XXXII - Findara ali a vida dos dois jovens aniquiladores de Angélica

A cidade estava novamente estarrecida.

Não imaginava que seriam aqueles meninos magros, baixos e aparentemente raquíticos os assassinos de Angélica.

O padrasto confessara o crime e fôra recluso automaticamente, e se tudo corresse dentro do previsto, o júri popular imputar-lhe-ia uns trinta anos.

Era questão de honra social para toda a cidadela.

O delegado dizia, no velório, estar próximo de desvendar o crime e tinha quase certeza serem eles os homicidas.

Esse ato de egocentrismo dava credibilidade ao delegado.

Não conseguiu nesse período de três semanas ao acontecimento fatídico encontrar nada plausível e incriminatório contra os homicidas desbotados, mas gabava-se de ser dono da situação em todos os momentos.

Ia diariamente em frente ao poste manchado de sangue, olhava para aquelas marcas negras e abstratas, olhava ao seu redor, verificava coisinhas miúdas jogadas ao chão, acendia um cigarro, coçava sua cabeça, levantava suas calças e voltava para a delegacia.

Era assim a sua investigação diária.

Sabia que à medida que o tempo passava suas chances de descobrir o verdadeiro criminoso diminuíam.

Trabalhava com a possibilidade de ser realmente o professor Miguel, todavia não tinha provas cabais que o incriminasse.

Chegou a interrogar algumas pessoas que faziam parte do cotidiano de Angélica, inclusive o seu “inofensivo” ex-namorado, mas o jovem não expressou nada que o incriminasse com veemência.

O próprio delegado o considerou inofensivo por demasia, e não lhe deu importância. Quanto ao padrasto, nunca lhe passou pela cabeça que seria o assassino de fato.

Aquilo encucava o delegado:

“Que prazer mórbido, que coisa desprezível e revoltante”.

“Aquele ser é um monstro. Um mutante primitivo instalado em nosso insensível planeta. Irá mofar atrás das grades, mas isso não recolocará a jovem de volta a esse plano”.

Na verdade, o delegado Carlos Miguel de Souza, temia não solucionar o caso e perder a credibilidade junto à população local.

Precisava incriminar alguém e nem isso conseguia.

Chegou a cismar com Ramires José de Freitas por sua partida à capital sem explicações sociais, mas em seu depoimento disse tudo simetricamente como Douglas Hernesto Sanoj também havia dito, de modo que não houve contradições que os incriminassem.

“Esses assassinos confessores livraram-me a barra, literalmente”, confabulava o delegado enquanto visualizava os caixões dentro do velório municipal.

Muitos foram ao velório para verem os assassinos da jovem. Tornou-se atração sensacionalista o ato fúnebre e foram visitados pela imprensa da região, transeuntes, autoridades locais e o novo padre também se fez visita para aplicar-lhes o perdão.

Alguns foram até a delegacia para promover um linchamento sobre o monstro mutante assassino, mas foram logo dispersos por saraivadas de balas desferidas pelos policiais de plantão.

Sugeriu-se, então, que o transferisse para outra cadeia.

Foi embora daquela cidadela para nunca mais voltar.

Antes mesmo do veredicto popular, cerca de oito meses após sua captura, enforcara-se dentro da cela utilizando-se de lençóis que ali estavam.

Triste fim para tristes vidas.

Marciano James
Enviado por Marciano James em 04/07/2009
Reeditado em 11/04/2012
Código do texto: T1681672
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