A natureza da paixão

Há uma tendência natural da paixão ao trágico, como há um fim natural para cômico: o enfado. Não se rir da vida impunemente, e não se desdenha da paixão eternamente. A variação da roda do tempo, cedo ou tarde, virá sobre o verme assim como virá sobre o leviatã. Ceder à paixão é um estado de ânimo para conviver com o perigo.

Há no espírito humano, um desvelo sobrenatural para com aquilo que o angustia no âmago da alma, no cerne da consciência, onde mora vez por outra a razão. O instinto, que é senhor das criaturas de sangue quente, se permiti, não raro, experimentar se não seria mais prazerosa uma existência pautada pelo sangue e não pela sensibilidade emocional. O Eu lírico, porém foi demasiado influenciado por uma visão subjetiva e por desejos cognitivos do que seria um modo ideal, para se obter prazer e glória.

A paixão, que sempre destrói suas vítimas desde o principio criativo, não deixou de ser um meio de a natureza alcançar seu objetivo caótico, para de maneira grotesca perpetuar as espécies. Como bem esclarece Schopenhauer, a paixão é, sobretudo química, material. Quando dois jovens se unem por um principio comum, imaginário, de se quererem bem; na verdade há uma força descomunal da natureza agindo à revelia, regendo uma impressionante orquestra casuística, que se olhada com olhos de verdadeira consciência, se perceberá, num fundo de cada verdade emocional, o instinto soberano.

Uma pequena lista dos espíritos que sucumbiram ao abismo da paixão romântica: Helena, a razão falsa de tantos malefícios, Aquiles, que empreendeu um combate por amor, Páris e Tristão. O trágico casal de Shakespeare, Hamlet, consumido por uma paixão demente. Um herói que aceita influências sobrenaturais para cometer um crime tão bárbaro, quanto magistralmente artístico.

O que mais nos fascina não é a descoberta do elixir da eterna juventude. O que vislumbramos com falta de fé, é o dia quando a ciência for capaz, fora da psicologia, de nos prevenir com um antídoto poderoso, por via oral, contra os efeitos nocivos de qualquer tipo de paixão carnal.

Evan do Carmo
Enviado por Evan do Carmo em 17/06/2009
Reeditado em 27/06/2009
Código do texto: T1654234