Quando nasce um escritor?
Apesar da questão apresentar-se aberta, possibilitando uma abordagem ampla, sucede a necessidade de entender o tipo de escritor que estamos relacionando. A priori, interessa o escritor original que domina o código e se permite trabalhar na ampliação de suas aplicações, criando uma obra relevante.
Neste particular, a título de referência, cito Guimarães Rosa na prosa, e João Cabral de Melo Neto na poesia. Suas obras consolidaram um alto padrão na produção literária, resultando numa proposta inovadora e afirmativa para a língua, além de gerar influencias significativas.
Esta postura atinge resultados quando exercida individualmente, sem a caracterização de movimento literário; sucede que um movimento tende a uma uniformização, mesmo que o objetivo seja a ruptura de um modelo anacrônico.
Quando a cena literária oferece poucos atores desenvolvendo abordagens particulares temos um ambiente de contrastes que proporciona uma avaliação de confronto onde todos colhem referencias de um público leitor semelhante e recebem críticas dentro de um mesmo modelo.
O nosso escritor original é um leitor que foi constituindo um aparato expressivo significativo e desenvolveu habilidades para produzir um determinado tipo de literatura.
O que o torna um escritor?
O simples fato de escrever não fará dele um escritor. A relevância da obra, em qualquer tempo, e os efeitos da sua expressão serão elementos que transcenderão para a condição de sua obra situar-se em destaque dentro da cena literária.
A obra o torna escritor.
A relação com o publico leitor é definida pelo interesse que pode ser compreendido pela escassez de abordagens, pela demanda artificial do marketing; porém, a alta literatura de realização estética plena, cuja gênese exige alta maturação do seu autor; desconhece os ciclos, determina padrões para a crítica e impõem as realizações mais modestas, gradações de menor expressão.
Os cânones submetidos aos efeitos do tempo relegam a biografia do autor a traços cada vez mais distantes da impressão do tempo. A biografia dos autores são notas de orelha, o autor, de fato, vive na obra.
Cada vez que um livro é aberto, apresentando uma representação
moldada pelo autor, ele vive; a obra estende o dialogo a uma relação de espaço e tempo além da possibilidade real do autor.
Cada nova leitura, ainda que de um mesmo leitor, refunda a obra e traz o autor ao centro para conduzir aquela representação.
O nascimento do escritor é uma licença contida na obra, um diálogo improvável, que na Poética, permite Aristóteles nos inquirir com propriedade e relevância até hoje.
Quando o escritor morre?
A morte do escritor é uma licença maior e ainda mais poderosa, pois ele ressuscita indefinidamente, à cada leitura desviando-se dos juízos post-mortem.