POESIA BATATESCA ou DO EMBURRECIMENTO do VERSO

Desde a origem presumida, a poesia ( e não só a Poesia, mas a Arte, ou as artes, como queiram), muda diariamente as formas de composição.

O exemplo mais evidente é o Soneto. Do antigo formato dos dois quartetos e dos dois tercetos (parido lá pelo século 13, como um bloco de 14 versos, Giacomo de Lentini fixou-lhe o formato italiano, que Petrarca difundiu), passou a três quartetos e um dístico (um bruxo chamado William), vindo, após o advento do Modernismo a ter liberada a disposição dos 14 versos, por alguns autores (deve ser elucidado que os formatos de 14 versos são os mais comuns, porém, existem outros formatos, com mais ou menos versos).

Após a Revolução da Modernidade da qual foi pedra fundamental Charles Pierre Baudelaire, com As Flores do Mal (embora seus ensaios reunidos na Arte Romântica sejam de fundamental importância para compreender os conceitos de Estética, Retórica e Temática), e Arthur Rimbaud, com O Barco Embriagado; Uma Estadia no Inferno; As Iluminações, entre outros (sem esquecer a Carta do Vidente, pois quando Rimbaud afirma que " o poeta torna-se vidente após um longo, desmesurado e sistemático desregramento de todos os sentidos", e "e o poeta é a antena da raça, cabe a ele captar a quantidade de desconhecido de cada época", estabelece o estatuto poético de lá para cá), a rigidez e a imutabilidade da poesia foram rompidas, dando oportunidade ao nascimento de inúmeras experiências na composição, algumas verdadeiramente geniais, e outras meros exercícios exóticos com a linguagem.

Gente como Mário de Andrade; Manuel Bandeira; Cassiano Ricardo; Carlos Drummond de Andrade; Jorge de Lima; Murilo Mendes; Vinícius de Moraes; Cecília Meirelles; Gilka Machado só para citar alguns, realizou maravilhas na arte do verso (isso para falar só do Brasil), atravessando do poema-piada até a Poesia em Pânico (Lima e Murilo).

Com o advento das vanguardas que reagem ao emburrecimento do verso praticado pela Geração de '45 (que me perdoem Geir Campos e João Cabral), com o seu neoparnasianismo de celulóide, a arte poética foi expandida a continentes antes ou inexplorados, ou oportunisticamente ignorados pelos cabeçóides oficiais da cultura da poesia.

A partir delas (as vanguardas), o debate entre os cultores do poema curto contra os defensores das formas mais longas instalou-se com alarido mais engraçado do que durante a Primeira e a Segunda Geração Modernistas (a meu ver, nem um nem outro, mas ambos, dependendo de uma série de fatores inerentes ao autor).

Constantemente assisto a pegas entre os filinhos esquecidos pelo Concretismo contra os órfãos da poesia dita "social", e destes, contra a turminha sobrevivente da Poesia Marginal (década de '70), e ainda destes contra os "esotéricos", uns defendendo o enxugamento da obra poética, pretensos bastardinhos do Ezra Pound (pergunta-se sempre o que ele não teria assassinado da obra de Elliot), outros, velhas saudosas do surrealismo, bradando que o poema depois de nascido não pode ser mudado (fico imaginando do que seriamos poupados se eles cortassem certas idiotices dos textos).

Seja como for, a poesia evolui na direção da liberdade na forma e no conteúdo, seja nas práticas mais tradicionais, como soneto, rondel, hai-kai (haikai), até os recentes poetrix, e pretender mantê-la numa redoma de censura e conservadorismo mais do que ignorância, é falta de caráter com o próprio meio, pois basta uma visita à livrarias para ver que Roberto Piva; Ana Cristina César; Armando Freitas Filho; Carpinejar; Ferreira Gullar; Arnaldo Antunes e outros, dão a mínima aos donos das redomas e sua poesia batatesca.