fixamente para os três jovens e pôs-se a arrumar pequenas coisas em cima do armário de aço que estava em frente ao corredor que levava à sua pequena, úmida e quente sala.

Penetrou na repartição sem dizer nenhuma palavra, apenas olhava as coisas ao seu redor e fingia ignorar as três prestativas crianças.

“Muito bem, o que vocês têm para acrescentar ao fato”, disse a sentar em sua cadeira giratória.

“E é bom que seja coisa importante. Não gostaria de saber que tive de vir aqui à toa”.

Ednardo Rabelo, o mais afoito, foi logo se sentando na cadeira que estava posta em frente à mesa do delegado.

Colocou as mãos unidas em meio às pernas e movimentava seu pé direito num movimento de flexão-extensão do tornozelo de forma intensa e constante.

Era como se expressasse toda a sua ansiedade e nervosismo naquele movimento simples.

“Relutamos um pouco em vir aqui seu delegado, mas à medida que os fatos tomaram esse rumo achamos melhor intervir em prol do professor Miguel”.

“Isso mesmo”, completou Celina Emiliana roendo as unhas da mão esquerda e mexendo em seu negro e grosso cabelo com a outra.

“Vamos logo aos fatos”, enfatizou o delegado Carlos Miguel de Souza.

“Conte-me o que viram e não poupem detalhes”.

“Acontece que, iniciou Ednardo, quando estávamos nos dirigindo em direção à vila dos cachorros no inicio da noite anterior, avistamos Angélica também indo em direção à vila. Estava só”.

“Não nos aproximamos dela. Estávamos bem atrás e sem pressa de chegar. Conversávamos e riamos muito de forma que não nos preocupamos com a menina. Mantivemos uma distância de uns cem metros. A víamos devido à cor dourada de seus cabelos sobressaindo na penumbra daquelas ruas”.

“Justamente naquele ponto em que o caminho se faz mais escuro, onde há dois postes consecutivos com a luz queimada, havia outra pessoa. Parecia que esperava Angélica pelo modo como a abordou rapidamente”.

“Angélica o reprimiu com um grito de susto que nos fez parar de caminhar e ficarmos observando o que aconteceria então”.

“Parecia que discutiam muito pelos gestos que produziam no ar com os braços”.

“O homem, então, de súbito, atirou Angélica contra o poste. Nesse momento nós nos escondemos para não sermos vistos”.

“Ficamos com muito medo”, interferiu Celina, “aquele ser parecia muito furioso e tivemos medo de sermos vistos e também atacados”.

“Continue”, disse o delegado coçando suas costas com um ar de satisfação.

“O homem gordo e relativamente baixo parecia ser detentor de uma força descomunal, bateu com a cabeça de Angélica várias vezes contra o poste de luz sem luminosidade e, quando a moça estava praticamente sem sentidos apareceu outro homem de aparência jovial”.

“Nesse momento pensamos que Angélica seria ajudada e ficamos aliviados”. “Só que não foi bem assim”.

“Continue, continue”.

“O outro também desferiu golpes contra a cabeça e o corpo de Angélica”.

“Com a ajuda de uma bicicleta que estava parada na calçada colocaram Angélica na traseira e levaram-na do local”.

“Dirigiam no sentido que leva ao outro lado da cidade, justamente onde soubemos que o corpo foi encontrado”.

“Contem-me então, quem eram, ou melhor, quem são os dois assassinos que tiraram a vida dessa jovem de forma tão brutal”, disse arregalando os olhos, o delegado.

“Não temos certeza. Estávamos longe. Se fazia um pouco escuro também. Sabemos que, pelas características dos homens, nenhum se parecia com o professor Miguel que é mais alto e magro”.

“Como era então, a tal bicicleta?”

“Também não sabemos explicar, já disse que estávamos longe e escondidos. Havia penumbra no local e nem as cores e o modelo da bicicleta podemos precisar agora.

“Porque não vão até o local e quem sabe encontrem pistas?”, sugeriu Léo Cláudio.

“Não me diga como trabalhar rapazinho”.

“Por enquanto estão dispensados. Averiguarei esse fato. Mas digo uma coisa: se estiverem mentindo estarão em maus lençóis”.

“Soltará o professor Miguel”, indagou Celina Emiliana com lágrimas no olhar.

“Por enquanto ele também é suspeito, ficará aqui até que solucionemos o caso”.

“Mas, se o que estiverem dizendo for verdade creio que solucionaremos esse caso brevemente”.

Dirigindo-se ao local na companhia de dois policiais, e estes puderam constatar marcas de sangue no poste dito pelos jovens em seu voluntário depoimento.

“Então realmente houve uma agressão por aqui”, confabulou o delegado a coçar a cabeça levantando brevemente seu chapéu de feltro marrom.

“Quem fez isso e porquê?”

“Qual o motivo de tanta violência?”

Marciano James
Enviado por Marciano James em 05/07/2009
Reeditado em 11/04/2012
Código do texto: T1683423
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